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    César Deve Morrer
    Críticas AdoroCinema
    5,0
    Obra-prima
    César Deve Morrer

    Arte transformadora

    por Lucas Salgado

    A obra de William Shakespeare já ganhou inúmeras adaptações para os cinemas. Na verdade, nenhum outro autor gerou tantos filmes como ele. São tantas, mas tantas versões que é impossível não ter a sensação de que a obra de Shakespeare já deu o que tinha que dar nas telonas. Aí surge um longa como César Deve Morrer para provar que tal sentimento era equivocado e que enquanto houverem boas ideias e diretores criativos não há porque não se investir em novas adaptações.

    Dirigido pelos irmãos Paolo Taviani e Vittorio Taviani, César Deve Morrer acompanha a encenação da peça "Júlio César" por prisioneiros de um presídio de segurança máxima na Itália. Os cineastas acompanharam por seis meses a preparação para a montagem, mostrando ensaios, trocas de diálogos e até mesmo testes para o elenco. O registro é documental, mas a dupla também valoriza a narrativa e cria por si só uma versão da peça, servindo também como obra de ficção.

    A produção é emocionante. Em determinada cena, um dos atores diz: "No momento em que conheci a arte, esta cela se tornou uma prisão." A sequência é bela e as palavras penetram no coração e na mente do espectador. Mostra o poder de transformação da arte e como a entrega a um personagem pode gerar uma atuação marcante independentemente do talento técnico de determinado ator.

    Cada um dos intérpretes do longa é um prisioneiro de verdade e o filme não faz questão de esconder seus crimes. César Deve Morrer também não defende a inocência de qualquer um dos sujeitos ou perde tempo tentando dizer que foram curados pela arte. A atividade cultural muda aqueles homens, mas isso não significa que não voltariam a cometer os mesmos crimes se soltos.

    A produção ratifica a abrangência da obra de Shakespeare e faz um belo estudo sobre as atitudes dos homens. As angústias de Salvatore Striano como Brutus, a delicadeza de Juan Dario Bonetti como Decio e a confiança de Giovanni Arcuri como César são alguns dos elementos mais curiosos do longa.

    Nome consagrado no cinema italiano, responsável por clássicos como Último Tango em Paris e O Carteiro e o Poeta, o editor Roberto Perpignani faz um belíssimo trabalho no filme. Ele mescla cenas da montagem final, com ensaios nas partes externas e internas da prisão, passando sempre a sensação de continuidade à história. Também merecem aplausos os compositores Giuliano Taviani e Carmelo Travia, que compuseram uma trilha marcante e ao mesmo tempo bela. A fotografia de Simone Zampagni é outro elemento que merece reconhecimento. Ele une como poucos as cenas coloridas e em preto e branco.

    Cesare Deve Morire (no original) conta ainda com trabalhos monumentais de direção de arte e design de produção. É impressionante como transformaram o ambiente claustrofóbico de um presídio em verdadeiros salões romanos. Você sabe que é uma montagem e que estão todos presos, mas por alguns instantes pode ver os homens serem transportados para uma nova realidade. E o mais emocionante é que, pelo visto, eles sentem a mesma coisa.

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