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    A Odisseia
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    A Odisseia

    À deriva

    por Taiani Mendes

    Jacques-Yves Cousteau foi um militar, cineasta, explorador, pesquisador, inventor e oceanógrafo conhecido por suas aventuras marítimas a bordo do navio Calypso. Figura popular e extremamente midiática na metade do século XX, hoje é basicamente um nome forte presente no imaginário e o público em geral parece desconhecer por completo sua obra audiovisual. Com apoio e apelo de elenco forte, o diretor Jérôme Salle se propõe a jogar novamente o foco sobre a controversa personalidade francesa em A Odisseia.

    Ao invés de seguir a estrutura biográfica padrão, da infância à morte, o roteiro de Salle e Laurent Turner recorta a experiência de Cousteau (Lambert Wilson) como pai, confrontando seus ideais e sua personalidade com o estilo do filho caçula, Philippe (Pierre Niney), assim como ele um destemido apaixonado pelas formas de vida subaquática. As semelhanças param por aí.

    A primeira parte do drama dedica-se a apresentar a família feliz composta por Jacques, a esposa Simone (Audrey Tautou), Philippe e seu irmão Jean-Michel (Benjamin Lavernhe adulto, Rafael de Ferran criança), destacando a proximidade do clã com a água e explicando a trajetória do senhor Cousteau, já reconhecido pela invenção do aqualung, até então – o que é feito da maneira menos cinematográfica possível, com ele respondendo perguntas do filho. A partir do arrendamento do famoso navio Calypso, quando torna-se de fato um homem do mar, Cousteau decide colocar os herdeiros num internato e a harmonia é quebrada.

    Avançando uma década e meia e passando a explorar o complicado relacionamento entre pai empresário egocêntrico e filho ecologista ressentido, as fragilidades do filme se evidenciam. No afã de explorar as oposições mais óbvias – um trai a esposa, o outro é amoroso com a família; um é guiado pelo dinheiro e atua na prospecção de petróleo, o outro preocupa-se com o meio ambiente –, ambos protagonistas acabam parecendo extremamente confusos e contraditórios, marionetes do embate, pouco aprofundados.

    Numa cena Philippe, que faz carreira como cinegrafista, está arriscando apaixonadamente sua vida para capturar as melhores imagens de tubarões e minutos depois repudia a importância que o pai dá às filmagens. Ao invés de sugerir dubiedade, como a dedicação de Jacques aos documentários no estilo reality show por necessidade de dinheiro ou de alimentar sua sede de fama, a mudança radical de opinião deixa o jovem incompreensível aos olhos do espectador. As únicas transformações desenvolvidas com um pouco mais de cuidado são as do diálogo entre pai e filho e ainda assim é tudo bem cíclico e formatado na direção da punição do ser negligente, sem meia-tinta responsabilizado pela infelicidade de todos os envolvidos.

    Simone é outra vítima do subdesenvolvimento, indo de 4ª mosqueteira da equipe de mergulhadores e entusiasmada financiadora a reclusa reclamona amargurada num piscar de olhos. Jérôme Salle passa batido pelo complexo relacionamento do casal e não há, de forma geral, como deixar de sentir a falta de conteúdo fundamental entre as sequências do filme, a narrativa lacunar.

    Jean-Michel, o filho mais velho, é desprezado pelo genitor e pelo longa-metragem, sempre em último plano. Na realidade, no entanto, ele – autor do livro em que o filme se baseia – é quem tinha as mais sérias divergências com o pai e voltou-se para a preservação da natureza com o passar dos anos. Não dá, portanto, para valorizar A Odisseia do ponto de vista biográfico, tampouco pelo superficial drama de família carregado na piegas mensagem inspiradora e redentora, com tons de tristeza. Restam as belas imagens subaquáticas, deslumbrantes principalmente quando ganham a telona sem música, honrando O Mundo do Silêncio – obra que deu a Cousteau e Louis Malle o Oscar de documentário e a Palma de Ouro no Festival de Cannes, citada aqui num segundo.

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