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    Kati Critica: Por que Supernatural durou tanto tempo?

    O conto de hoje é uma história de amor e ódio pelos irmãos Winchester.

    Katiúscia Vianna é uma redatora do AdoroCinema que acumulou mais de duas décadas de cultura inútil e decidiu transformar isso num emprego. Nessa jornada, ela tem a missão de representar os fandoms barulhentos e/ou esnobados do Twitter, falar das séries que a crítica ignora e celebrar as '"farofas" que trazem alegria para o povo. Ou seja, os guilty pleasures! Com um ponto de vista 'singular' (ou doido, depende de quem opina), surge a coluna Kati Critica — misturando açúcar, tempero e um pouco de haterismo zoeiro.

    É real. É oficial. Supernatural vai chegar ao fim. Sinceramente, eu acreditava que nossos descendentes iam viver numa sociedade pós-apocalíptica, onde países disputariam guerras por água potável, The Rock ia lutar contra desastres naturais, enquanto os jovens só veriam três coisas na televisão: SupernaturalGrey's Anatomy e Malhação.

    Se eu reagi feliz demais à tal notícia? Sim. Se serei xingada pelo gigante grupo de fãs dessa série — inclusive minha mãe, que se declarou de luto desde então? Certamente. Mas peço, por favor, alguns minutos de paciência a fim de tentar entender o meu lado da história. Para começar, deixo bem claro que não tenho nada contra o elenco. Afinal, eles são todos trabalhados na zoeira e isso é algo que aprecio na vida. 

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    E nunca tive problema em fazer notícias sobre tramas cheias de reviravoltas loucas. Fico feliz de representar qualquer fandom aqui no AdoroCinema. E já tive que explicar como uma personagem da Maite Perroni levou um tiro no peito e, consequentemente, ficou cega numa novela mexicana (a mesma onde outra mulher dá a luz de calça jeans no meio de um incêndio). Logo, entender histórias complicadas já faz parte do meu currículo. 

    O curioso é que não odeio Supernatural. Pelo menos, não da mesma forma que odeio couve-flor, por exemplo. Tempos atrás, eu já fui uma 'hunter' — apelido fofo como são chamados os fãs. Nunca esquecerei a empolgação das minhas irmãs adolescentes, ao saber que a série ia passar no SBT, pois não tínhamos dinheiro para TV a cabo e elas queriam ver a nova série do namorado bonitinho da Rory (Alexis Bledel) de Gilmore Girls. No caso, o Jared Padalecki, ainda sem esse cabelo longo digno de comercial de xampu. Ps: eu sou team Jess (Milo Ventimiglia), mas isso é outra história.

    Antes desse mundo onde maratonamos a série no dia da estreia (e choramos pois acabou muito rápido e já queremos uma nova temporada), era tradição sentar na frente da TV, num horário específico, para conferir o episódio da semana. Elas me incentivavam a ver junto, mesmo considerando que eu tenho PAVOR de qualquer coisa de terror. Mas a história da série chamou a atenção de uma Kati com doze anos de idade, com muito tempo vago na vida. Não dava muito medo e gostava da interação entre os protagonistas. O fato dos irmãos serem bonitos ajudou, não serei hipócrita.

    Então, fiz como qualquer outro seriador que se preze: continuei vendo.

    E continuei mais um pouco.

    E a história não acabava. Só perdia qualidade. Ou sentido.

    Isso não é um problema particular de Supernatural. Se já é difícil para uma série elogiada produzir uma segunda temporada que não seja decepcionante (cof, cof, 13 Reasons Why, cof cof), é ainda mais complicado se manter interessante durante anos. Friends é considerada uma das obras mais icônicas da TV, porém deu uns tropeços nas temporadas finais. Clássico da ficção científica, Arquivo X tentou seguir em frente sem o Mulder (David Duchovny) por um tempo! Ainda preciso lembrar o que aconteceu com Lost?

    Quando amamos alguma coisa, queremos mantê-la para sempre. Quem nunca teve aquele sapato que cabia perfeitamente no pé e continuou usando-o até que ele, praticamente, fique despedaçado, que nem metade do elenco de Vingadores: Guerra Infinita? Mas, as vezes, temos que deixar aquilo partir. No caso de séries (ou qualquer outra ferramenta utilizada para contar uma história), é necessário saber até onde sua premissa pode chegar, sem perder a essência. O risco é ver algo bacana ficar diluído em escolhas clichês ou decisões que perdem sentido. 

    Em tramas de fantasia e ficção científica, é comum ver produtores tentando adicionar mais mitologias aleatórias, quebrar as próprias regras iniciais. e aumentar as consequências dos conflitos, enquanto — paradoxalmente — diminui riscos, por sempre brincar com a vida dos protagonistas. Para entender como isso aconteceu com Supernatural, basta perceber que suas tentativas de spin-off não engrenaram. BloodlinesWayward Sisters se baseavam em arcos narrativos frágeis demais para se sustentarem sozinhas (por mais bem intencionada que tenha sido a segunda, pois o "girl power" precisa ser mais valorizado nesse universo!).

    Por exemplo, o final da segunda temporada surpreendeu o público ao matar Sam (Padalecki) — com uma facada nas costas, literalmente. Desde então, os irmãos Winchester já morreram e ressuscitaram tantas vezes, que perdeu qualquer tipo de impacto na narrativa. Se a trama já teve vilões interessantes como o demônio dos olhos amarelos (Fredric Lehne), Lucifer (Mark Pellegrino) e Crowley (Mark Sheppard), surgiram personagens insuportáveis como os Leviatãs e Metatron (Curtis Armstrong).

    E para explicar como Mary (Samantha Smith), que falece no piloto, voltou à vida, mais de dez anos depois, por gratidão da Escuridão (Emily Swallow) — que, por sua vez, era irmã de Deus (Rob Benedict) e ainda tinha uma espécie de crush no Dean (Jensen Ackles)? Tudo na vida tem limites.

    Pessoalmente, essa também foi a primeira série que abandonei na vida, parando de assistir depois da oitava temporada. E quem termina ou deixa de ver algo que não gosta mais, após passar muito tempo investido nele, sabe como é o sentimento bizarro de liberdade que surge com tal decisão. É que nem completar algum projeto gigante que o chefe mandou, finalizar uma monografia ou ganhar uma casquinha de graça, após preencher o cartão de fidelidade. Dá vontade de sair cantando por aí, de finalmente encontrar os amigos depois de soltar diversos "vamos marcar!" em conversas online e nunca mover um dedo para promover o rolê...

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    Tendo dito tudo isso, preciso ser justa. SPN contou com, pelo menos, três motivos para se manter tanto tempo no ar. Um grupo fiel de fãs; a química inegável entre Padalecki e Ackles (com Misha Collins de bônus); e a coragem de ousar. As aventuras dos irmãos Winchester tiveram muitos altos e baixos, mas os produtores nunca tiveram medo de investir em alguns arcos inusitados, para o melhor ou pior. Seus grandes acertos vieram, justamente, quando sabiam rir de si mesmos.

    Um dos episódios mais clássicos, "Changing Channels", traz Sam e Dean viajando para dentro da TV, fazendo paródias de outros programas. Além disso, eles já viram um musical sobre fanfics baseadas em suas vidas, conheceram Hittler, brigaram com Paris Hilton, botaram um toque sobrenatural em Feitiço do Tempo, se encontraram numa realidade paralela onde eram os astros de uma série chamada Supernatural... Captou o espírito, né? 

    Sem falar que ver Jensen Ackles dublando "Eye of the Tiger" ainda é um dos melhores vídeos da internet, digno de uma batalha de lipsync de RuPaul's Drag Race.

    É o fim de uma era. Supernatural quebrou fórmulas de uma simples série procedural de fantasia para criar uma real conexão com os fãs. Nem posso negar que alguns arcos em seus primeiros anos foram impactantes. Na temporada de estreia, "The Benders" chocou com um episódio onde os monstros eram, na realidade, apenas humanos cruéis. Já o sacrifício de Jo (Alona Tal) e Ellen (Samantha Ferris), para ajudar Sam e Dean na luta contra Lucifer, ainda traz um aperto no meu peito.

    Por outro lado, sigo com raiva das constantes briguinhas bobas entre os irmãos; não aguento a insistência em trazer Bobby (Jim Beaver) e Rowena (Ruth Connell) de volta dos mortos; e não superei os finais trágicos de Kevin (Osric Chau) e Charlie (Felicia Day). Mas não dá para ignorar o marco que os Winchesters fizeram no entretenimento. E se isso permitiu que ficassem na TV durante quinze anos, não foram eles que saíram perdendo, né?

    Moral da história: Siga em frente, meu filho rebelde. Haverá paz quando você tiver terminado. Repouse sua cabeça cansada, não chore mais! #EntendedoresEntenderão 

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