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    Glass Onion: Um Mistério Knives Out
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Glass Onion: Um Mistério Knives Out

    "Quem matou?" é apenas uma das perguntas

    por Aline Pereira

    Em 2019, Entre Facas e Segredos trouxe de volta à vida e aos holofotes o gênero “quem matou?”, que tem a escritora Agatha Christie como sua grande dama. Com um elenco cheio de estrelas, o longa dirigido por Rian Johnson - e que rendeu a ele uma indicação ao Oscar de Melhor Roteiro Original -, gerou frutos. Glass Onion: Um Mistério Knives Out estreou diretamente no catálogo da Netflix (ao contrário de seu predecessor, lançado nos cinemas) com a promessa de dar o primeiro passo em uma franquia cheia de potencial.

    Glass Onion: Um Mistério Knives Out não é uma sequência direta do filme de 2019, mas traz Daniel Craig (007 - Um Novo Dia Para Morrer) de volta ao papel do detetive Benoit Blanc, desta vez, em uma nova investigação. A trama se desenrola em uma ilha grega paradisíaca, onde o magnata da tecnologia Miles Bron (Edward Norton) recebe seus amigos - um grupo cheio de figuras peculiares e que guardam muitos segredos.

    Todos eles se tornam grandes suspeitos quando uma pessoa surge morta e cabe ao detetive Blanc descobrir o que aconteceu. Para isso, entra em ação a clássica fórmula Agatha Christie, em que o público é convidado a acompanhar o protagonista no quebra-cabeça de motivações, omissões e verdadeiras intenções de seus alvos. Tudo isso, claro, enquanto o próprio detetive, se vê cada vez mais envolvido com o crime.

    Glass Onion começa devagar, mas recompensa quem for paciente

    Como o próprio título do filme nos indica (“onion” significa cebola, em inglês), tanto os mistérios, quanto as respostas para eles vão surgindo em camadas. De forma geral, isso é ótimo porque faz Glass Onion ir um pouco além da espera para revelar quem é o assassino: não daremos spoilers, claro, mas existem outras questões tão importantes quanto essa que surgem gradualmente. Isto é, o longa vai incluindo novas perguntas ao longo da trama que funcionam bem para manter o interesse e a curiosidade do espectador bem antes do gran finale.

    Aqui, a principal questão talvez seja a primeira camada dessa cebola: o primeiro ato de Glass Onion parece um pouco desencaixado do restante da história e não nos oferece muitos elementos, de fato, úteis para desvendar os grandes mistérios nos atos seguintes. Mais do que isso, dá uma apresentação morna a personagens que são ótimos - e vamos falar sobre eles mais adiante. 

    A boa notícia é que, possivelmente, você vai se esquecer completamente de qualquer engasgo no início do filme à medida que a história avança. É com a reunião dos personagens e a chegada à ilha de Miles que Glass Onion começa a brilhar de verdade, explorando o carisma dos suspeitos e o talento de um elenco que chegou com a tarefa de “substituir” Crhis Evans, Ana de ArmasJamie Lee Curtis e outros tantos grandes artistas de Entre Facas e Segredos.

    Elenco de Glass Onion: Um Mistério Knives Out constrói bons personagens

    No filme de Rian Johnson, o bilionário Miles Bron juntou a seu redor um grupo de amigos cujas conexões pessoais fazem parte do mistério que está sendo construído e representam temas muito atuais - que ganham charme e personalidade graças a uma boa escolha de elenco. O principal destaque aqui talvez seja Kate Hudson, no papel de uma modelo influente que personifica o ciclo da “cultura do cancelamento”: opiniões alienadas que geram respostas negativas do público e o esforço calculado para reconstruir a imagem.

    Ao lado dela, outros rostos conhecidos do público, como Dave Bautista (Guardiões da Galáxia) e Kathryn Hahn (Wandavision), passam por temas como troca de favores, conflitos éticos, conservadorismo, entre outras questões que têm sido especialmente relevantes nos últimos anos. Assim, além da história de detetive, Glass Onion oferece ao público outros pontos de interesse na história ao nos transportar para um mundo extremamente privilegiado a que quase ninguém tem acesso - e que, por dentro, é cheio de hipocrisias.

    Aos moldes de outras produções que fizeram sucesso recentemente, como as premiadas séries Succession e The White Lotus, Glass Onion satisfaz esse desejo quase geral de assistir a ruína de uma realidade aparentemente perfeita e confortável, povoado por pessoas com as quais não conseguimos nos identificar em praticamente nenhum nível.

    Aqui, vale pontuar ainda a presença de Janelle Monáe (Estrelas Além do Tempo, Moonlight: Sob a Luz do Luar): a personagem dela aparece na história conectada a Miles de forma oposta a dos outros “amigos” e se torna, rapidamente, nossa heroína. À medida em que sua trama é contada, a atriz se torna uma figura magnética, cuja força nas cenas certamente é um ponto de destaque. Por fim, é importante destacar que Daniel Craig, agora aposentado do papel de James Bond, domina ainda mais seu personagem, que também ganha novas peças para compor sua história individual - temos um protagonista com plenos poderes para conduzir uma franquia. 

    Quem são os gênios do mundo moderno?

    A palavra “disrupção” aparece diversas vezes ao longo de Glass Onion com a intenção, justamente, de descaracterizá-la. O que significa ser disruptivo? O que realmente significa ser genial na atualidade? O diretor e roteirista Rian Johnson nos convida a essa reflexão ao apresentar o personagem de Edward Norton como um chefão da tecnologia que simboliza o nível máximo do descolamento da realidade: ele não tem dúvidas de que é um ser humano que “enxerga além” e suas ambições megalomaníacas tem justificativas alienadas, que vão da pseudociência à influência midiática. Não é difícil vê-lo e figurões do mundo real.

    Enquanto a história vai e volta entre passado e presente para nos trazer as respostas, vai expondo também, pouco a pouco, as camadas de privilégio que fazem com que tipos muito específicos de pessoas sejam vistas como exemplos, como sinônimos de sucesso, inteligência e engenhosidade. 

    A franquia Knives Out tem tudo para continuar atualizando um gênero que mexe com uma das principais características humanas - a curiosidade -, porque encontrou não só uma maneira eficaz de atualizar a fórmula clássica, mas de adicionar bons elementos sem deixar perder sua essência.

     

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