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    Resident Evil: O que a série da Netflix poderia ter aprendido com o tempo e filmes anteriores (Opinião)
    Diego Souza Carlos
    Apaixonado por cultura pop, latinidades e karê, Diego ama as surpresas de Jordan Peele, Guillermo del Toro e Anna Muylaert. Entusiasta do MCU, se aventura em estudar e falar sobre cinema, TV e games.

    Com oito episódios, primeira temporada da série já está disponível no streaming.

    Fazer uma adaptação não é uma tarefa fácil. Para quem cresceu assistindo produções que se originaram de livros e outras mídias, existe uma noção de quando o projeto teve sucesso ao cumprir o que se propôs desde seus primeiros esboços.

    Dito isso, é bom frisar que uma boa adaptação também não diz respeito apenas a reproduzir o material de origem de ponta a ponta. Os universos do cinema e da TV, que agora adicionam o turbo do streaming à equação, são mais complexos do que se imagina. Além disso, qual é a graça de ver um espelho exato do que já foi feito quando existem possibilidades de linguagem que podem enriquecer qualquer trama?

    O Rei Leão (2019), por exemplo, é um grande filme e ganhou o público (e rios de dinheiros!) por sua produção e efeitos especiais, mas sobretudo é movido por uma grande nostalgia. Fora da tecnologia que constrói Simba, Mufasa, Nala, Timão e Pumba, há também uma falta no quesito criatividade. 

    Para além das obras literárias, de onde surgiram a maioria das séries e filmes adaptados, jogos eletrônicos sempre entram em uma seara turbulenta, representando até mesmo projetos de risco pelo estigma criado ao longo dos últimos anos. Esse imaginário não foi criado do nada: poucas produções audiovisuais conseguem levar a essência dos games dos quais se baseiam. Quando isso acontece, temos obras que sustentam um equilíbrio entre novas ideias e elementos que fizeram a história funcionar na mídia primária.

    Entre tais produções está Resident Evil: A Série, atração da Netflix que acaba de desembarcar no catálogo do streaming.

    Primeira série live-action de Resident Evil

    Resident Evil é a segunda adaptação live-action da franquia da Capcom lançada em menos de um ano. Em dezembro de 2021, o filme Bem-Vindo a Raccoon City chegou aos cinemas com uma proposta há muito esperada pelos fãs: trazer a história dos primeiros games para a telona, fruto de uma fidelidade que nunca foi vista quando a marca estava nas mãos de Paul W. S. Anderson. Tal premissa, apesar de bem intencionada, não foi bem vista pelo público e muito menos pela crítica.

    Com um orçamento inferior a outros projetos da marca, efeitos especiais datados e um roteiro que prensou a história de dois jogos em pouco menos de duas horas, o longa não funciona nem como trash ou Filme B. A título de curiosidade, a quantia usada para produzir o longa, US$ 25 milhões, é a mesma utilizada para desenvolver Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo. Percebem a diferença? O projeto cinematográfico foi conduzido pela Constantin Film, a mesma produtora que desenvolveu os seis projetos estrelados por Milla Jovovich e também dá as caras na série lançada há alguns dias.

    O que a série da Netflix poderia ter aprendido com o tempo e com adaptações anteriores?

    Agora no streaming, com a primeira empreitada seriada e live-action de Biohazard, o showrunner Andrew Dabb decidiu ir por outro caminho, talvez um híbrido das duas situações anteriores: uma história que apresenta elementos-chave dos jogos, mas toma liberdade para caminhar em outras direções. Vale pontuar também que a produção é uma das primeiras a trazer um elenco amplamente diverso para a franquia.

    A história conta com duas linhas do tempo, incluindo acontecimentos contemporâneos, a ponto de citar a pandemia de COVID-19, por exemplo. Nesta época, Jade (Tamara Smart), se muda para New Raccoon City, na África do Sul, com a irmã Billie (Siena Agudong) e o pai Albert Wesker (Reddick). 

    Mais de dez anos depois, a Terra tem menos de 15 milhões de habitantes e mais de 6 bilhões de monstros: pessoas e animais infectados pelo T-vírus. Jade, agora com 30 anos, luta para sobreviver nesse novo mundo enquanto é assombrada por segredos do passado que envolvem sua irmã desaparecida, seu pai e a Umbrella Corporation.

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    Conforme adiantado pelo showrunner, tudo que aconteceu nos jogos está neste universo, tanto que existem diversas citações sobre a tragédia de Raccoon City, de 1998, à morte do verdadeiro Wesker em um vulcão (eventos de Resident Evil 5), visitas às montanhas Arklay, uma reprodução curiosa da cena em que Jill se vê transformada, aqui com Billie em frente ao espelho, e até mesmo um lembrete de que Ada Wong existe naquele universo - seria curioso, inclusive, ver uma versão mais velha da personagem, já que a trama principal acontece em 2036.

    No entanto, os elementos citados não sustentam uma história desconexa e, em diversos momentos, genérica. A ação não é “inovadora e revolucionário”, como já diria Isabela Boscov. As sequências, inclusive, são por muitos momentos preguiçosas e previsíveis. Alguns monstros inclusive, não são utilizados de maneira inventiva e surgem em tela apenas na tentativa de agradar quem já experienciou este universo nos games.

    Ao ser lançado em 2022, exatamente vinte anos após a estreia da primeira adaptação de Resident Evil, O Hóspede Maldito, a série teve a oportunidade de aprender com o erro das adaptações anteriores - algo que não aconteceu. Como dito, adaptações não devem seguir regras de reprodução, mas duas décadas podem dar uma noção do que o público do game espera das incursões da franquia em outras mídias.

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    Com um longa lançado meses antes, que tentou levar a história dos primeiros títulos para o cinema de maneira “fiel”, a série poderia focar em narrativas menores, que abarcassem o universo, além de personagens novos e antigos, mas sem a necessidade de megalomania presente nos filmes e na própria narrativa seriada. Apenas um ou dois heróis, pouca munição e toda aquela atmosfera de medo e tensão.

    O que pode-se tirar do exercício de adaptar Resident Evil nesse período é que menos é mais, inicialmente, mesmo que sequências de ação catapultem a adrenalina para as alturas. Alinhado à essa ideia, os produtores poderiam trazer uma história intimista que fomenta a essência da franquia. 

    Essência de Resident Evil

    Em essência, Resident Evil nunca foi uma obra de arte em termos narrativos. As histórias, inclusive, por muitas vezes seguem uma estrutura semelhante com etapas que fazem sentido na jogatina. Sempre há um mistério, algum tipo de conspiração, traições, um vilão cafona com mania de grandeza, alguns sustos no caminho, territórios tenebrosos a serem explorados e um clima de suspense constante - principalmente nos títulos em que o survivor horror transborda a cada passo a partir do receio sobre o que nos aguarda no próximo cômodo, algo perceptível nas três primeiras aventuras, por exemplo.

    Para além da nostalgia, os títulos mais novos, como Resident Evil 7 e Village, oferecem outras inspirações que podem ser amplamente aproveitadas nas telas, com referências a O Massacre da Serra Elétrica, O Lobisomem, A Vila, entre outros.

    Em uma ótica purista, até mesmo trazer uma reformulação dos títulos iniciais, com tempo, apreço cinematográfico, uma queda pelo gore e noir, e atenção a um roteiro simples, mas eficaz em apresentar uma história de terror que transforma Raccoon City numa personagem suja, podre e fascinante. Vinte anos depois, ainda falta uma adaptação de Resident Evil que consiga somar bons recursos a uma história que honre os games.

    Com oito episódios, Resident Evil já está disponível no catálogo da Netflix.

    Resident Evil: A Série
    Resident Evil: A Série
    Data de lançamento 2022-07-14 | min
    Séries : Resident Evil: A Série
    Com Ella Balinska, Tamara Smart, Siena Agudong
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