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    De Pernas pro Ar
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    De Pernas pro Ar

    Avon do Sexo

    por Francisco Russo

    A pornochanchada foi símbolo do cinema brasileiro durante várias décadas. Era comum ver algumas das maiores estrelas da época tirando a roupa no cinema, em cenas ousadas que podiam até ser dispensáveis, levando-se em conta o roteiro, mas faziam a alegria de boa parte do público. Reflexo do estilo caliente do brasileiro, que costuma falar abertamente sobre sexo. Por outro lado, a pornochanchada serviu também para criar um forte estereótipo sobre o cinema nacional, que aos poucos afastou o público. Na retomada do cinema brasileiro o sexo foi tratado como tabu, com poucos filmes explorando-o abertamente. Entretanto nunca deixou de existir, só que ficou mais pudico e menos explícito. De Pernas pro Ar fica no meio deste caminho. Não há cenas de nudez, mas há um forte apelo sexual graças aos brinquedos eróticos e suas utilidades, presentes ao longo de todo o filme.

    A história é, de certa forma, simples. Alice (Ingrid Guimarães) é uma empresária de enorme sucesso no trabalho e um fracasso estrondoso em casa, não dando atenção ao marido e filho. Resultado: ele pede um tempo. Uma troca de encomendas faz com que acabe sendo também demitida, o que significa a ruína completa de seu mundo. Ao se aproximar de uma vizinha (Maria Paula), ela conhece uma nova realidade: a do prazer. Tanto no âmbito pessoal como no lado empresarial. Logo se tornam sócias em uma sex shop e investem na popularização do negócio, apostando firme no batido conceito consagrado pela Avon: a da venda de porta em porta.

    De Pernas pro Ar fala de questões delicadas, que não costumam vir a público, como a do orgasmo feminino. Sempre em ritmo de piada, é claro, para amenizar o clima. Por este lado é um filme interessante, que toca mais fundo no público feminino por se reconhecer na história. Afinal de contas, é o relacionamento da mulher com o sexo que está em jogo, em um mundo onde é também cobrada para ser uma boa profissional, uma boa dona de casa, uma boa esposa e uma boa mãe. E, ainda por cima, diante de um universo machista, onde muitas vezes o prazer masculino surge como necessidade primária. Os primeiros 30 minutos do filme, no qual o mundo de Alice desaba e ela é apresentada ao país das maravilhas, ou seja, o orgasmo, dá bem esta ideia. É a mulher valorizando a si mesma, descobrindo o prazer e o amor próprio. Só que, apesar de jamais abandonar este conceito, o filme o deixa de lado.

    A ladeira abaixo começa quando Alice tenta reatar o casamento com João (Bruno Garcia). Apesar do bom truque de esconder o rosto do marido, o que se vê é uma profusão de brincadeiras envolvendo os apetrechos eróticos. Tudo porque Alice, temerosa com a reação de João, não conta que agora trabalha em uma sex shop. O prazer feminino torna-se então comércio, sem maior aprofundamento na questão pessoal. A divisão entre trabalho e família volta à tona, de forma que não seja possível a coexistência pacifica entre ambos. Ou seja, Alice volta ao reduto que estava até então, agora consciente de sua situação. Só muda de endereço - comercial, no caso.

    É claro que há várias situações envolvendo o inusitado e, em certos casos, a vergonha pela exposição de questões tão íntimas quanto o sexo. Algumas cenas até são boas, como a da partida de futebol, mas em muitos casos apelam para frases de duplo sentido, estereótipos e uma suposta ingenuidade em relação ao tema. Há também Maria Paula, a vizinha, com sua voz supostamente sedutora e o exagero na maquiagem. Por outro lado, Ingrid Guimarães segura bem o ritmo, graças ao seu timing cômico.

    De Pernas pro Ar é um filme que trata de questões importantes, mas procura sempre o caminho fácil. Prega a descoberta do prazer feminino, mas também defende que as mulheres precisam se decidir entre a vida pessoal e o trabalho, lidar com ambos ao mesmo tempo não dá. Ou seja, há uma aura de modernidade usada para reforçar velhos preceitos. Como comédia, para fazer rir sem pensar muito, até funciona em alguns momentos. Mais do que isso, não. É uma bobagem travestida de uma falsa profundidade.

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