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    A História dos Blockbusters - Parte 5: Sobre vampiros, avatares e distopias

    E alguns muitos outros bilhões a mais.

    REUTILIZAR, RECICLAR E LUCRAR

    Hollywood, sem sombra de dúvidas, é uma das indústrias criativas menos criativas da história. Ao passo em que a Marvel/Disney ditava as novas regras do jogo apresentando o conceito dos universos cinematográficos, conjunto de obras que tornou-se sonho de consumo de toda e qualquer major de Los Angeles, as sagas e franquias apresentavam sinais de desgaste inesperados - o que não impediu com que a maior parte das companhias continuasse tentando investir na já fatigada onda. É fato que Transformers ocupou o topo das bilheterias em 2014 com o US$ 1,1 bilhão arrecadado por A Era da Extinção; por outro lado, nem mesmo os fãs mais antigos dos longas de Michael Bay puderam ignorar a inclusão de um dinossauro robótico, entre outros detalhes incongruentes, em uma trama mais frágil do que a performance de Mark Wahlberg. Não bastava mais, portanto, simplesmente oferecer a continuidade da trajetória de um personagem x ou y ao público: atualmente, ou a narrativa é integrada em uma constelação de narrativas outras ou apresenta-se um projeto totalmente autêntico aos espectadores - neste caso, Christopher Nolan é um dos poucos diretores capazes de manter a originalidade viva no cinema de blockbusters; seu Interestelar, obra impulsionada pelo pedigree do realizador, arrecadou US$ 675 milhões.

    Descobriu-se outra saída, contudo: investir, uma vez mais e inapelavelmente, na nostalgia. Um dos grandes trunfos da Disney, vale ressaltar, é possuir executivos e uma equipe criativa que se movimenta na velocidade da luz para agradar ao mercado e responder às tendências emergentes. Desse modo, enquanto os super-heróis - todos da Marvel, mas alguns produzidos pela Fox ou pela Sony - dominavam as outras posições do Top 10 das bilheterias e jornadas mais longas como O Hobbit e Jogos Vorazes se encerravam, a companhia que um dia enfrentou a falência cara a cara entendeu que era mais simples refilmar um sucesso do que pari-lo do nada. Fato é que Malévola (US$ 758 milhões) não arrecadou tanto quanto A Batalha dos Cinco Exércitos (US$ 956 milhões), mas a aventura protagonizada por uma Angelina Jolie estelar como sempre bateu um dos queridinhos das audiências, Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1 (US$ 755 milhões).

    Dirigido pelo ex-diretor de arte de Tim Burton, Robert Stromberg, Malévola é uma película extremamente representativa de seu tempo por inúmeros fatores. De um ponto de vista de produção e catálogo, a sombria fantasia foi a primeira adaptação live-action de um clássico da Disney desde Os 101 Dálmatas (US$ 320 milhões), lançado em 1996. Todavia, a gigante do entretenimento finalizaria este hiato de quase 20 anos através de uma releitura e não de uma recontagem direta. A história de Malévola foi vendida - sabiamente, diga-se de passagem - como uma espécie de prequel de A Bela Adormecida e foi motivada por uma questão-chave gerada pelas recentes conquistas do feminismo moderno: a terrível personagem que assombrou a vida da Princesa Aurora na animação era realmente tão terrível assim? A resposta do roteiro escrito por Linda Woolverton (O Rei Leão) é sonoramente negativa. Aliás, Malévola não só apresenta sua personagem principal como uma personagem repleta de conflitos - e, portanto, profundamente mais humana do que a natureza maniqueísta das vilãs e heroínas das animações da Disney -, como também introduz um mundo de fantasia onde contos de fadas não são irremediavelmente alegres e coloridos.

    O realismo infundido na narrativa - que, por sua vez, foi conjugado ao tom clássico das animações da Disney em um todo visualmente impressionante - aponta que o estúdio soube ouvir as demandas de seus consumidores - e consumidoras, principalmente: transferindo o protagonismo ainda mais para as mulheres - além de Jolie, Elle Fanning também foi bastante elogiada -, a Disney encontrou o caminho certo não só para se reconciliar com o público feminino como também para dar o pontapé inicial em uma série de live-actions imensamente felizes de suas obras mais celebradas. Quebrando paradigmas e aprofundando a ideia de que príncipes encantados em cavalos brancos são construções diretas de fábulas masculinas - A Bela Adormecida é baseado em um conto de Charles Perrault -, Malévola tornou-se uma companhia bem-vinda ao hit Frozen - Uma Aventura Congelante e ao live-action de Cinderela (US$ 543 milhões), de 2015. Compreender, por fim, o impacto cultural exercido por estas obras e suas irmãs da época é essencial para entender o fenômeno Mulher-Maravilha e os triunfos de outras produções semelhantes mais recentemente.

    Ainda em 2014 vale destacar o enorme retorno financeiro de Planeta dos Macacos: O Confronto, aventura que consolidou o nome de Andy Serkis como um dos grandes atores de sua geração - e papa da captura de movimentos, evidentemente -, elevou a carreira do diretor Matt Reeves e provou que, às vezes, é uma boa ideia salvar projetos antigos. O tétrico Planeta dos Macacos de 2001, dirigido pelo supracitado Burton e sumariamente destruído pela crítica, enterrara as chances dos primatas retornarem às telonas. Mas quando Planeta dos Macacos - A Origem (US$ 481 milhões) chegou às telonas em 2011 sob o signo da renovação e das prequels, a humanidade se viu novamente ameaçada pelos símios. O Confronto, enfim, arrecadou US$ 710 milhões impulsionado por um dos personagens mais carismáticos da história recente: o shakesperiano César. Fechando a franquia com chave de ouro, A Guerra (US$ 490 milhões), de 2017, recebeu aclamação geral da crítica e fez renascer o espírito dramático, sombrio e distópico de um dos épicos mais famosos da ficção científica - O Planeta dos Macacos, estrelado pelo astro Charlton Heston em 1968, foi o ponto zero de uma das franquias mais antigas e inovadoras da sétima arte.

    A EXPLOSÃO DOS BLOCKBUSTERS

    2015, por sua vez, foi um ano importante por extrapolar a quantidade de grandes blockbusters a serem lançados, construindo carreiras de alto êxito financeiro. Nos últimos capítulos e nos mais recentes parágrafos, nos debruçamos basicamente sobre as 10 mais bem-sucedidas produções de Hollywood de cada ano, mas 2015 nos obriga a lançar um olhar para os épicos e os imensos projetos que arrecadaram muitos dólares e que, mesmo assim, não integram o topo de suas épocas. Por isso, listaremos a seguir alguns dos êxitos que não foram mencionados anteriormente mas que merecem pelo menos uma referência nesta longa análise, uma vez que se aproximaram ou ultrapassaram a marca de meio bilhão nas bilheterias. São elas: Fúria de Titãs (US$ 493 milhões), de 2010; Gato de Botas (US$ 555 milhões) e Sherlock Holmes - O Jogo das Sombras (US$ 545 milhões), de 2011; As Aventuras de Pi (US$ 609 milhões), Ted (US$ 549 milhões) e Valente (US$ 540 milhões); Os Croods (US$ 587 milhões), Guerra Mundial Z (US$ 540 milhões) e Oz, Mágico e Poderoso (US$ 493 milhões), de 2013; e Operação Big Hero (US$ 657 milhões), Como Treinar seu Dragão 2 (US$ 621 milhões), Sniper Americano (US$ 547 milhões), Godzilla (US$ 529 milhões), Rio 2 (US$ 500 milhões), As Tartarugas Ninja (US$ 493 milhões) e Uma Aventura Lego (US$ 469 milhões) - que retornará ao nosso foco na próxima parte -, entre inúmeras outras produções que também poderiam ser citadas.

    Retornando à 2015, é possível perceber que - para além de três retornos e uma gratíssima surpresa cujas histórias serão contadas daqui a pouco - os lucros hollywoodianos vieram dos mais diversos gêneros, especialmente porque o período foi de transição para a tendência dos super-heróis ditada pela Marvel. À época, os espiões marcaram presença novamente - 007 Contra Spectre (US$ 880 milhões) e Missão Impossível 5: Nação Secreta (US$ 682 milhões) -; o fenômeno da literatura/trilogia de romances eróticos Cinquenta Tons de Cinza chegava às telonas com força total (US$ 571 milhões), apesar do abismo de críticas negativas; a franquia Jogos Vorazes fechava as contas com bons lucros em A Esperança - O Final (US$ 653 milhões); o posto de ficção científica mais lucrativa, anteriormente assumido por Gravidade e Interestelar, ficaria com Perdido em Marte (US$ 630 milhões); The Rock consolidava sua estrela uma vez mais com Terremoto - A Falha de San Andreas (US$ 474 milhões); Leonardo DiCaprioAlejandro Iñarritú levaram inúmeros espectadores aos cinemas para o faroeste de sobrevivência na neve, O Regresso (US$ 533 milhões); George Miller retornou do hiato com a franquia Mad Max com Tom Hardy como protagonista de Estrada da Fúria e uma Charlize Theron melhor do que nunca em sua irretocável carreira - o longa dominado pela Imperatriz Furiosa terminou arrecadando US$ 378 milhões; e Matthew Vaughn, estabelecendo seu status como lucrativo e confiável diretor de blockbusters, fez barulho com Kingsman: O Serviço Secreto (US$ 414 milhões).

    No âmbito da disputa das majors, a corrida pelo título de mais lucrativo estúdio do ano só seria decidida nos 46 minutos do segundo tempo, com a Disney levando a melhor. Até o mês de dezembro de 2015, a companhia tinha encontrado seu maior sucesso no absurdamente original e dramaticamente profundo Divertida Mente (US$ 857 milhões), considerada por muitos como o ápice das produções da Pixar. Raríssimo, o longa de Pete Docter (Up - Altas Aventuras) é daqueles que só aparecem ocasionalmente, conquistando a atenção de todos os âmbitos possíveis da esfera de consumo da sétima arte. Favorito no prestigiado e cult Festival de Cannes, onde foi lançado, a "sentimental" animação tomou conta das listas de melhores filmes do ano da imprensa especializada, gerou sua própria e bem-sucedida linha de produtos derivados e, por fim, entrou no imaginário da cultura pop de maneira instântanea. O espaço deixado pela Disney, no entanto, permitiu que a Universal encontrasse um vácuo no qual atuar, emplacando três produções com mais de US$ 1 bilhão de arrecadação e coroando a era do renascimento do estúdio.

    UNIVERSAL - DE VOLTA AO JOGO

    Sediada em Los Angeles desde 1912, a major não enfrentou riscos diretos de falência ou sofreu graves prejuízos financeiros na primeira década do terceiro milênio, mas isso não quer dizer que a companhia tenha sido especificamente exitosa no terreno dos blockbusters. A Universal só conseguiu emplacar múltiplos blockbusters no Top 10 em 2000 e em 2001, como Gladiador (US$ 457 milhões), Entrando Numa Fria (US$ 330 milhões) e Jurassic Park 3 (US$ 368 milhões). Após estes sucessos iniciais, emplacou blockbusters ocasionalmente e sem ter super-heróis para apresentar - o Hulk, que ainda é propriedade do estúdio, não ganhará outro filme-solo por iniciativa da companhia -, a Universal precisou se virar como pôde até encontrar duas minas de ouro: as nossas velhas conhecidas franquias Meu Malvado Favorito e Velozes & Furiosos.

    Minions (US$ 1,1 bilhão), segunda mais lucrativa animação da história, foi lançado como um spin-off de sucesso garantido. Os bichinhos amarelos titulares dominaram as prateleiras das lojas mundo afora e, devido aos rendimentos comerciais dos produtos licenciados, praticamente ajudaram os executivos da Universal a bater o martelo sobre o projeto derivado. Através da bilionária arrecadação, Minions pesou a balança e foi crucial para ajudar a franquia Meu Malvado Favorito a subir ainda mais na colocação de saga animada mais valiosa da história - o posto seria definitivamente assumido com o terceiro longa, de 2017, contabilizando um total de US$ 3,7 bilhões arrecadados. As corridas de rua, por sua vez, desapareceram quase que por completo da saga Velozes & Furiosos e foram substituídas pelo drama, cujo sétimo filme acabou lucrando de uma forma um tanto quanto macabra por causa do falecimento precoce e trágico de Paul Walker em um acidente de carro. Homenageado pelos colegas de elenco em profusão, pela trama do longa e pela canção-tema "See You Again", hit das paradas musicais do planeta inteiro, o ator teve sua performance completada através de efeitos especiais, reforçou a ideia de "família" que tornou-se um dos principais motores da franquia e ajudou o longa de James Wan (Invocação do Mal) a bater a marca de US$ 1,5 bilhão arrecadado.

    Mas a cereja do bolo do ano da retomada da Universal foi Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros. Parte reboot e parte sequência direta dos eventos da trilogia original de Steven Spielberg, a aventura comandada por Colin Trevorrow (Sem Segurança Nenhuma) retrabalhou a ideia de um parque de diversão com dinossauros completamente funcional e reintroduziu elementos antigos da franquia sob um olhar inédito. O personagem sério e heróico de Sam Neill e o galante e cômico papel de Jeff Goldblum foram unidos em um só, criando uma fusão que foi entregue à Chris Pratt, estrela em ascensão após o surpreendente Guardiões da Galáxia. A figura feminina, de Laura Dern no original, foi assumida por Bryce Dallas Howard. Aprofundando a relação entre seres humanos e as criaturas pré-históricas, Jurassic World trouxe novos questionamentos científicos, pertinentes à sua época, e causou um impacto semelhante ao de Jurassic Park nos idos de 1993. Resultado final? 1,6 bilhão arrecadado, rendimento que faz com que Jurassic World ocupe o posto de quarto filme mais lucrativo da história no momento.

    No entanto, a Disney estava disposta a estragar a festa da Universal e em meados de dezembro de 2015 lançaria um "pequeno filme" de ficção científica, uma guerra nas estrelas que vocês talvez conheçam...

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