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    Sombra e Ossos: Crítica da 1ª temporada da série da Netflix

    Nova série de fantasia da Netflix tem influências de Game of Thrones.

    Nota: 2,5 / 5,0

    Fruto da parceria da Netflix com o produtor de Stranger Things, chega ao streaming nesta sexta-feira (23) a série de fantasia Sombra e Ossos. Apostando em um elenco jovem que se divide em três arcos narrativos distintos, a produção inspirada nos livros de Leigh Bardugo tem um universo bastante rico, um visual deslumbrante e claras influências de Game of Thrones. No entanto, peca em aprofundar este mundo, trazendo desenvolvimentos apressados e sem capricho, um viés sexista e focando em um romance banal.

    Sombra e Ossos sofre justamente daquilo que a faz interessante

    Sombra e Ossos sofre justamente daquilo que a faz interessante: o fato de ser inspirado em duas sagas literárias de Bardugo. A escolha de unir as tramas das histórias de Shadow and Bones e do spin-off Six of Crows insere uma complexidade e uma profundidade maior ao Grishaverse, e de fato é uma excelente ideia na teoria. Na prática, nem tanto, afinal, a temporada só tem oito episódios e isso é muito pouco tempo para progredir a história de todos os personagens com clareza.

    Assim, foi preciso escolher o que explorar no enredo. A primeira metade da série é surpreendente, mas a partir do episódio quatro, o roteiro de Eric Heisserer (Bird BoxA Chegada) faz escolhas narrativas pobres. Além de apostar em coincidências demais, que são mal explicadas e acabam soando falsas. As personagens femininas ainda são questionadas e ofuscadas pelos masculinos.

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    A série é ambientada no Reino de Ravka, inspirado na Rússia Imperial — pelo menos nos nomes, figurinos e arquiteturas. Este mundo fantástico está em guerra, dividido pela Dobra das Sombras, uma faixa de escuridão que impede que as pessoas circulem livremente pelos países, afinal, é assombrada por monstros sanguinários. Além disso, existem diferentes tipos de humanos: os "comuns", sem poderes, e os Grisha, uma elite mágica que entre eles são divididos em "classes", dependendo do seu poder.

    Neste contexto, somos apresentados a Alina Starkov (Jessie Mei Li), uma jovem órfã que é cartógrafa do Primeiro Exército, ao lado de seu amigo de infância Malyen Oretsev (Archie Renaux), por quem secretamente é apaixonada. Em determinado momento, ela descobre o poder de Conjuradora do Sol e logo passa a ser exaltada como uma Santa, salvadora que destruirá a Dobra. Assim, é convocada para integrar os Grisha pelo misterioso General Kirigan (Ben Barnes) e para ir morar em um palácio.

    À primeira vista, especialmente quem não leu os livros, parece jogado no meio de um caldeirão cheio de nomes complexos, "classes" e lugares diferentes. No meio disso tudo, a produção encontra tempo — ou tenta — para contar outras histórias, que são até melhores e mais cativantes do que Alina, Mal e Kirigan. Trata-se da equipe dos Corvos, mercenários liderados por Kaz (Freddy Carter), que convoca o pistoleiro Jesper (Kit Young) e a espiã Inej (Amita Suman) para uma missão que os deixará ricos: capturar Alina. Ao mesmo tempo, conhecemos a espiã Nina (Danielle Galligan) e o caçador de bruxas Matthias (Calahan Skogman), que à princípio não fazem conexão com a trama original, e protagonizam uma troca desnecessária e forçada.

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    Série da Netflix tem influências positivas e negativas de Game of Thrones

    Sombra e Ossos passa pelo mesmo mal que acometeu a última temporada de Game of Thrones: espetacularização, além de muitos elementos para pouco tempo de série, desenvolvimentos corridos e foco em arcos monótonos e repetitivos, ao invés de dar mais espaço de tela para personagens mais interessantes e tomar seu tempo para esclarecer situações que parecem forçadas. Tal como Daenerys (Emilia Clarke) no criticado final da série da HBO, Alina tem reviravoltas e transformações mal explicadas e vai da água para o vinho, e depois de volta para água em tempo recorde.

    Em tese, meses se passam dentro do enredo da série, no entanto, o espectador não tem indícios de passagem de tempo, além da fala da protagonista. A trama corre sem mostrar a evolução de Alina, por exemplo, em seu treinamento. Ao mesmo tempo em que a protagonista de Jessie Mei Li supera seus conflitos internos muito rapidamente — e sem terapia, diga-se de passagem! Estes mesmos problemas também aconteceram em Cursed, série protagonizada por Katherine Langford, seria um padrão das séries de fantasia da Netflix?

    Por outro lado, as influências positivas de Game of Thrones vem em figurino, sequências de luta na neve, reviravoltas surpreendentes, além de cenas violentas e mortes brutais. Ainda que o showrunner Eric Heisserer não revelasse que a série da Netflix é um encontro de Game of Thrones com Onze Homens e um Segredo, é possível perceber que Sombra e Ossos herda vários elementos da produção da HBO, incluindo semelhanças ao arco de Daenerys, Jon Snow e até Varys.

    Kaz, Jesper e Inej protagonizam melhor arco da série

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    O arco mais interessante de Sombra e Ossos é o de Kaz, Jesper e Inej. O fato de eles serem fora da lei e bem-humorados traz ótimas referências a filme de assalto. Quase toda sequência em que eles aparecem é focada nisso, o que chega a ser repetitivo quando chegamos aos episódios finais, mas não menos divertido. Freddy Carter está excelente no papel, e a dinâmica de seu personagem com Kit Young e Amita Suman é o que cativa na produção.

    O restante do elenco jovem também é bastante talentoso. A novata Jessie Mei Li está bem no papel de Alina, transitando de forma esforçada entre as facetas da protagonista. Apesar de ser prejudicada pelos diálogos sofríveis, Alina é a alma da série. A troca dela com Mal de Archie Renaux pode tanto encantar quanto criar afastamento do público.

    Já Ben Barnes parece que atua como o mesmo personagem desde O Sétimo FilhoWestworld, fazendo caras e bocas bastante caricatas. Ele convence mais quando não tenta ser misterioso ou dúbio, como em As Crônicas de Nárnia.

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    Sombra e Ossos não cria imersão necessária

    Apesar de todo o espetáculo visual, figurinos deslumbrantes e cenas de lutas muito bem coreografadas. Sombra e Ossos falha em criar a imersão necessária para acreditarmos naquele mundo. E não venham nos dizer que a culpa é do gênero fantasia, pois Harry Potter e O Senhor dos Anéis conseguem muito bem fazer o público crer que em alguma dimensão paralela o Mundo Mágico e a Terra Média existem! Brincadeiras à parte, a imersão não está pautada somente nos artifícios visuais, mas também em um roteiro bem amarrado, que não gera estranheza e "mascara" que são atores que estão ali frente a câmeras e uma equipe de bastidores.

    Com um gancho para uma segunda temporada e vários livros de Leigh Bardugo como fonte, Sombra e Ossos tem potencial e talvez consiga encontrar um caminho. Mas certamente não supre o espaço deixado por Game of Thrones, se essa era a intenção.

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