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    Rio, Eu Te Amo
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Rio, Eu Te Amo

    Homenagens e paródias

    por Bruno Carmelo

    O título deste filme contém a palavra amor, o projeto “Cities of Love” também, o slogan fala sobre o amor na cidade, o cartaz oficial coloca um coração no Pão de Açúcar, enquanto um casal apaixonado observa o horizonte. Diante de um projeto destes, o receio é que a premissa (vários diretores são convidados a fazer curtas-metragens “declarando o seu amor pela cidade”) transforme o filme coletivo em um grande panfleto turístico, com a obrigação de ressaltar que a cidade é linda, segura, acolhedora, perfeita para passear e encontrar o par perfeito.

    Rio, Eu Te Amo consegue escapar deste perigo – em partes, pelo menos. Os romances tradicionais, do tipo “garoto encontra garota e vivem uma história perfeita na cidade” passam longe da maioria dos curtas-metragens. Mesmo as cenas de beijo são raras. Sobram então noções bem-vindas e amplas de amor: seja o afeto pela cidade, pela família, pela honra. Os cartões postais estão todos lá, mas na maioria dos casos conseguem ser usados de forma orgânica, integrando a história ao invés de chamar a atenção para si mesmos. A música ostensiva foi feita sob medida para vender CDs, da mesma maneira que as constantes propagandas de marcas de cerveja, perfumes e sorvetes sublinham a intenção claramente comercial do projeto. Entretanto, a maioria dos diretores conseguiu driblar o aspecto mercantil do projeto e transmitir a sua marca pessoal aos filmes.

    Curiosamente, os diretores estrangeiros construíram os melhores filmes do conjunto. Talvez por assumirem abertamente um olhar estrangeiro, seus curtas-metragens não carregam a responsabilidade de sintetizar toda a beleza da cidade, permitindo o recurso à paródia, ao absurdo, ao cinema de gênero. Assim, Im Sang-Soo construiu uma divertida história de vampiros no Vidigal, com um estilo de roteiro e de imagem muito diferentes da estética do cinema brasileiro; Nadine Labaki usou os recursos da fábula social no ótimo “O Milagre”; Guillermo Arriaga criou uma história de amor triste e sombria em “Texas”, Stephan Elliot partiu para o tom abertamente artificial e kitsch em “I Think I’m in Love”, e Paolo Sorrentino preferiu o suspense absurdo em “La Fortuna”.

    Já os brasileiros pareceram sentir a necessidade de criar algo grandioso e solene, o que na maioria dos casos sufocou o pequeno formato do curta-metragem. “Dona Fulana”, de Andrucha Waddington, tenta homenagear os moradores de rua, mas por falta de contraponto (não existem mendigos descontentes na história), acaba criando a incômoda sugestão que o Rio de Janeiro é uma cidade tão linda que todos mendigos são felicíssimos, e vivem na rua por opção. “A Musa”, de Fernando Meirelles, não fornece aos seus personagens nem rosto, nem nome, preferindo trabalhar com arquétipos de homem e mulher. A paixão soa um tanto banal, e seu curta-metragem se destaca como um dos piores do conjunto. Já “Pas de Deux”, de Carlos Saldanha, traz a história previsível, mas singela, de dois bailarinos no Teatro Municipal. O amor entre eles tenta ser profundo demais para a história curta do filme, mas as cenas de dança se destacam pela beleza no uso das sombras.

    Com tantas histórias e abordagens, a montagem teve a preocupação louvável de tornar a experiência fluida, intercalando trechos de curtas com cenas de transição (dirigidas por Vicente Amorim) em que os personagens reaparecem na cidade. São momentos de pouca substância – aliás, estes são os trechos escolhidos para incluir mais marketing de produtos – mas permitem pensar que os personagens de fato se deslocam pelo Rio de Janeiro e se cruzam sem se ver, conferindo ao conjunto uma ideia de circularidade muito bem-vinda.

    Talvez falte a Rio, Eu Te Amo mais ousadia estética e de conteúdo, algo que a grande responsabilidade do projeto deve ter tolhido aos diretores. Não há sinais de violência, de infelicidade (com exceção talvez de “Texas”) ou de crítica social - José Padilha é quem chega mais perto disso em seu filme, mas de maneira bastante cordial. Dificilmente algum curta-metragem se sustentaria por si só fora deste projeto, mas o conjunto, apesar de ser cuidadosamente inofensivo, oferece uma experiência agradável ao espectador.

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