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    Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos

    Rodrigueando

    por Francisco Russo

    Um dos maiores dramaturgos do teatro brasileiro, Nelson Rodrigues possui um linguajar ao mesmo tempo tão particular e tão facilmente reconhecível. Observador atento do cotidiano carioca, Nelson esmiuçou temas polêmicos envolvendo sexo, traição e morte - em vários casos, reunindo todos estes itens -, mesclando-os à hipocrisia típica da vida em sociedade no sentido de transmitir ao público uma imagem ilusória. Fiel a este espírito, Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos é na verdade uma grande homenagem ao universo criado pelo autor.

    O próprio título é uma das espirituosas frases criadas por Nelson em suas crônicas, bem como a citação a Bonitinha, mas Ordinária que abre o longa-metragem. A reverência ao texto do autor é constante, seja na manutenção de um português hoje antigo, mas falado no Rio dos anos 1950, ou no uso de nomes próprios inusitados e até engraçados, como Orozimbo. O breve cantarolar do hino do Fluminense, time do coração de Nelson, é outra citação feita pelo diretor Clovis Mello, estreante nos longa-metragens.

    De olho neste ambiente repleto de emoções exacerbadas e sentimentos escondidos, o diretor espalha cinco historietas escritas pelo próprio Nelson ao longo de 87 minutos. Se por um lado há um trabalho bem feito na construção de uma unidade a tantas subtramas, para que elas coexistam de forma harmônica, por outro a variedade de histórias traz também uma certa irregularidade. A própria edição, intercalando tramas paralelas, é bastante confusa no início, também porque o espectador ainda está se situando com a proposta narrativa do longa-metragem. Apenas após uns 20 minutos, quando chega ao fim a primeira das histórias exibidas, é que o filme enfim encontra um rumo a seguir. Não à toa, é quando as próprias histórias revelam alguns elos de ligação entre si.

    Outro ponto que chama a atenção é que nem todas as subtramas começam exatamente no início do longa-metragem. Das três que abrem o filme, apenas as estreladas por Gabriela Duarte e Marcelo Faria seguem até o fim. Há histórias que iniciam no decorrer do longa-metragem e terminam também antes do fim, enquanto que outra segue até o desfecho. Esta mescla também favorece uma certa confusão em alguns momentos, auxiliada pelo fato de que algumas atrizes são bem parecidas e, ainda por cima, adotaram o mesmo estilo de figurino.

    Como acontece em boa parte dos filmes de episódios, há ainda uma clara irregularidade na qualidade das histórias. A pior de longe é a estrelada por Branca Messina, cuja resolução soa bastante acelerada e sem muita sensibilidade. É curioso também notar que, tanto nos episódios estrelados por Gabriela Duarte quanto no de Marcelo Faria, a história ganha fôlego à medida que exibe o característico tom sarcástico de Nelson Rodrigues – o mesmo vale para a trama estrelada por Thelmo Fernandes. Já a com Ernani Moraes é a mais coesa, surpreendendo pelo fato dele deixar o posto de coadjuvante de luxo para ser um dos protagonistas.

    Mesmo sem grandes atuações – Gabriela Duarte e Ernani Moraes são os que se saem melhor -, Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos se sustenta principalmente na qualidade do material produzido por Nelson Rodrigues e na boa ambientação, especialmente direção de arte e figurino, que recriam com competência o Rio de Janeiro dos anos 1950. Confuso em certos momentos, por mais que mantenha sempre a coesão, trata-se de uma homenagem consistente à obra de Nelson Rodrigues.

    Filme visto na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2015.

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