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    Salvo - Uma História de Amor e Máfia
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Salvo - Uma História de Amor e Máfia

    Espetáculo de som e luz

    por Bruno Carmelo

    Em 2009, Fabio Grassadonia e Antonio Piazza dirigiram um dos curtas-metragens mais bonitos da última década: Rita contava a história de uma garotinha cega que testemunhava um assassinato. O clima transitava entre o drama e o suspense, com um uso de enquadramentos e efeitos sonoros excepcionais. Agora, para o primeiro longa-metragem da dupla, os diretores decidiram expandir a ideia do curta. Desta vez, a personagem cega Rita é uma jovem adulta, surpreendida pela chegada de um mafioso em sua casa. O protagonista agora é Salvo, o assassino de aluguel, e a relação entre ambos se estabelece num momento quase mágico: às vésperas de ser morta pelo intruso, Rita passa a enxergar novamente.

    Em uma trama sobre mulheres cegas e assassinos à espreita, os olhos têm um papel essencial no filme. O cartaz foca apenas nos olhos de Saleh Bakri, intérprete de Salvo, e durante mais de 20 minutos, ele é visto apenas pelos olhos, que ora ocupam toda a imagem em widescreen, ora são recortados pelo retrovisor do carro, onde são artificialmente iluminados. Só vemos o rosto inteiro de Salvo pela primeira vez através do olhar de Rita, quando esta ganha a visão novamente. O momento em que os dois se observam permite lançar a narrativa, criando a intimidade entre eles e também com o espectador.

    As principais qualidades do curta-metragem também estão presentes neste projeto mais extenso: a riqueza de elementos sonoros é incrível (existem sempre carros, objetos e outras formas de vida fora de quadro, sugeridas ao espectador), a fotografia é cuidadosamente composta, os enquadramentos e movimentos de câmera mostram um domínio cinematográfico invejável. A cena da invasão doméstica, quando Salvo percorre cada parte da casa de Rita, sem que sua vítima o perceba, é tão bela quanto ostensiva. Em cerca de quinze minutos o espectador presencia um complexo balé de corpos em planos-sequência, com passeios claustrofóbicos dos personagens por cada cômodo.

    Esse intenso formalismo constitui a maior qualidade e também o possível defeito do filme. Concebido como um grande exercício de estilo, Salvo - Uma História de Amor e Máfia chama muito a atenção para a própria coreografia da câmera, dos sons. Sobram beleza e destreza técnica, mas falta realismo ou espontaneidade a estes ambientes e atuações devidamente controlados, calculados. Cada personagem posiciona as mãos no lugar exato para coincidir com um raio de sol passando pela janela, ou interrompe o movimento na parte exata da imagem onde se pode ver, no plano de fundo, a chegada de um inimigo.

    A predominância da forma em relação ao conteúdo reflete no tom econômico da trama, que nunca desenvolve a psicologia de seus personagens, mas encontra tempo para um estranho alívio cômico, através dos donos da casa onde mora Salvo. Poucos elementos chamam a atenção nesta narrativa que é, no final das contas, uma demonstração típica dos filmes de gângsteres, com os malvados aparecendo na hora certa, sacando suas armas no momento esperado e provocando um desfecho não muito surpreendente. Mesmo assim, se a história e a evolução de Salvo ou Rita não são marcantes – mesmo o milagre da visão adquirida tem pouca função narrativa -, o grande personagem do filme é mesmo a direção, imponente e auto consciente. Para quem aprecia belas imagens e o uso inteligente do som no cinema, Salvo - Uma História de Amor e Máfia é deslumbrante.

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