A cena de abertura de “Sniper Americano”, filme dirigido por Clint Eastwood, é um dos momentos cinematográficos mais brilhantes do ano, até agora. Naqueles poucos minutos, está construído para a plateia todo o caráter de Chris Kyle (Bradley Cooper, indicado ao Oscar 2015 de Melhor Ator), atirador de elite dos Fuzileiros Navais e que, nos quatro turnos de que participou, durante a Guerra do Iraque, matou mais de 150 pessoas – feito que lhe deu a alcunha de Sniper Mais Letal da História Militar dos Estados Unidos.
Aqui, é importante fazer um adendo. Para um homem comum se transformar num sniper é preciso passar por um treinamento duro e de alto nível. Na maioria das vezes, ele opera sozinho, ao mesmo tempo em que pode trabalhar em par ou em grupo. Sua função primordial é manter contato visual próximo com o inimigo, abatendo-o, se necessário, de distâncias que excedam a capacidade de detecção das tropas inimigas.
Como se trata de um filme sobre o conflito recente que mais mexeu com o brio norte-americano, devido ao fato que o originou (os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001), “Sniper Americano”, com certeza, vai irritar aquelas pessoas que não aguentam mais o patriotismo dos norte-americanos, que levam a sério a predisposição a morrer pelo seu país e a brigar pela liberdade que é um dos pilares nos quais foram fundados os Estados Unidos. Dirigido por um notório defensor do partido republicano e uma das figuras que mais representam a coragem e dureza norte-americana, então, imagine a proporção que isso toma.
Porém, querer relegar “Sniper Americano” a isso é injusto. O filme vai além de todas essas noções preconcebidas sobre longas desse tipo. O roteiro escrito por Jason Hall em cima do livro que expõe as memórias de Chris Kyle é um mergulho na vida daqueles que se aventuram pelo militarismo. Kyle é o reflexo perfeito da obediência à hierarquia e à disciplina que pauta a vida do militar, com o acatamento sem contestação das ordens recebidas. Kyle foi para a Guerra do Iraque com uma intenção e a cumpriu até o fim de sua jornada.
Ao mesmo tempo, o filme não se exime de mostrar que passar por uma experiência desse tipo tem a capacidade de mudar profundamente a vida de um ser humano. A inércia, a sensação de não pertencimento, o sentimento de perigo constante, a presença ausente, tudo isso são sintomas do estresse pós-traumático pelo qual passam aqueles que se propõem a viver algo que só pode ser descrito por quem já passou por isso. Chris Kyle se tornou um sniper para poder salvar seus compatriotas. E o destino dele, por mais inacreditável que seja para quem passou pelo que ele vivenciou, foi o resultado dessa escolha dele – uma escolha que foi para toda a vida.