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    O Exercício do Poder
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    O Exercício do Poder

    Política absurda

    por Bruno Carmelo

    O premiadíssimo O Exercício do Poder é um dos raros filmes políticos que conseguiram escapar de quase todas as acusações frequentes no gênero: esta obra não é partidária, doutrinária, nem apenas observadora. Ela não acusa ninguém, mas também não é fatalista e conformista. Como o projeto consegue atingir esse resultado? O que ele tem a dizer?

    Uma das principais armas desta produção é a escolha de um protagonista apelidado por sua própria conselheira em comunicação de "nebuloso", de "objeto político não identificado". Ele é um sujeito médio em todos os sentidos do termo: aparência comum, talento mediano, posições políticas evidentes, mas não fanáticas. Este Ministro dos Transportes não é idealista, nem corrupto e ganancioso, ele não parodia nem reflete uma pessoa em especial. Bertrand Saint-Jean (Olivier Gourmet) é a representação qualquer, universal, do homem político.

    A este sujeito ordinário ocorrem fatos espetaculares, narrados com o senso de urgência e a trilha sonora dignos de um suspense: um ônibus com crianças cai em um barranco, e este evento pode ser prejudicial ao governo às vésperas de uma eleição presidencial. Como reagir aos fatos? O resultado é magistralmente representado pela imagem inicial, de uma mulher nua que se entrega de própria vontade à boca do jacaré. Integrar este mundo é ser devorado.

    O Exercício do Poder segue seu protagonista dentro de carros, em escritórios, em estradas. Os diálogos cínicos e mordazes tomam conta da cena, enquanto dois grandes acontecimentos em estradas encarregam-se do teor absurdo, quase surrealista desta trama. Um dos trunfos deste projeto é abordar a política com um conteúdo naturalista (atores minimalistas, ações plausíveis), mas com uma estética que beira o fantástico (sonho com o jacaré, trilha sonora de suspense, encontros improváveis com um novo motorista e sua esposa).

    O espectador pode sentir que algo de grande importância está prestes a acontecer, que caminhamos a um clímax, enquanto o roteiro insiste que este é apenas um dia normal na carreira de uma personalidade política. Esta contradição entre forma e fundo desperta o interesse por um filme estranhamente linear. O Exercício do Poder tem o mérito de não querer revelar nenhuma verdade sobre os bastidores do governo, apenas ressaltar e explorar o absurdo de seus mecanismos internos. Neste sentido, o projeto é, como seu protagonista, um instigante e bem-vindo "objeto cinematográfico não identificado".

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