Se você vem acompanhando o cinema de horror nos últimos anos, sabe que Robert Eggers é uma das grandes revelações do gênero. Desde a sua estreia com A Bruxa (2015), o cineasta conseguiu provar que detém uma grande força criativa. Ao invés de apostar em truques baratos, o diretor aposta em experiências imersivas, atuações excepcionais e uma direção de arte singular. E tudo isso pode ser presenciado em O Farol, o segundo longa de sua carreira.
Na história, Thomas Wake (Willem Dafoe) é o responsável por um antigo farol, localizado em uma ilha isolada. Para ajudá-lo com a manutenção do lugar, ele contrata Ephraim Winslow (Robert Pattinson), que irá substituir o antigo funcionário.
Isolados, os dois começam a presenciar fenômenos inexplicáveis, e a áurea da produção fica extremamente densa. E não é para menos: O Farol é influenciado pelo terror cósmico de H.P. Lovecraft, autor que chocou o mundo com suas obras literárias nefastas, repletas de criaturas marítimas, espaciais e demoníacas.
A fotografia — realizada em preto e branco — consegue evocar clássicos como O Sétimo Selo e A Hora do Lobo, ambos realizados por Ingmar Bergman. E para um artista novato conseguir tal feito, é necessário muito talento. Apenas com isso, já entendemos que as referências de Eggers são refinadas, e influenciam a qualidade de seu trabalho.
O Farol: "Eu não sabia que Robert Pattinson queria me socar", brinca diretor sobre tensão no set (Exclusivo)Claro, a produção não é leve. Inclusive, assistí-la é embarcar em uma jornada de difícil compreensão. Mas conforme entendemos as simbologias e metáforas inseridas na trama, nos encantamos com o filme. Confira a seguir, algumas explicações acerca do conceito de O Farol, que está disponível no Telecine:
O Farol é um filme sobre a destrutividade da solidão
Antes de analisarmos simbologias e referências mitológicas, precisamos entender que O Farol também é um filme sobre a solidão em seu aspecto mais destrutivo. Estar sozinho na história representa o distanciamento de si mesmo, e portanto, a ascensão de um estado psicótico e puramente instintivo.
Nunca saberemos se as visões de Thomas e Ephraim são alucinações. Contudo, o isolamento intensifica o surgimento de conflitos, e a ruptura com a realidade.
A mitologia é uma das protagonistas da obra
*Atenção, contém spoilers!
Quando Thomas amaldiçoa Winslow por ofendê-lo, ele invoca os sete mares e até Poseidon. A sequência — por mais exagerada que seja — acaba se concretizando no clímax do filme, quando os dois faroleiros entram em um grande conflito.
Ali, vemos Thomas com tentáculos, algas marinhas espalhadas pelo corpo, e até um chifre de coral saindo de sua testa. Para muitos, o personagem está caracterizado como Proteus, filho de Poseidon. Na mitologia, um dos principais traços da entidade é a violência, e a imprevisibilidade.
E qual melhor forma de representar o filme, se não por esse ser? Tanto Thomas quanto Ephraim estão mergulhados em uma espiral de loucura. Suas ações — a partir de certo tempo — assumem um caráter inesperado e mortal.
Portanto, não é tão arriscado dizer que O Farol é uma grande alegoria à perda do controle e a degradação da humanidade pelas óticas da mitologia grega.
Netflix divulga fotos de Robert Pattinson e Tom Holland em The Devil All The TimeA simbologia por trás do farol
Outra possibilidade que podemos levantar é o papel do farol na narrativa. Para muitos, o local é a fonte de toda a vida na ilha. É a partir do farol que Thomas (ou Proteu) consegue manter todas as criaturas sob o seu comando. Portanto, isso explicaria o motivo de Winslow sempre estar proibido de se aproximar do lugar.
Também é possível realizar uma interpretação mais próxima da psicanálise. Talvez, o farol represente um estado de consciência absoluta. E como há indícios de que Thomas e Winslow sejam a mesma pessoa, o local pode significar a quebra das ilusões.
Por isso, quando Winslow consegue finalmente acessar o farol, ele é morto por sua intensa luz. O estado mental que o local oferece é mais do que o protagonista pode suportar, pois ele já está entregue a uma profunda perda de si.
Há também teorias envolvendo o mito de Prometeu, já que Winslow e o deus grego foram castigados por contemplar o que não deviam. O primeiro, caiu das escadas e teve o corpo comido por gaivotas. Já o segundo, foi condenado por Zeus a ter o fígado eternamente dilacerado por águias.
Independente de suas conclusões, não há uma explicação definitiva para o filme. E este é o seu maior trunfo. Com O Farol, Robert Eggers criou uma obra que poderá ser ressignificada a cada ano. A cada vez que assistir, um novo detalhe será descoberto. E esta é uma riqueza audiovisual que não se via há muito tempo na arte do horror.
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