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    Após incêndio, entenda a importância da Cinemateca Brasileira para a história do cinema nacional

    Incêndio atingiu o galpão da Cinemateca Brasileira em São Paulo, onde fica o maior acervo de filmes da América Latina.

    Um incêndio atingiu o galpão da Cinemateca Brasileira, localizado na Vila Leopoldina, Zona Oeste de São Paulo, na noite desta quinta-feira (29). Para que não conhece, a Cinemateca é uma uma instituição de relevância máxima para a história do cinema brasileiro, onde se encontra o maior acervo de filmes da América Latina

    Segundo informações iniciais, um curto-circuito no sistema de ar condicionado pode ter causado o incêndio, quando uma empresa terceirizada estava fazendo sua manutenção. O Corpo de Bombeiros não relatou vítimas, mas o lugar preserva arquivos de filmes altamente inflamáveis de 35 mm e 16 mm. Segundo a capitã dos bombeiros Karina Paula Moreira, "o incêndio começou em uma das salas de acervo histórico de filmes que fica no primeiro andar. Essa parte é dividida entre três salas, uma delas com acervo de filmes entre 1920 e 1940 e uma das salas de arquivo impresso, também histórico. Estamos levando o que foi queimado e preservado dentro dessas três salas – provavelmente nada. Porém, no andar térreo, tem uma parte grande do acervo histórico que não foi atingida", disse em entrevista para a GloboNews.

    A Polícia Civil investiga as causas do incêndio e eventuais responsabilidades pelo incêndio, assim como a Polícia Federal (PF), a mando da Secretaria Especial da Cultura, também irá apurar o caso.

    Cinemateca Brasileira sofre falta de recursos e negligência governamental

    Em 2016, outro incêndio atingiu o armazém da Cinemateca Brasileira e causou estragos irreparáveis em mais de mil rolos de filmes antigos. Em 2020, o lugar foi inundado depois de chuvas fortes, também danificando parte de seu acervo cultural. 

    A Cinemateca Brasileira sofre com a escassez de recursos financeiros, que prejudica a complexa manutenção de seu acervo, inclusive com atraso de pagamentos aos seus funcionários, que também causa danos colaterais, como possíveis corte de luz da sede. Isso seria desastroso, pois certos materiais mais sensíveis são conservados em salas climatizadas e correm o risco de se deteriorar rapidamente ou de sofrer autocombustão – que foi a causa do incêndio em 2016.

    O Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP) alertou em ação movida em 2020 que havia perigo de incêndio no galpão da Cinemateca, alegando negligência do governo federal – responsável pela Cinemateca Brasileira – na manutenção do prédio, além de relatar atrasos no pagamento de salários e de contas de serviços públicos e salários do instituto. Em audiência realizada no dia 20 de julho, o MPF-SP alertou o governo federal para o risco de incêndio, tanto na sede da Cinemateca, localizada na Vila Mariana em São Paulo, assim como nos galpões da Vila Leopoldina – onde aconteria o incêndio pouco tempo depois.

    Depois do ocorrido, a Secretaria Especial da Cultura publicou um edital nesta sexta-feira, 30, para seleção de uma entidade privada sem fins lucrativos para gerir e preservar Cinemateca Brasileira pelos próximos cinco anos. 

    Os trabalhadores da Cinemateca Brasileira publicaram um manifesto sobre o incêndio na unidade da Vila Leopoldina, chamado de Crime Anunciado: "O incêndio que acometeu o edifício da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina na noite de 29 de julho de 2021 foi um crime anunciado, que culminou na perda irreparável de inúmeras obras e documentos da história do cinema brasileiro. Essas instalações são parte fundamental e complementar em relação ao espaço da Vila Clementino, onde se encontra armazenada a maior parte do acervo da Cinemateca Brasileira". Leia o manifesto na íntegra:

    Maior acervo de imagens em movimento da América Latina

    A Cinemateca Brasileira é responsável pela "preservação e difusão da produção audiovisual brasileira" e abriga em sua sede, em São Paulo, milhares de filmes nacionais e estrangeiros e mais de um milhão de documentos relacionados ao cinema, como fotos, roteiros, cartazes e publicações impressas. Localizada desde 1992 no bairro da Vila Mariana, a coleção é considerada o “maior acervo de imagens em movimento da América Latina”, com mais de 200 mil rolos de filmes, que correspondem a 30 mil títulos, entre longas-metragens, documentários, programas jornalísticos e peças publicitárias, além de um catálogo digital com mais de 250 mil arquivos, que podem ser acessados pelo site oficial da Cinemateca.

    Essa responsabilidade de conservar o rico legado do audiovisual brasileiro é uma missão de custo e risco elevados. Desde sua fundação, em 1946, a Cinemateca já sofreu com incêndios que danificaram seu acervo, o que se agravou nos últimos anos, como falamos anteriormente, com escassez de recursos financeiros e negligência governamental em preservar a cultura do Brasil.

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    Muitos artistas brasileiros se manifestaram sobre a tragédia em suas redes sociais, como foi o caso da atriz Leandra Leal: "É muito revoltante perder parte do acervo da cinemateca, é inaceitável e triste. Estou rezando para que os bombeiros consigam controlar o fogo e salvar algo da nossa identidade", disse Leal.

    Kleber Mendonça Filho, diretor de Bacurau e que, recentemente, foi membro do júri do Festival de Cannes 2021, também lamentou o incêndio nas redes sociais: "Um incêndio atingiu a Cinemateca Brasileira na noite passada, em São Paulo. Quatro toneladas de material foram perdidos. Após o incêndio no Museu Nacional do Rio e múltiplos pedidos de ajuda na comunidade do cinema (20 dias atrás, eu falei sobre isso em Cannes), nada foi feito. Não parece que isso foi um acidente", comentou. 

    Outro que se manifestou foi o diretor Walter Salles, de Central do Brasil: "O incêndio do galpão da CB é o resultado do desprezo e incompetência de um governo que veio para apagar a nossa memória coletiva, e não para preservá-la. Ao afastar o corpo técnico altamente especializado da CB, o governo criou as condições para essa tragédia anunciada. Esse desastre não é um incidente, e sim a consequência de uma política de estado. Uma Cinemateca guarda a memória visual de todo um país. É um bem público, que pertence a todos os brasileiros e não a um governo. Simbolicamente, o incêndio do galpão da Cinemateca Brasileira – e portanto da nossa memória coletiva – é como o incêndio das terras públicas na Amazônia. Um crime", expressou o cineasta. 

    O ocorrido na Cinemateca Brasileira mostra como os espaços culturais no Brasil sofrem descaso pelas instituições governamentamentais. Mais do que nunca, esses patrimônios precisam de preservação, pois são a história da nossa cultura. O AdoroCinema lamenta esse acontecimento triste e irreparável para o cinema brasileiro.

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