Falta magia à presença de Rachel Zegler e Gal Gadot em live-action de Branca de Neve
por Aline PereiraO fiasco da campanha de Emilia Perez durante a corrida ao Oscar 2025 parece ter evidenciado um ponto latente de seu tempo: questões fora das câmeras podem, sim, ter algum efeito na percepção pública em relação ao filme apresentado. E se a obra, por si só, já também tem seus problemas, é pior ainda – pouca coisa será poupada. Parece ser o caso de Branca de Neve, que, muito antes da estreia, nasceu cercado de repercussões extra-filme, dos comentários preconceituosos sobre a escalação da protagonista ao posicionamento político das estrelas do longa.
Agora, com acesso a todo tipo de informação, fechar os olhos ao contexto geral de produção das obras que consumimos é impossível (e acho que nem é aconselhável, honestamente) e é claro que entrei na sessão de Branca de Neve com tudo isso em mente. Ainda assim, me deixei imergir no conto de fadas apresentado pela Disney. Só que a experiência não melhorou tanto assim. O live-action assinado pelo diretor Mark Webb (500 Dias Com Ela e O Espetacular Homem-Aranha) não tem uma visão particularmente encantada, originalmente inventiva, para explorar. Mas também não é completamente equivocado.
Com Rachel Zegler (Amor, Sublime Amor) no papel-título, Branca de Neve – agora com uma nova explicação para a origem de seu nome – reconta a história clássica com algumas mudanças no enredo para atender as demandas atuais. Assim, acompanhamos o drama da princesa arrancada de sua família nobre e benevolente pela ganância insaciável da Rainha Má (Gal Gadot) que, obcecada pela própria beleza, quer eliminar a princesa ao descobrir, através de seu espelho mágico, que existe “alguém mais bela do que eu”.
É difícil não imaginar o fator nostalgia (e seu resultado financeiro, é claro) como motivador número um para trazer de volta um conto como esse. Mas, em outros quesitos, o que a história da Branca de Neve ainda têm a dizer? Falta no live-action de 2025 um esforço maior para se conectar com a audiência. Seja lá qual for. Depois de saciada a curiosidade para “ver qual é” a do filme, não sobra muito com o que se entreter.
Ainda que alguns números musicais tragam boas performances de Rachel Zegler – são estes os momentos em que a atriz realmente se sai bem –, nem a princesa, nem a vilã têm força o suficiente para nos cativar de verdade. Enquanto os maneirismos da protagonista tornam seu trabalho pouco fluido, a antagonista vem como uma caricatura desencontrada e inconstante. Em palavras mais simples: está faltando carisma. E em uma história infantil de fantasia baseada na disputa entre o puro bem e o puro mal, simpatizar com um lado ou com o outro é um fator importante. É difícil encontrar essa emoção nas falas e diálogos truncados das duas.
Tanto é que os coadjuvantes são quem conquistam um pouco mais de espaço - e assim a abordagem escolhida para nosso novo príncipe encantado se torna o ponto mais interessante do remake. Começando pelo fato de que ele não é mais príncipe e nem encantado.
Não quero dar detalhes sobre a releitura do personagem para não estragar alguma possível surpresa, mas vale ressaltar que é positiva a função dele na trama. Quando a ideia de ter um “salvador da princesa indefesa” deixou de ser aceitável há alguns anos (ainda bem), vimos uma virada de viés para “a princesa não precisa de um príncipe” que deixou muitos personagens, em especial os de remakes de histórias mais antigas, perdidos e pouco utilizados nos romances.
Em Branca de Neve, há uma mensagem interessante sobre isso: a princesa não tem como objetivo primordial encontrar o amor, mas, ainda assim, é bem-vindo vindo o parceiro que se une a ela e que, com tempo para desenvolver seus objetivos em comum, se torna também um interesse romântico. À medida que a história se desenrola, surge a vontade de torcer pelo final feliz dos dois.
Não é porque se trata de um live-action que o mundo apresentado precisa ser tão apegado assim à realidade e, em muitos pontos, Branca de Neve acerta na escolha de tentar preservar a fantasia de seu universo. Sem clima de documentário do Discovery Channel no design dos animais, por exemplo, que mantêm expressões bonitinhas de desenho animado (pois é, O Rei Leão!), o longa até deve agradar no que diz respeito ao visual e se equilibra entre o colorido e o sombrio para segurar o espírito lúdico da animação original.
Nesse embalo, há também a questão dos Sete Anões. Quando o filme foi anunciado, as dúvidas sobre como os personagens seriam representados em tela levantou uma discussão que se ampliou com uma declaração de Peter Dinklage, o Tyrion de Game of Thrones, sobre o assunto. Em entrevista ao WTF Podcast, o ator elogiou o progressismo da Disney ao escalar uma atriz latina para interpretar Branca de Neve, mas se disse surpreso com a ideia do remake de forma geral. “É uma história sobre sete homens anões vivendo juntos em uma caverna”, disse.
Pois bem, a Disney respondeu dizendo que haveria uma “abordagem diferente” em relação aos Sete Anões e que membros da comunidade de pessoas com nanismo estavam envolvidos na consultoria. No longa, os personagens são feitos com computação gráfica, o que causa certa estranheza ao olhar pelo fato de eles estarem em cena durante muito tempo. De fato, há uma justificativa mais “lúdica” sobre quem eles são, como se estivessem inseridos mais em uma parte mágica do universo da Branca de Neve do que no mundo “humano” propriamente dito.
Ao final da sessão, Branca de Neve deixa poucas sensações: ainda que tenha boas passagens em algumas das canções originais e nas soluções para atualizar algumas das ideias do conto original, não tem tanto a acrescentar para quem espera se surpreender com a modernização de uma obra tão icônica. O apelo nostálgico em seu estado mais puro – que é só aquela vontade de ver de novo uma história que você já sabe como termina – até traz o conforto, mas a magia não é a mesma.