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    O Nascimento de uma Nação
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    O Nascimento de uma Nação

    12 Anos de Escravidão versão “faca na caveira”

    por Renato Hermsdorff

    O Nascimento de uma Nação é uma história de vingança que começa nos bastidores. Em 1915 (!), O Nascimento de uma Nação, filme de D.W. Griffith, fez um estrondoso sucesso, acompanhando o conflito de duas famílias de ideais opostos durante a Guerra de Secessão (1861-1865), nos Estados Unidos. A obra retratava os negros (interpretados por brancos de cara pintada, no pior estilo blackface) como selvagens e, de quebra, ainda fazia uma propaganda da Ku Klux Klan.

    Durante sete anos – e mais de um século depois –, o realizador Nate Parker, negro, se debruçou sobre um projeto que irônica e brilhantemente ele batizou de... O Nascimento de uma Nação, filme sobre... vingança que ele escreveu, produziu, dirigiu e (o que mais? Ah...) ainda protagoniza, como ator.

    Para tanto, ele resolveu desenterrar a figura histórica de Nat Turner, um personagem real, escravo que fez fama por liderar uma rebelião em 1831 (portanto, antes do conflito supracitado, que, diz-se, culminou na refundação – ou renascimento – dos Estados Unidos da América) e que resultou na morte de cerca de 60 senhores de escravos (todos caucasianos, obviamente).

    Os relatos da época dão conta de que o insurgente aprendeu a ler de pequeno e que, religioso, dominava a oratória como ninguém – ele costumava pregar para os membros da própria comunidade. Não satisfeito com os registros históricos, porém, o realizador vai ainda além: Nate pega Nat pela infância e o transforma numa espécie de salvador predestinado, ungido pelo guru dos rituais africanos.

    Fantasia (e criatividade, diga-se) à parte, é de se supor que Nat Turner não tenha tido uma vida fácil. E, nesse ponto, ou seja, durante a apresentação do personagem no primeiro terço do filme, Nate Parker pesa – e muito – a mão para dar conta dos horrores da escravidão. Não é que não se trate de um momento sangrento da História, mas, tecnicamente, apesar dos ares de superprodução, a narrativa é dura, falta subtexto para o público.

    A ausência de sutileza, por outro lado, é compensada durante o andamento do filme, pela progressão emocional do protagonista, que carrega consigo a plateia que estiver presente, onde for, para um final catártico. Violência por violência, esteticamente falando, não faltam exemplos de cenas fortes no cinema mundial (sim, você vai virar a cara para algumas, mas nada que não tenha feito durante A Outra História Americana).

    Mas o filme lava com sangue a alma de uma enorme parte da população que já deu, faz tempo, sua cota de sofrimento na Terra. E Nate Parker soube aproveitar com maestria os simbolismos para ir à forra. O envolvimento do ator com o personagem é tão evidente – transborda da tela – que, se ele não for indicado ao Oscar por sua performance, os membros da “Academia” vão precisar passar o ano in-tei-ro se explicando.

    E já que a comparação é inevitável, O Nascimento de uma Nação é 12 Anos de Escravidão versão “faca na caveira”.

    Filme visto no 41º Toronto International Film Festival, em setembro de 2016.

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    Comentários

    • MAYTE NAZATO
      Talvez porque a Vingança não seja um valor de quem se compatibiliza com a ideologia da grande maioria dos descendentes dos escravos. Eu também não consigo ter empatia com personagens atuais que pensam apenas em se vingar dos brancos, por todas atrocidades que foram acometidas contra nossos ancestrais.
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