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    Reality
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Reality

    O que você faria?

    por Katiúscia Vianna

    Euphoria pode não ser unanimidade de crítica e público, mas é inegável que está revelando talentos de uma nova geração. Zendaya é um dos maiores nomes da cultura pop e já levou dois Emmys para casaJacob Elordi provou ser mais que o menino de A Barraca do Beijo e virou até Elvis Presley. Outro grande destaque, principalmente, na segunda temporada foi Sydney Sweeney - que também recebeu duas indicações ao Emmy no mesmo ano (por Euphoria e The White Lotus). Apesar de ter um papel na Marvel garantido, ela mostra um novo lado no cinema independente, sendo a protagonista de Reality.

    Qual é a história de Reality?

    Inspirados em fatos reais, Reality acompanha o FBI batendo à porta de Reality Winner (Sydney Sweeney), uma linguista que trabalha para o governo norte-americano, mas deseja usar suas habilidades para a Força Aérea. Porém, os agentes Garrick (Josh Hamilton) e Taylor (Marchánt Davis) possuem um mandato para revistar sua casa, por conta de uma grave acusação: ter vazado documentos importantes e confidenciais para a imprensa.

    Reality é a estreia de Tina Satter na direção, que também assina o roteiro ao lado de James Paul Dallas. O longa é uma adaptação da peça de Satter, Is This a Room?, aclamada na Broadway. E o mais interessante: o texto é totalmente baseado na transcrição da gravação do interrogatório de Reality feita pelos agentes da FBI na vida real.

    Reality: Simples e complexo ao mesmo tempo

    De forma geral, Reality é um filme relativamente simples. Boa parte de sua trama acontece dentro (e fora) de uma casa - com a parte mais dramática do roteiro acontecendo em um simples cômodo. Nada de cadeiras ou mesas. Apenas paredes claras e três pessoas em uma conversa problemática. A sagaz direção de Satter aposta bem nessa sensação claustrofóbica, abraçando seus momentos de tensão e mostrando sua protagonista em situações da qual não pode fugir.

    Além da boa proposta de usar trechos da transcrição verdadeira, o trunfo surge em saber aproveitar as coisas mais bizarras que somente a vida real pode proporcionar e, depois, dramatizar para as telas. Então são os pequenos detalhes que tornam tudo ainda mais angustiante: as risadas em momentos inconvenientes, conversas constrangedoras dos agentes sobre os animais de estimação da protagonista e por aí vai… Tudo segue o ritmo impaciente da realidade, com apenas alguns toques de surrealismo no terceiro ato - que coloca o espectador na mente de Reality.

    Quando uma peça é adaptada para o cinema, é sempre uma tarefa difícil. Afinal, o teatro trabalha com somente uma locação e conta com a criatividade do ser humano para preencher as lacunas. Nas telas, é algo tecnicamente realista: precisamos ver as coisas - então ficar “parado” em um mesmo lugar pode ficar chato. Reality (o filme) não precisa se preocupar com isso, pois apesar de ser bem literal, os ângulos sabem aproveitar o que há de melhor em sua produção: Sydney Sweeney.

    Sydney Sweeney brilha em Reality

    Em Euphoria, Sydney Sweeney já provou que sabe dar grandes ataques de emoção - basta lembrar a épica briga na (também épica) peça de Lexi (Maude Apatow). Porém, ela consegue trazer toda essa emoção de uma forma contida em Reality. Apesar de aparentar tranquilidade inicial, o constrangimento e a necessidade de agradar são palpáveis em sua expressão. Aos poucos, a preocupação vai dando espaço para os erros e, depois, um desespero retratado apenas em seu olhar, uma fala tremida e as cores rosadas de nervoso em seu rosto.

    Sweeney - que já havia se destacado em outras produções como The Handmaid’s TaleSharp Objects - pega essa figura polêmica e a humaniza. Juntamente com Hamilton e Davis, constrói um trio interessante onde cada um cumpre seu papel: Josh Hamilton é uma figura caricata, pois seu próprio personagem o pede para ser assim. Sabe aquela história de toda dupla ser “policial bonzinho e policial malvado?”. Ele leva isso a sério. Já Davis também tenta ser simpático, mas sua postura atenta é sempre ameaçadora.

    Basicamente, o filme fica inteiramente nas costas do trio e poderia ter dado muito errado se qualquer um ali cometesse um erro. Claramente, Sweeney é o destaque, mas os outros dois servem como levantadores para ela fazer o ponto (Isso é o máximo de vôlei que sei, inclusive me perdi horrores quando eles começam a falar de crossfit no filme, essa não é minha área de expertise).

    Reality Winner é culpada ou inocente?

    Como se trata de uma história real, uma simples busca no google te responde se Reality Winner realmente cometeu um crime e suas motivações na vida. Mas o filme está aqui pra apresentar os dois lados da moeda: o que ela disse, mas também o que ela não disse. Em determinado momento, ela é comparada a Edward Snowden, mas surge como uma figura completamente diferente do caso mais famoso. Na verdade, Reality surge como alguém mais preocupada com sua cadela e sua gata.

    Outra tática curiosa de Satter é criar pequenas interrupções quando a conversa aborda temas que foram censurados na transcrição - como se a gente não soubesse desde o início que teria algo a ver com a interferência da Rússia nas eleições à presidência dos Estados Unidos - que terminou com Donald Trump como vencedor. Mas é um detalhe interessante que dá dinamismo para o filme e mais tensão para o tema abordado, ajudando a tomar consciência da importância dessas informações.

    No final, o filme debate os dois lados da situação a partir de pedaços de jornais, para deixar tudo mastigado para o público. Meio desnecessário, mas entrega um encerramento mais imponente para o longa. Aí, joga a bola pro espectador: se você estivesse nessa situação, o que faria? Ou melhor, o que é realmente melhor para o seu país? E qual motivo levaria a verdade a ser traição?

    Vale a pena ver Reality?

    Carregado de tensão e pequenas decisões sagazes da direção de Tina Satter, Reality carrega a absurda atuação de Sydney Sweeney como base, o que transforma a experiência em algo bem interessante. Por vezes, é simplista demais, então já vi muitos chamarem o longa de “chato”. Talvez seja o meu coração já dominado pelo teatro que abraça essa característica forte e performática nele, mas eu acho que seja uma coisa boa.

    E o mais importante: quando você tem algo importante para contar, por que você deveria deixar alguém te impedir?

    * O AdoroCinema conferiu esse filme no Festival do Rio 2023.

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