Críticas AdoroCinema
2,0
Fraco
O Vendedor de Sonhos

O doador de clichês

por Renato Hermsdorff

O Vendedor de Sonhos é cinema no imperativo: Faça/ não faça; seja/ não seja; tenha/ não tenha, discurso – e estrutura – típico da literatura de autoajuda, afinal, é na prosa do vendedor de livros (estima-se que mais de 25 milhões de unidades só no Brasil) Augusto Cury que o filme de Jayme Monjardim (Olga) se baseia. Se a mensagem é indiscutivelmente positiva, por outro lado, no entanto, como obra cinematográfica, trata-se de um produto pouco (ou nada) desafiador - e bastante artificial.

O longa conta a história de Júlio César (Dan Stulbach), um renomado psicólogo, desgostoso da vida. Prestes a adotar uma medida extremamente radical, ele é interceptado pelo “Mestre” (o uruguaio César Troncoso, de O Banheiro do Papa), um mendigo – ou louco – que apresenta um outro ponto de vista ao personagem em desespero. Mas o mentor também tem seus segredos, um passado que é revelado ao mesmo tempo que os dois estabelecem uma peculiar relação de amizade.

É o pano de fundo para que o roteiro destile um sem número de teorias, frases de impacto, pequenas pílulas de "sabedoria", "pérolas" do tipo: “O segredo do sucesso é conquistar aquilo que a gente não pode comprar”. Mentira? Não. Mas, convenhamos, um tanto raso, superficial.

Há uma linearidade no roteiro que, embora previsível, une de forma convincente as pontas inicial e final da produção, mas o desenvolvimento, de uma forma geral, se dá como uma sequência de esquetes que se encerram em si mesmas. Com o propósito, cada uma delas, de trazer um "ensinamento" do louco, o

longa adota um tom “pregatório” que beira o religioso.

Além de pouco convincentes (como um mendigo sobe até o 20º andar de um prédio comercial de São Paulo, verdadeira fortaleza em termos de segurança, sem ser notado?), as cenas – ou esquetes –, em sua maioria, são tão artificiais, que beiram o risível (caso de quando o mendigo reúne os empresários mais bem-sucedidos da cidade para uma palestra num... cemitério).

Se, por um lado, a bela fotografia – plasticamente bonita mesmo –, solar, combina com o clima de positividade do “recado”, o figurino/ maquiagem, igualmente asseado, destoa ao trazer uma população de rua em que cada fio de barba e cada rasgo de roupa parecem milimetricamente calculados.

 

Mas é o abuso de clichês o que torna O Vendedor de Sonhos tão fraco. Afinal, filmar a plateia com a cadeira vazia do pai workaholic durante a apresentação de teatro da filha tristonha é subestimar demais a inteligência do espectador.