Desde sua estreia na Netflix em 2021, Sex/Life se apresentou como uma tentativa de misturar erotismo, drama e introspecção sobre a insatisfação feminina dentro do casamento tradicional. Criada por Stacy Rukeyser e baseada no livro 44 Chapters About 4 Men, de B.B. Easton, a série prometia abordar temas relevantes como desejo, monogamia e identidade feminina em um mundo moderno. No entanto, a execução dessa proposta falha em quase todos os aspectos. Com uma trama irrealista e superficial, atuações inconstantes, roteiro previsível e uma cinematografia que se esforça para parecer sofisticada, mas cai no exagero, Sex/Life se consolida como uma das piores produções da Netflix, sendo amplamente criticada tanto pela mídia especializada quanto pelo público. A seguir, uma análise aprofundada de seus principais aspectos, demonstrando como a série se perdeu em seu próprio conceito.
A premissa da série gira em torno de Billie Connelly (Sarah Shahi), uma dona de casa vivendo uma vida aparentemente perfeita em uma comunidade rica de Connecticut ao lado de seu marido Cooper (Mike Vogel) e seus dois filhos. No entanto, Billie se sente presa na monotonia de sua vida conjugal e começa a revisitar mentalmente seu passado com Brad (Adam Demos), um ex-namorado com quem viveu uma relação intensa e cheia de paixão. A partir disso, a narrativa se divide entre flashbacks eróticos e momentos no presente, onde Billie se vê em conflito entre a estabilidade familiar e a vida de aventuras sexuais que deseja reviver. O problema dessa premissa não está na ideia em si—afinal, a insatisfação dentro do casamento é um tema legítimo—mas sim na forma rasa e fantasiosa com que é desenvolvida. Em vez de apresentar uma discussão madura sobre desejo, liberdade e comprometimento, a série se perde em cenas forçadas e excessivamente dramáticas, sem nenhuma profundidade psicológica nos personagens.
A atuação do elenco principal é, no melhor dos casos, inconsistente. Sarah Shahi até se esforça para dar alguma autenticidade à sua personagem, mas o roteiro fraco a impede de oferecer uma performance memorável. Billie deveria ser uma mulher complexa, dividida entre sua responsabilidade como mãe e esposa e seus desejos individuais, mas a personagem raramente exibe nuances emocionais convincentes. Seu comportamento oscila de forma artificial entre vulnerabilidade e impulsividade, tornando difícil para o espectador sentir empatia por sua jornada.
Mike Vogel, que interpreta Cooper, assume o papel do "bom marido" de forma estereotipada e sem nuances, sendo apresentado como um homem leal e trabalhador que tenta desesperadamente satisfazer sua esposa, mas sem qualquer desenvolvimento real de sua personalidade. Adam Demos, como Brad, entrega um personagem que deveria ser carismático e irresistível, mas acaba parecendo apenas uma fantasia bidimensional de um "homem perfeito e perigoso". Sua performance é carregada de clichês, desde seu jeito misterioso até sua inverossímil capacidade de sempre dizer exatamente o que Billie quer ouvir. Margaret Odette, no papel de Sasha Snow, a melhor amiga de Billie, tenta trazer algum equilíbrio à narrativa, mas sua personagem acaba servindo apenas como um recurso narrativo para reforçar os dilemas da protagonista, sem uma identidade própria.
O roteiro de Sex/Life é, sem dúvida, um de seus pontos mais problemáticos. A trama se desenrola de maneira previsível, repleta de diálogos expositivos e situações absurdas que não refletem a realidade de forma alguma. A série não consegue decidir se quer ser um drama profundo ou apenas um show erótico exagerado, resultando em um tom inconsistente que alterna entre o melodrama e a superficialidade. Além disso, os conflitos são resolvidos de maneira pouco convincente. A maneira como Billie lida com seus desejos parece forçada e sem autenticidade, como se os roteiristas não soubessem como equilibrar suas motivações de maneira orgânica. Ao invés de explorar a psicologia dos personagens com complexidade, a narrativa se limita a estereótipos que reduzem a história a um conto moral simplista sobre desejo versus compromisso.
A cinematografia da série tenta criar um ar sofisticado e sensual, mas frequentemente cai no exagero. As cenas de sexo são filmadas com uma abordagem quase caricata, tentando ser provocantes, mas resultando em momentos que beiram o ridículo. Em vez de criar uma atmosfera envolvente e natural, a direção opta por uma estilização artificial que lembra mais um videoclipe do que um drama de qualidade. Além disso, a maneira como a série enquadra os corpos e a sexualidade parece mais interessada em chocar do que em construir uma narrativa significativa. Esse enfoque excessivo no aspecto visual e no apelo erótico acaba por tornar a série cansativa e vazia.
O final de Sex/Life é tão problemático quanto o resto da série. A conclusão da primeira temporada sugere que Billie, apesar de tudo, não consegue abrir mão de sua paixão por Brad e decide se entregar ao desejo, deixando no ar as consequências dessa escolha. Esse desfecho, em vez de funcionar como um clímax emocionalmente impactante, soa desconectado da realidade e reforça a falta de profundidade da trama. A segunda temporada, em vez de corrigir os erros da primeira, apenas os amplifica, adicionando novos personagens e conflitos que não levam a narrativa para nenhum lugar relevante. O cancelamento da série após a segunda temporada parece uma decisão inevitável, visto que, além da recepção negativa da crítica, a história já havia se esgotado completamente.
A recepção crítica reflete bem as falhas de Sex/Life. No Rotten Tomatoes, a série tem uma taxa de aprovação de apenas 21%, com um consenso crítico que aponta sua obsessão por cenas eróticas em detrimento do desenvolvimento de uma identidade própria. O Metacritic, por sua vez, dá à série uma nota de 45/100, evidenciando as críticas mistas e médias que recebeu. Apesar de números expressivos de audiência—como os 67 milhões de lares que assistiram à primeira temporada nas primeiras quatro semanas—fica claro que o apelo da série era mais baseado na curiosidade do público por seu conteúdo provocativo do que em sua qualidade narrativa.
No geral, Sex/Life é um exemplo claro de como um conceito promissor pode ser desperdiçado por uma execução fraca. Ao invés de oferecer uma reflexão madura sobre sexualidade e identidade feminina, a série se contenta em ser um melodrama exagerado e desconectado da realidade. O roteiro pobre, atuações inexpressivas e um tom que oscila entre o ridículo e o pretensioso fazem com que a produção falhe tanto como drama quanto como entretenimento erótico. O cancelamento da série não foi uma surpresa, mas sim um alívio para aqueles que esperavam que a Netflix priorizasse histórias mais bem desenvolvidas no futuro. Se há algo que Sex/Life nos ensina, é que uma abordagem rasa e artificial sobre temas complexos dificilmente resulta em uma produção memorável.