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    O Fantástico Sr. Raposo
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    O Fantástico Sr. Raposo

    Um Filme de Wes Anderson

    por Francisco Russo

    Wes Anderson é um diretor peculiar, de estilo próprio. Seus filmes sempre contam com personagens desconexos, com características que os distinguem em relação à sociedade em geral. A família é um de seus alvos prediletos, ressaltando os sentimentos existentes entre seus integrantes que muitas vezes fazem com que se afastem, ou ao menos não sejam tão próximos quanto o ideal de família perfeita prega. Ou seja, um retrato real sobre a instituição. Por estas características, gerou surpresa o anúncio de que Anderson migraria para a animação. Mais ainda: que seu novo filme seria a adaptação de um livro infantil, escrito pelo mesmo Roald Dahl de A Fantástica Fábrica de Chocolate. Nada mais diferente do que sua filmografia apontava até então. Só que O Fantástico Sr. Raposo nada mais é do que um típico filme de Wes Anderson.

    Trata-se de um caso raro de adaptação bem feita que aproveita o que há de melhor nas peculiaridades de seu diretor. O Fantástico Sr. Raposo não é um filme para crianças, contendo uma linguagem adulta que fala sobre o aprisionamento do homem na civilização atual. É isso mesmo. A singela história dos animais que roubam alimentos de três fazendeiros e precisam fugir deles ganhou contornos bem mais profundos no cinema, envolvendo características psicológicas. Os animais, em especial a família Raposo, passaram por um processo de humanização sem que tenham perdido alguns de seus dotes animalescos. É através deste conflito que o filme, na verdade, fala sobre o homem atual.

    O Sr. Raposo era um feliz ladrão de galinhas, que se divertia com a adrenalina do roubo. Só que a gravidez de sua esposa faz com que abandone esta vida, conseguindo o respeitável e bem mais seguro emprego de colunista de jornal. Apesar da estabilidade obtida, Raposo sempre sentiu falta da excitação que sentia. Quando resolve se mudar para melhorar de vida, é instigado a escolher uma toca próxima às fazendas de Boggis, Bunce e Bean. Uma verdadeira tentação batendo à sua porta, a qual Raposo, é claro, já intencionava ser fisgado. Tem início então uma nova onda de roubos, sempre às escondidas da esposa.

    Toda esta trama inicial, é importante ressaltar, não está no livro de Roald Dahl. É mérito de Wes Anderson e Noah Baumbach, autores do roteiro, que resolveram transpôr para a história a questão do homem moderno, cada vez mais contido para se adequar à vida em sociedade. A opressão do lado selvagem, que anseia por liberdade, faz com que este homem - no caso, Sr. Raposo - entristeça, sinta que falte algo em sua vida. No filme esta questão ganha maior relevância pelo fato de que os personagens principais são, na verdade, animais. A humanização neles aplicada faz com que esta diferença fique ainda mais nítida ao espectador, pelo inusitado que é vê-los agindo desta forma. Trata-se de uma questão existencial do cotidiano atual.

    Além disto, Anderson trabalha bem os conflitos existentes dentro da família Raposo. É o filho que sonha em ser igual ao pai e sente-se por ele desprezado. É o primo com interesses diferentes que se destaca no que faz e, consequentemente, gera ciúmes. É a esposa que exige seriedade para a manutenção da família. Sempre usando um humor próprio, envolvendo a estranheza provocada pela situação apresentada e o distanciamento entre os personagens, às vezes provocado pela própria repressão de sentimentos que a sociedade exige.

    A animação utilizada também merece atenção. A técnica de stop motion provoca um impacto realista aos personagens, além de um visual artesanal. Por outro lado, possui limitações que até geram situações divertidas, como as cenas em que a família cava alucinadamente. O foco adulto é também mantido pela trilha sonora, recheada de referências ao mestre Ennio Morricone.

    O Fantástico Sr. Raposo é um bom filme, mas que provocará estranheza aos que não conhecem o estilo Wes Anderson de cinema. É uma animação fiel ao livro o qual é baseado, mas que expande sua história para limites bem distantes do objetivo de Roald Dahl. Afinal de contas, não estão aqui retratados personagens fofinhos, daqueles que de imediato ganham a afeição do público. Os sentimentos envolvendo amizade e família estão lá, mas sob o olhar do diretor. Um dos poucos que, nos dias atuais, possui uma nítida assinatura própria nos trabalhos que realiza.

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