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    13 Reasons Why: Afinal, a série é irresponsável em sua abordagem?

    Resposta curta: sim.

    Atenção: esta matéria trata de conteúdos sensíveis como depressão e suicídio. Reforçamos a importância de contatar profissionais de saúde mental e/ou o CVV - Centro de Valorização à Vida pelo número 188 ou via chat.

    Quando se produz um conteúdo audiovisual, seja ele episódico ou voltado para os cinemas, existem certas cartilhas básicas a serem seguidas, especialmente quando tratamos de produtos que envolvam temáticas como saúde mental, depressão, suicídio, bullying, estupro... enfim, narrativas que possam de alguma maneira causar incentivos indesejados em pessoas que passam por certos problemas.

    Uma destas cartilhas básicas já citadas aqui envolve uma sugestão muito simples de quase todas as organizações e profissionais de saúde: não se deve mostrar a realização de um ato suicida de maneira explícita, especialmente quando o indivíduo que o realizou obtém êxito em sua tentativa. E isso não é uma questão debatível, simplesmente não se faz. 

    Imaginem, agora, o quanto a situação piora quando além de mostrar explicitamente a personagem cometendo suicídio, uma série direcionada a jovens adultos constrói uma narrativa reforçando como ter se matado foi o maior ato de vingança que Hannah Baker (Katherine Langford) poderia ter cometido contra aqueles que a abusaram e a desrespeitaram. 

    O(S) GRANDE(S) ERRO(S) DE 13 REASONS WHY

    Em 13 Reasons Why, série cuja quarta e última temporada chega à Netflix neste mês de junho, a morte precoce de Hannah Baker é o ponto de partida para que diversos eventos ocorram com aqueles que contribuíram de alguma maneira à ruína de sua saúde mental e de suas condições psíquicas plenas. Porém, mais do que isso, o seriado é um tutorial a jovens que estão na mesma situação.

    Quanto a abordagem inicial, existem prós e contras. No Brasil, por exemplo, os contatos mensais ao CVV (Centro de Valorização à Vida) na semana de estreia da série passaram de 140 para 616 e aumentaram em 400% após o lançamento da série. Paralelamente, as pesquisas no Google sobre os "melhores métodos" para se cometer suicídio aumentaram 20%. No mundo inteiro.

    Conforme já foi dito, a irresponsabilidade da abordagem ao suicídio não é debatível, visto que desobedece as recomendações de organizações de saúde em praticamente todos os países, resultando até mesmo do banimento da cena do ato em si em algumas localidades ao redor do mundo, novamente por recomendação de institutos renomados em saúde mental. Mas sempre há tempo para mudar. Correto?

    A NETFLIX APRENDEU COM OS ERROS? 

    Resposta curta: mais ou menos (mesmo deixando de mencionar obras recentes que também são um pouco problemáticas, como Por Lugares Incríveis e Control Z). Após a avalanche de críticas, a Netflix retirou a polêmica cena e prometeu fazer melhor após a esquisita renovação para a segunda temporada — de uma história que já havia sido terminada originalmente. Logo, na temporada seguinte, o serviço de streaming adicionou antes de cada episódio um vídeo com o elenco, reforçando as medidas para previnir situações extremas.

    Avisos de gatilho foram inseridos antes de todos os episódios e links diretos levavam ao contato do CVV. Mas parou por aí, pois repetiram um erro básico: não ser explícito na retratação de certos atos. O personagem de Tyler (Devin Druid) na segunda temporada é estuprado e a cena é mostrada com, no mínimo, mau gosto dos realizadores.

    Como resultado, o personagem esteve prestes a realizar um tiroteio durante o Baile de Formatura, o que até acendeu um debate interessante, especialmente nos Estados Unidos, onde casos de tiroteios entre jovens são recorrentes. No entanto, no último minuto, o protagonista Clay (Dylan Minette) salvou não só o personagem, mas também a série de receber críticas ainda piores.

    Mas há luz no fim do túnel.

    O LADO BOM (OU: O QUE FAZER AGORA?)

    A terceira temporada chegou com uma proposta diferente, mas ainda assim um pouco problemática. O antagonista, Bryce (Justin Prentice), que estuprou Hannah, não foi preso e acabou sendo morto. A série, cujo propósito inicial era debater temas importantes entre jovens, se tornou um mistério de Agatha Christie com toques adolescentes. 

    Mas pelo menos houve um pouco mais de consciência. O debate sobre a humanização do antagonista até gerou controvérsias, mas no geral trouxe resultados interessantes em nos fazer pensar o seguinte: o que causa comportamentos nocivos e até mesmo criminosos? É importante falar sobre o assunto enquanto ele ainda está na raíz e evitar que um jovem problemático vire um Bryce Walker. 

    Como já foi dito, existe luz no fim do túnel. Segundo diveros psiquiatras, psicólogos e profissionais de saúde no geral, a série tem um importante papel conscientizador para pôr luz em assuntos difíceis e complicados entre jovens — núcleo de maior crescimento dos casos de suicídio: 10% entre 2002 e 2014. Mas tivemos um excelente palanque usado de maneira errada.

    Fazendo uma analogia prática, é como se alguém construísse um palco enorme para falar de um assunto que PRECISA ser discutido e acaba atraindo diversos jovens necessitados de compreensão e um pouco de conforto. No entanto, em cima desse palco, as pessoas com o microfone falam sobre o tal assunto de maneira desordenada e por vezes irresponsável. Mas falam. 

    É o método errado na iniciativa certa. E por mais que a maneira como a questão foi falada tenha passado longe da ideal, ela ajudou pessoas que sequer tinham o que falasse por elas. Que nunca se sentiram compreendidas por personagens de suas séries preferidas. Que sofreram sozinhas por anos por sentirem que ninguém as compreendia. 

    Por isso, a melhor maneira de terminar esta matéria é dando voz a outras séries que agora podem usar da popularidade do palanque construído por 13RW: algumas séries recentes que tratam muito bem a questão da saúde mental, por exemplo, são My Mad Fat Diary, This is Us, Crazy Ex-Girlfriend, One Day at a Time. Sendo a primeira citada focada também no público jovem, tratando de problemas de aceitação, depressão, ansiedade, entre outras questões.

    Existe esperança.

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