Florence Pugh lidera o novo (e desajustado) grupos de heróis em filme que quebra o molde da Marvel
por Katiúscia ViannaUnir um grupo de pessoas desajustadas ou rejeitadas pela sociedade já é algo clássico do cinema. Desde Sete Homens e Um Destino e Os Goonies, incluindo até O Esquadrão Suicida da DC. A própria Marvel já investiu nessa ideia com Guardiões da Galáxia ou os X-Men. Agora, o MCU aposta em Thunderbolts*, que reúne alguns anti-herois desse universo cinematográfico. Mas acredite quando digo que fui ao cinema pensando que ia ver uma coisa e ganhei outra bem inesperada.
O filme da Marvel é centrado no retorno de Yelena Belova (Florence Pugh), que está sem motivações ou propósito, principalmente após a morte da irmã, Natasha Romanoff (Scarlett Johansson) em Vingadores: Ultimato. Atualmente, a ex-Viúva Negra trabalha em missões clandestinas para Valentina (Julia Louis Dreyfus) - que, por sua vez, está sendo investigada pelo governo por seus projetos ilegais. Dentre aqueles que estão preocupados com as ações dela está Bucky Barnes (Sebastian Stan), agora um congressista.
Até que Yelena se encontra numa missão que a coloca frente a frente com John Walker (Wyatt Russell), Fantasma (Hannah John-Kamen), Treinadora (Olga Kurylenko) e o misterioso Bob (Lewis Pullman). Inicialmente inimigos, terão que se unir em um desajeitado grupo para sobreviver. Adicione ainda nesta história o pai de Yelena, Alexei (David Harbour), que sonha em voltar aos tempos de glória do Guardião Vermelho e tem um relacionamento conturbado com a filha.
E sim, antes que você pergunte, o asterisco tem uma razão na história. Mas não vamos revelar outros detalhes da trama por motivos de spoiler.
Teoricamente, Thunderbolts* cumpre todos os requisitos da suposta “fórmula Marvel”: tem grandes cenas de ação e momentos descontraídos (a maioria através do Guardião Vermelho). Porém, o grande trunfo é como o tom do filme se distancia dessa imagem colorida e animada que ficou associada ao estúdio - algo claro desde os famosos créditos iniciais.
O que surpreende no filme de Jake Schreier (Treta) é a abordagem sobre traumas e saúde mental que se torna essencial para a jornada dos Thunderbolts*. E se pararmos para pensar, nao é algo inédito no gênero, já que alguns dos melhores projetos da Marvel também não tiveram medo de falar sobre esses tópicos. Basta lembrar WandaVision ou Guardiões da Galáxia Vol. 3, por exemplo.
Neste novo longa, não é à toa que o principal vilão acaba se tornando o Vazio, algo que os fãs dos quadrinhos já conhecem, mas no universo cinematográfico expressa, com todas as letras, o que acontece quando você deixa os sentimentos negativos dominarem a sua mente. É uma analogia que pode se tornar bem clichê (se eu ouvir mais uma vez que o poder do amor ou da família salvou o dia, eu não respondo por mim), mas aqui é uma ação literal sobre como ter uma comunidade de apoio pode salvar vidas.
Afinal, sejamos sinceros: não ia ser na base da porrada que os Thunderbolts* poderiam enfrentar uma ameaça tão imponente. Temos três super-soldados (um deles com braço de metal), uma viúva negra habilidosa e uma mina com poderes de ultrapassar paredes. O roteiro de Eric Pearson (Viúva Negra) e Joanna Calo (O Urso) sabe que enfrentar o vazio existencial e literal que cobre a cidade de Nova York não vai depender apenas de uma surra.
Thunderbolts* pode ser um grupo, mas ninguém esconde que a estrela do filme é Yelena. A popularidade da personagem já tinha colocado a jovem Viúva Negra entre os favoritos da nova geração. E boa parte disso surge pelo talento de Florence Pugh, que entrega seu melhor trabalho com essa personagem neste filme. A atriz, indicada ao Oscar por Adoráveis Mulheres, expressa o sofrimento e a relutância de Yelena, ao mesmo tempo que ela carrega um pouco de ternura e humanidade.
Nesse quesito, é surpreendente ver a conexão de Yelena com Bob, numa performance revelação de Lewis Pullman. Seu personagem apresenta diversas reviravoltas na trama e o astro de Uma Questão de Química e Top Gun: Maverick apresenta as diferentes facetas dele com convicção - algo que vai desde a fragilidade até uma confiança fatal.
Também é bem desenvolvida a relação de Yelena com Alexei, com um elo entre pai e filha que transita entre drama e comédia. Agora, se a metáfora interessante de Thunderbolts* se expressa bem com esses três personagens, nem todo mundo ganha a mesma sorte. É verdade que Bucky já teve bastante espaço no MCU, mas é meio decepcionante ver o desperdício de Sebastian Stan, enquanto John Walker e Ava Starr explicam seus traumas em frases jogadas e é isso aí, valeu. Treinadora então, vou nem comentar... Vocês vão entender o motivo.
O bom de Thunderbolts* é que ele consegue o mesmo feito daqueles considerados “clássicos filmes da Marvel”. É um filme com uma história própria, de início, meio e conclusão (apesar de ter personagens anteriormente apresentados), mas nos instantes finais apresenta algo que conecta esse multiverso gigantesco que o MCU construiu. Não estou exagerando quando eu digo que a cena final e a segunda cena pós-créditos alugaram um triplex na minha cabeça.
Pois justamente nos apresentam um vislumbre do que vem por aí, mas sem fazer todo o filme ser apenas uma introdução ao futuro. Tem uma história bacana e bem contada aqui e, de brinde, se conecta com o final de Capitão América: Admirável Mundo Novo e ganhamos um gostinho daquilo que veremos em Vingadores: Doomsday. Como os irmãos Russo vão conseguir lidar com tantos personagens no mesmo filme? Não faço ideia. Mas Thunderbolts* finalmente me deixou um pouco ansiosa para ver isso.
Thunderbolts* é um sopro de ar fresco numa franquia que encontra sinais de exaustão. Não reinventa a roda, mas a direciona para um caminho mais humano. Afinal, todos nós carregamos falhas e medos. Então, por que não seria o mesmo com nossos herois? Além disso, ajuda o fato que eu seguiria Florence Pugh para qualquer lugar.