“Essa é a lei da oferta e da procura”. Através dessa frase, Jordan Belfort, interpretado por Leonardo DiCaprio, quer demonstrar que, qualquer coisa pode ser vendida, bastando existir procura. Mas essa fala, não se resume a sua semântica ou ao seu papel de pedra basilar, para o que chamamos de economia. Ela transcende sua mera interpretação gramatical. Martin Scorcese consegue então, expandir e demonstrar, algo que a obra de Jordan Belfort, tem como limitação: sua literalidade.
Ao apresentar ao público, a história de ascensão e declínio de um jovem ambicioso de Wall Street, Scorcese atinge diretamente, a nossa procura. Ele sabe que existe uma demanda do público, por ver uma representação visceral do que é o mercado de ações. Sabe que, mais do que premiações ou laureamentos, tudo não passa de uma maneira de inflar e impulsionar as vendas de um filme, fazendo produtores e o estúdio, felizes com esse sucesso.
Você pode não admitir querido leitor ou leitora, mas vivemos assim, e nós só temos a oportunidade de ver esse filme, justamente por que nós somos um número, um valor para indústria. Ao longo de 3 horas, portanto, somos expostos a uma fábula sobre a ganância, pela qual, qualquer um de nós poderia se encaixar. Não se tratada do “american dream” e sim de ser rico. Esse tipo de temática já foi abordada ao longo da extensa filmografia de Scorcese. “O Lobo de Wall Street” é o “sucessor espiritual” de “Cassino”. A mesma estrutura, ascensão do protagonista, estabilização do mesmo e declínio total.
Nesse ponto, Socrcese não mudou. Contou uma história à maneira tradicional. Sem maiores rodeios, com narração em off do protagonista – beirando a quebra da quarta parede, ao conversar com o público – para explicar que, não é preciso saber ou gostar do tema, para se maravilhar e surpreender com o filme. Contudo, a diferença crucial existente entre “Cassino” e seu mais recente filme, não esta nos detalhes e sim na espinha dorsal de todo e qualquer filme; seu protagonista.
Jordan Belfort não é só um homem cujo o principal objetivo de vida é ser rico. Ele é um líder, um messias de uma sociedade, que precisa de alguém como ele para prosperar. Comparar seu papel, ao de um líder religioso não é absurdo, pois tal como uma empresa existe, a igreja é também considera um negócio, que só se sustenta pela procura do público.
Desde às primeiras cenas do filmes, temos á clara noção de que Leonardo DiCaprio não teria construído tal personagem, se não fosse suas atuações anteriores. Existe muito improviso, tal como o personagem Calvin Candie (do filme “Django Livre”), a sedução e confiança de Jay Gatsby (em “O Grande Gatsby”) e a complexidade de um J. Edgard (no filme de mesmo nome, incompreendido pela crítica). Muitas de suas sequências, ainda que sejam monólogos (verborrágicos, com palavrões mil), quebram a quarta parede, pois, são como diálogos, com cada um de nós na plateia, nos vendendo o filme, explicando através de metáforas, que estamos lá, o assistindo, pois investimos nele.
“O Lobo de Wall Street” é mais do que uma obra de cinema. Classificar o filme como comédia, drama, thriller ou suspense, seja qual for o gênero, é pormenorizar algo que vivenciamos em nosso dia à dia. Dinheiro é a alma do negócio e o cinema, não foge dessa máxima. Hipócrita é aquele, que afirma que cinema é só arte e vai sempre vê-lo dessa maneira. Martin Scorcese escancara os desejos mais profundos do ser humano e choca à todos. Mas é claro que isso iria ocorrer. Numa sociedade em que a moralidade diz ser preservada, a exposição aos nossos desejos mais íntimos, nunca será fácil.