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    Kati Critica: Como Friends mudou as nossas vidas

    E não somente por nos fazer bater palminhas cada vez que toca "I'll be there for you"!

    Katiúscia Vianna é uma redatora do AdoroCinema que acumulou mais de duas décadas de cultura inútil e decidiu transformar isso num emprego. Nessa jornada, ela tem a missão de representar os fandoms barulhentos e/ou esnobados do Twitter, falar das séries que a crítica ignora e celebrar as '"farofas" que trazem alegria para o povo. Ou seja, os guilty pleasures! Com um ponto de vista 'singular' (ou doido, depende de quem opina), surge a coluna Kati Critica — misturando açúcar, tempero e um pouco de haterismo zoeiro.

    Eu tinha apenas 10 anos quando Friends chegou ao fim. Como sou daquele tipo de pessoa que não lembra o que comeu no jantar do dia anterior, minhas lembranças são bem vagas sobre essa época. Lembro de ver o episódio no sofá, perto de uma das minhas irmãs, com a família distribuída pela sala. Lembro de não ter entendido muita coisa, pois meu inglês era formado, basicamente, pelos clipes legendados de Britney Spears que passavam na TV a cabo. Mas lembro do sentimento de estar vendo algo realmente marcante.

    Como já citei, por diversas vezes, nesta coluna; venho de uma família muito ligada a cultura televisiva. Sou da época que Queer Eye ainda tinha "for the Straight Guy" em seu título. Recordo de programas que nunca mais vi passando na programação, mas isso nunca aconteceu com Friends, obviamente. Tal sitcom se tornou tão natural em minha casa, como um parente visitando e falando mal dos outros, sabe? Ou tradicional como o pavê que mamãe faz nos feriados — felizmente, sem bife ou ervilhas. Por isso, é difícil responder o que torna essa série tão especial, uma pergunta feita cada vez mais perto do dia 22 de setembro, quando Friends completa seu 25º aniversário.

    Afinal, eu tenho apenas um ano a mais de vida que a série. Sou da geração que, literalmente, cresceu vendo os seis amigos se encontrarem no Central Perk; mas só foi entender a piada do "Seven" ao rever episódios durante os tempos de adolescente.

    É curioso ver como algo tão anos 90 (sério, basta olhar para os jeans das garotas nas primeiras temporadas) pode ainda ser tão popular, a ponto que jovens de hoje estão maratonando de forma frenética. E não é algo nostálgico, como as referências da década de 80 em Stranger Things. Eles acompanham isso como a mesma ferocidade que acompanham ships de Riverdale. E Friends ainda tem um alcance mundial que não chega a outras séries cômicas de sucesso, como The OfficeParks and Recreation (que também merecem amor, viu?).

    Só de citar a possibilidade dessa bagaça sair da Netflix já é o suficiente para todo mundo querer arrancar os cabelos e xingar no Twitter. Eu não, tenho o box de DVDs, obrigada. Aí lembro que a gente mal usa DVD e meu aparelho deve estar cheio de poeira e/ou quebrado. Aí, me desespero junto.

    Após muita reflexão — e de estar escrevendo o rascunho deste texto encostada na parede do metrô, com uma letra horrível que demorou uma vida para entender, diga-se de passagem —; acredito que cheguei à uma solução: está tudo no título. Por mais que a gente ame nossa família, todo mundo pode contar histórias loucas e sem julgamentos, ao se reunir com amigos (mesmo que isso seja cada vez mais difícil de fazer fora do celular).

    Ou melhor, até conta com aquele julgamento zoeiro que só a intimidade da amizade é capaz de promover.

    Rachel (Jennifer Aniston), Monica (Courteney Cox), Pheobe (Lisa Kudrow), Joey (Matt LeBlanc), Chandler (Matthew Perry) e Ross (David Schwimmer) não são figuras definidas, apesar de seus estereótipos. Passamos dez anos acompanhando como eles se transformam nas melhores versões de si mesmos, serem os sapatos que se tornarão chapéus (essa é para os fortes, beijos no easter-egg). E não são apenas evoluções! Suas jornadas têm altos e baixos; corações partidos e romances épicos; empregos bons e ruins... Da mesma forma que sempre observamos nossas próprias vidas como metas a serem alcançadas, buscando algo novo eternamente. É tipo uma corrida de obstáculos a ser conquistada. Escola, faculdade, lidar com crush, arrumar emprego, ter um relacionamento estável, ter dinheiro para aquela viagem, casar, morar sozinho, ter filhos e por aí vai.

    Porém, essa é a resposta mais fácil. Acredito que ainda podemos ir além. Nós somos os Friends.

    E não falo isso apenas porque meu sonho de infância era morar com as BFFs e encontrar meu Chandler do outro lado do corredor. Naquela época eu não sabia as dificuldades que teria ao pagar um simples boleto, imagina bancar um apartamento de dois lugares em Nova York. Sim, antes dessa fachada sarcástica, já fui ingênua, que graça, não? Voltando para a teoria, como pessoa egocêntrica que sou, vou me usar como exemplo para explicar tal ponto de vista, depois diga-me se foi capaz de se identificar com alguma situação.

    Começando na infância, quando meu personagem preferido era Joey. Ainda sem uma visão critica suficiente para odiar como ele trata algumas de suas conquistas, sempre o achei hilário, com sua visão bobalhona sobre a vida, beirando entre a ingenuidade e burrice, que tanto encanta a juventude. E ainda nos representa quando tentamos entender alguma coisa em francês ou tentam roubar nossas batatas fritas.

    A partir da pré-adolescência, o objetivo de vida é ser alguém como a Rachel. Bela e estilosa, porém ainda rebelde o suficiente para fugir das expectativas dos pais e construir o próprio caminho(afinal, ser adolescente consiste em falar como seus pais não te entendem e ouvir alguma cantora pop loira no volume máximo). Ao mesmo tempo, é impossível não shippar seu romance com Ross, pois ele é o carinha que espera anos para ficar com sua lagosta — mesmo que tenha umas atitudes bem embustes ao longo das temporadas. Como não perdoá-lo ao relembrar do VHS da festa de formatura?

    Ps: Particularmente, eu sou uma pessoa mais pragmática, então o desculpo mesmo cada vez que rio, como uma idiota, com o "PIVOT!", mas isso é outra história.

    Por outro lado, quando você começa a crescer, também começa a sentir como seu lado Monica é mais presente; ao ser uma mãezona para os amigos; ou por simplesmente apreciar mais uma casa arrumada do que se empolgar para ir no rolê. E, por mais que você tenha amado Pheobe desde o início (se não, você viu errado); é quando somos adultos que percebemos a real magia da personagem. Pois cantarolar "Smelly Cat" é fácil, mas perceber como ela é capaz de manter sua alegria e excentricidade, mesmo depois de passar por tanta coisa ruim na vida, sendo digna de admiração eterna. Sem falar que ela é responsável por algumas das melhores falas da TV mundial...

    Finalmente, e sendo completamente sincera, durante todo tal processo de amadurecimento humano obrigatório, a vida nos dá tanta porrada que é impossível não adotar a postura de Chandler e rir da desgraça. Honestamente, todo meu caráter é construido na premissa de ser desconfortável ao redor de outras pessoas e só saber se comunicar através de ironia. Basicamente, vivo a partir da questão "O que Chandler Muriel Bing faria?". Mas, ao mesmo tempo, somos egoncêntricos a ponto que nunca considerarmos que, talvez, podemos ser o Gunther (James Michael Tyler) para outras pessoas. Eu sei que, pelo menos, grito que nem a Janice (Maggie Wheeler), para a infelicidade dos pobres dos meus amigos!  

    Para comemorar o 25º aniversário de Friends, eu poderia listar quais foram os melhores capítulos e frases, escrever monografias sobre a evolução de cada personagem, planejar spin-offs dos convidados especiais (e depois desistir ao lembrar de Joey) e começar um debate para desvendar a maior questão da humanidade: se Rachel e Ross estavam dando um tempo ou não.

    Ficaria feliz de fazer qualquer uma dessas matérias. Só que tenho uma conexão emocional demais para deixar essa oportunidade passar. Ver o episódio de Ação de Graças com Brad Pitt é, realmente, uma tradição na minha família, tanto que minha mãe comprou um DVD de 4 episódios da oitava temporada, pois queria tê-lo em casa, mas não tinha dinheiro para comprar o box. O primeiro boneco Funko que tive (presente de um grande mentor na vida) foi a Phoebe. O nome do cachorro que foi meu melhor amigo durante 15 anos era Joey. Conheça-os abaixo:

    Resumindo, o grande trunfo de Friends não é somente ser uma comédia premiada com dez temporadas. E, sim, existem arcos que envelheceram mal, como as piadas com os flashbacks da Monica gorda e basicamente metade da vida emocional de Ross. Inclusive, vou pausar aqui e dizer que Emily (Helen Baxendale) não estava tão errada assim, viu?

    Mas seu marco veio justamente por se comunicar com o espectador. Sabe andar na linha tênue entre a mania antiga de zapear pela TV e ver um episódio aleatório; mas ainda ser uma bela opção de maratona num streaming — e assim se tornando parte da cultura pop até hoje. Te faz rir, mas quem nunca chorou com o pedido de casamento 'Mondler'? É basicamente uma união cósmica e inexplicável de fatores que criaram um projeto capaz de ser amado por diferentes públicos, em várias gerações, durante várias décadas. Não é o tipo de coisa que acontece todo dia. São poucas as obras que podem ser reprisadas tantas vezes e ainda manter boa resposta do público.

    É tipo FriendsA Usurpadora e Alma Gêmea, e só. Mas também, como não amar algo que nos dá cenas como essas?

    Moral da história:

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