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    Admirável Mundo Pop: Os segredos por trás dos vencedores do Oscar

    Em suas nove décadas, a maior premiação do cinema revelou mais do que apenas os melhores de cada ano.

    AFP/Getty Images (Oscar.com)

    Vou confessar aqui porque estou me sentindo sincero: eu adoro o Oscar. E comecei a gostar bem antes de me reconhecer como cinéfilo.

    O Oscar sempre me pareceu fascinante porque de certa maneira servia como uma validação dos meus gostos. Quando criança, lembro de levar como uma vitória pessoal quando algum filme favorito era indicado. Parecia que mais gente compartilhava comigo da paixão por aquela história ou universo, ou uma forma de me sentir menos sozinho com minhas pequenas obsessões. O Oscar colaborou para eu gostar mais de cinema, e não o contrário. Foi mais ou menos esse o efeito que a Copa do Mundo teve em minha paixão pelo futebol -- mas isso é um assunto para outro site especializado. 

    Eu acredito que premiações são importantes, mas não apenas porque determinam e celebram quem são os melhores de cada época. Esses eventos também representam um retrato interessante de um momento histórico específico, uma referência que nos permite compreender o que éramos, o que nos tornamos e para onde vamos. Só é preciso ter um pouco de paciência para analisar os dados e um tanto de imaginação para interpretá-los ao seu bel-prazer.

    Reprodução/Ellen DeGeneres/Twitter via Getty Images

      

    Como nerd que sempre fui, continuo adorando decifrar o que há por trás dos indicados e vencedores do Oscar. Antes, ficava preenchendo folhas de cadernos e criando estatísticas mentais, como se isso fosse me revelar alguma verdade secreta que só eu havia percebido. Obviamente, sem a internet isso era algo bem mais complexo -- era preciso confiar na memória, apelar para revistas e jornais antigos e levar em conta o que o Rubens Ewald Filho falava durante as transmissões... enfim, uma tarefa árdua. Hoje existe essa maravilha chamada Wikipedia, que corresponde à verdade absoluta mesmo sem sabermos quem são os responsáveis de fato por atualizá-la. É como se esse arquivo livre e inestimável fosse à prova de fake news.

    Mas então hoje você pode aproveitar a existência dessa enciclopédia digital gratuita e analisar por sua própria conta os dados disponíveis sobre o Oscar. Talvez eles revelem mais sobre as tendências da indústria cinematográfica do que apenas demonstrar quais foram os "melhores" daquele ano. Porque como você logo vai notar, foram diversas as vezes em que o melhor não venceu, ou talvez nem tenha sido indicado. As estatísticas nos ajudam a compreender as tendências, mas às vezes certos fatos permanecem inexplicáveis anos depois, ou mesmo possuem múltiplas razões de ser.

    Reprodução Oscar.com

    Um bom exemplo é a premiação de Melhor Diretor. Desde 2010, apenas dois cineastas nascidos nos EUA venceram o prêmio, cada um com sua devida importância -- a primeira mulher, Kathryn Bigelow (por Guerra ao Terror) e o mais jovem a vencer, Damien Chazelle (por La La Land). Os outros premiados foram um britânico (Tom Hooper, por O Discurso do Rei), um francês (Michel Hazanavicius, por O Artista), um taiwanês (Ang Lee, por As Aventuras de Pi) e uma avalanche mexicana com Alejandro Gonzáles Iñárritu (por Birdman e O Regresso), Guillermo del Toro (por A Forma da Água) e Alfonso Cuarón (por Gravidade e, provavelmente, Roma -- pode vir aqui reclamar se eu estiver errado).

    O que esses dados dão a entender? Que o México gerou uma safra surreal de diretores nascidos na década de 1960 (os motivos disso? Eu adoraria entender); que os cineastas nascidos nos EUA que consolidaram suas carreiras nas décadas de 1970-80 já não encantam tanto os membros da Academia; e que vencer o Oscar não significa necessariamente entrar para o panteão dos melhores de todos os tempos. Basta lembrar que gênios eternos como Stanley KubrickAlfred HitchcockFederico Fellini nunca ganharam esse prêmio, e esse fato não tira o brilho de seus legados.

    Já entre aqueles que comemoraram o Oscar de Melhor Ator há também fatos curiosos. De todos os que venceram nas 50 primeiras cerimônias (de 1929 a 1977), apenas três ainda estão vivos: Sidney PoitierGene Hackman e Jack Nicholson. Já entre os vencedores dos 40 anos seguintes, de 1978 até 2018, todos sobrevivem exceto por três: Henry FondaPaul Newman e Philip Seymour Hoffman. Já as mulheres parecem viver mais. Entre as vencedoras como Melhor Atriz dos últimos 50 anos, somente três não estão mais entre nós: Katharine HepburnGeraldine Page e Jessica Tandy

    O quesito "idade" também proporciona insights interessantes. A média de idade dos vencedores do Oscar de Melhor Ator tem variado a cada década. Nos últimos dez anos (de 2009 a 2018), os vencedores tiveram de 33 (Eddie Redmanyne em A Teoria de Tudo) a 60 anos (Jeff Bridges por Coração Louco), resultando em uma média aritmética de 47 anos. Se o vencedor deste ano for o favorito Christian Bale por Vice, a média da década permaneceria praticamente a mesma. Já se o azarão Rami Malek vencer por Bohemian Rhapsody, a média cairia para 45,9 anos.

    Fazendo mais contas, confirma-se que os eleitos "melhores atores" estão envelhecendo, após duas décadas ficando mais novos. De 1999 a 2008, a média de idade dos vencedores foi de 41,1 anos; de 1989 a 1998, foi de 44,3 anos; e de 1979 a 1988, 47,3 anos, exatamente o mesmo valor do período de 1969 a 1978. Ou seja, após 30 anos caindo, a idade média dos atores premiados voltou a subir na década atual. O que isso significa? Que a Academia gosta de premiar eventuais veteranos, mas que vai valorizando cada vez mais os "novatos" -- que naturalmente também estão envelhecendo. E que se a tendência continuar, a maioria dos vencedores da próxima década será de atores mais jovens, abaixo da casa dos 45 anos.

    Também existe um processo de envelhecimento após uma sequência de rejuvenescimento entre as vencedoras do Oscar de Melhor Atriz, ainda que em um ritmo diferente. Nos últimos dez prêmios, a média de idade entre quem ganhou foi de 40,3 anos, sendo a mais jovem com 22 (Jennifer Lawrence por O Lado Bom da Vida) e a mais velha com 62 (Meryl Streep por A Dama de Ferro). A provável vitória de Glenn Close por A Esposa este ano deve aumentar ligeiramente este valor para 44 anos. Nos dez anos anteriores, de 1999 a 2008, a idade média ficou em 33,4 anos; de 1989 a 1998, 41,3 anos; de 1979 a 1988, 42,2 anos; e de 1969 a 1978, 34,4 anos.

    Se essa tendência permanecer, tudo leva a crer que a média de idade entre as atrizes vencedoras deve permanecer na casa dos 40 anos na próxima década, para despencar bastante nos dez anos seguintes. Se comparadas aos homens, as mulheres parecem ganhar reconhecimento mais cedo e são premiadas com menos frequência quando passam dos 50 -- a vitória de Frances McDormand aos 60 anos por Três Anúncios para um Crime foi um fato raro que confirma essa ideia.   

    Eu poderia seguir para sempre, mas o tempo e o espaço são curtos e esta coluna já está atrasada. O que muda na sua vida sabendo disso tudo? Provavelmente, nada. Mas que é divertido analisar e explorar, isso lá é. Então que venha o Oscar desse ano -- e dependendo do que acontecer em 24 de fevereiro, tudo que escrevi aqui poderá ter outro significado no ano que vem. 

    Pablo Miyazawa é colunista do AdoroCinema e consome cultura pop desde que nasceu, há 40 anos, de Star Wars a Atari, de Turma da Mônica a Twin Peaks, de Batman a Pato Donald. Como jornalista, editou produtos de entretenimento como Rolling Stone, IGN Brasil, Herói, EGM e Nintendo World. 

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