"Desculpe, mas não": O comentário de Stephen King que reviveu a controvérsia em torno de um filme icônico de Martin Scorsese
Bruno Botelho dos Santos
Bruno Botelho dos Santos
-Redator | crítico
Bruno é redator e crítico do AdoroCinema, que divide seu tempo na cultura pop entre tomar susto com os mais diversos filmes de terror, assistir os clássicos do cinema ou os grandes blockbusters e enaltecer o trabalho de David Lynch e Stanley Kubrick.

Uma breve frase do escritor Stephen King reacendeu um debate que parecia estar encerrado na história do cinema.

Discutir sobre "o melhor filme de todos os tempos" é um daqueles exercícios tão fascinantes quanto inúteis. Não há consenso definitivo. Mesmo assim, existem títulos que retornam repetidamente à conversa, como se o cânone precisasse ser reafirmado. Um deles é Touro Indomável (1980), o filme de Martin Scorsese estrelado por Robert De Niro, que muitos críticos, cineastas e acadêmicos defenderam como o ápice absoluto do cinema. Ou pelo menos era assim… até Stephen King decidir dizer "não".

Stephen King revive controvérsia sobre Touro Indomável, de Martin Scorsese

Touro Indomável
Touro Indomável
Data de lançamento 1 de outubro de 2020 | 2h 09min
Criador(es): Martin Scorsese
Com Robert De Niro, Cathy Moriarty, Joe Pesci
Usuários
4,3
Assista agora em MGM

A faísca foi acesa pela escritora Megan Abbott, que afirmou nas redes sociais que o filme de boxe de Scorsese continua sendo, sem dúvida, o melhor filme já feito. A resposta de King não poderia ter sido mais sucinta ou mais incendiária: "Desculpe, mas não". Sem argumentos, sem nuances, sem maiores explicações. Apenas essa negação categórica, suficiente para reacender um debate que parecia relegado aos anais da história do cinema.

United Artists

A opinião do autor de It - A Coisa tem um peso significativo. Além de ser um dos escritores mais adaptados de todos os tempos, Stephen King é um ávido espectador, atento ao cinema e à televisão contemporâneos. Sua relação com a tela grande sempre foi complexa, até mesmo desconfortável. Basta lembrar sua agora lendária animosidade em relação a O Iluminado, de Stanley Kubrick, um filme reverenciado por milhões e que, paradoxalmente, adapta um de seus romances mais aclamados. Para King, a frieza de Kubrick traiu o cerne emocional de sua história, uma posição que ele mantém há décadas.

A rejeição de King a Touro Indomável como "o melhor filme já feito" não significa necessariamente que ele o considere um filme ruim. Em vez disso, parece ser uma reação ao absolutismo com que certos títulos são elevados a um pedestal inabalável. A decadência moral de Scorsese, De Niro e Jake LaMotta já foi analisada à exaustão: o preto e branco agressivo, a violência quase ritualística, a masculinidade ferida se desintegrando diante da câmera. Tudo isso permanece intocado. O que King questiona é a própria ideia de que exista uma obra definitiva e inquestionável.

Getty Images

O comentário também nos convida a olhar para outro lugar: 1980 foi um ano crucial para as adaptações de King, e não é coincidência que sua resposta esteja impregnada dessa memória pessoal. O escritor nunca escondeu o fato de que valoriza acima de tudo os filmes que, mesmo que imperfeitos, se conectam com seu universo narrativo e emocional. Nesse sentido, seus critérios raramente se alinham com rankings canônicos.

Hoje, com novas adaptações de sua obra chegando aos cinemas e plataformas de streaming, Stephen King demonstra que não tem interesse em ceder ao consenso. Seu "desculpe, mas não" não é uma provocação gratuita, mas um lembrete: o cinema, assim como a literatura, prospera na discordância. E talvez aí resida sua verdadeira grandeza.

facebook Tweet
Links relacionados