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    Festival do Rio 2017: Lúcia Murat explica como o medo da violência inspirou o thriller Praça Paris (Entrevista Exclusiva)

    O AdoroCinema também conversou com as protagonistas Joana de Verona e Grace Passô.

    Lúcia Murat já é uma veterana no Festival do Rio. E, após quase 40 anos de carreira, a cineasta ainda é capaz de trazer uma novidade para o tradicional evento carioca: seu primeiro thriller. Esse é Praça Paris, uma co-produção entre Brasil, Portugal e Argentina.

    Curiosamente, se você observar somente a sinopse do longa (que compete na Première Brasil), parece ser mais um drama. Glória (Grace Passô) é marcada pela violência de um pai abusivo e do irmão traficante. Trabalhadora na Univerdade Estadual do Rio de Janeiro, ela passa a se consultar com uma psicanalista do local, a portuguesa e refinada Camila (Joana de Verona). Daí, surge um termo complicado, que "vira o jogo" para o thriller: contratransferência. Ou seja, as emoções que o terapeuta experimenta através do paciente. 

    Em entrevista para o AdoroCinema, Murat revelou que a ideia surgiu através de uma amiga, que lhe contou as dificuldades que jovens profissionais tinham ao lidar com a violência sofrida pelos clientes num centro de atendimento para pessoas carentes: "Desde o início, achava que essa história dava um thriller. Por isso, chamei o Raphael Montes (autor, roteirista de Supermax), pois ele tem uma fabulação para o suspense que eu não tinha. Já no papel da terapeuta, sempre quis que ela fosse uma pessoa estrangeira para exacerbar ainda mais essa questão. Para mostrar alguém caindo de paraquedas."

    A PARANOIA QUE SE TRANSFORMA EM MONSTRO

    Camila "cai" e Glória "vive" num cenário nada simples. Trata-se de um Rio de Janeiro cercado pela violência, onde disputas de poder formam uma bomba-relógio prestes a explodir, a qualquer hora, em qualquer local. Com drásticas diferenças sociais e culturais ao fundo, Praça Paris torna-se um relato sobre como o medo e a paranóia pode afetar o ser humano. Tudo isso, a partir do ponto de vista da mulher - que sempre acaba "pagando o pato" numa sociedade machista.

    "As pessoas que moram no Rio acabam procurando uma forma de se acostumar com a violência, sem legitimá-la, é claro. Há quase uma banalização, ao mesmo tempo que tem muita notícia sensacionalista. Claro que rola paranóia. Claro que rola medo. Então, levar isso para o filme foi um processo intenso e violento", declara Joana de Verona, atriz de nacionalidade luso-brasileira que assume seu quarto papel em nossa terrinha.

    Quem também levou seus conflitos pessoais na construção do filme foi a própria diretora - que fez um trabalho cooperativo com sua equipe durante meses, até culminar no trabalho final. "É uma vivência que, infelizmente, eu tenho. Eu fui presa política e torturada, então a questão da paranóia e do medo é algo que conheço. Quando construímos as personagens, você acaba jogando suas experiências de vida nelas. Num momento como esse, o Rio de Janeiro deixa seus moradores totalmente paranóicos. É algo que pode se transformar num verdadeiro monstro. Em algo doentio até."

    O BRASILEIRO COLONIZADO

    Já para Grace Passô, o seu trabalho não foi mostrar tal paranóia feminina diante da violência. Foi retratar o medo do olhar alheio e fugir dos esteréotipos. "Meu objetivo foi entender a profundidade de Glória, desenhar uma personagem que fosse além do fato de ser uma vítima da violência ou ser moradora do morro. Meu maior foco foi entender essa relação tão complexa sobre analisar e ser analisada numa terapia. Ainda mais nesse caso, onde você se vê sob o olhar de uma pessoa num nível social completamente diferente. Quão colonizador pode ser essa ideia."

    Colonização é algo que já aparece, de uma forma metafórica, no título do longa: Praça Paris. Nome de um símbolo do Rio de Janeiro, criado em 1926 para tentar se equiparar à arquitetura francesa. Ou como explica Murat, um lugar cheio de àrvores, mas com sombras que não refrescam sob o escaldante sol carioca. Um estranho paradoxo, assim como a discrepância social brasileira.

    Praça Paris ainda não tem previsão de estreia em circuito comercial. Leia a crítica do AdoroCinema.

     

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