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    Enigma
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Enigma

    Casos de família

    por Taiani Mendes

    Sandra, filha de Nancy (Roxana Campos), foi assassinada há oito anos na porta de um bar, onde estava acompanhada da suposta amante. Vestia jaqueta em um mês de calor. Dentre milhares de informações que poderiam complementar a informação principal, é a essa que o diretor chileno Ignacio Juricic Merillán se atém em Enigma, filme que honra em excesso o título que possui. A jaqueta mostra seu valor, servindo como tema para uma discussão serenamente dura entre marido e mulher fora de sintonia e com feridas abertas, mas não deixa de ser um sinal da covardia do cineasta em sua abordagem do feminicídio ou da homofobia - deveria ser dos dois, mas acaba não sendo de nenhum, pois o tema revela-se um tabu maior para a trama do que para a família da protagonista.

    No começo parece uma história de rejeição maternal, mas logo percebe-se que não é bem isso, "o inferno são os outros". Nancy é convidada a falar sobre o caso, jamais resolvido, num programa de TV e fica perturbada com a evocação da memória da primogênita. Ela trabalha num salão e sua casa vive cheia de mulheres - filhas, sobrinhas, irmãs… não é fácil saber quem é quem -, que fumam o tempo todo, confabulam e estão sempre escondendo algo de alguém. Nancy esconde o contato e o desejo de participar da denúncia, mas não por muito tempo. E enquanto recupera informações que lhe foram negadas à época, encontra resistências dentro do próprio lar.

    Ok então, Enigma é sobre essa mulher enfrentando todos para resolver uma questão que ficou pendente em sua vida, uma ferida que parecia cicatrizada. Funcionaria se ela de fato corresse atrás disso, procurasse a "nora" ou mesmo recuperasse dentro de si memórias da filha, no entanto o que Ignacio filma é a trajetória de Nancy do "não" ao "sim" à aparição na televisão, deixando por fim mais perguntas do que respostas, pois poucos detalhes soma ao que já era conhecido a respeito do crime na cena de abertura. Enigma não se aproxima de uma solução do assassinato, não explora a relação de Sandra com seus pais, parentes e amigos, não aprofunda nenhum personagem, não transforma ninguém e não resolve nenhum enigma, só planta vários.

    Inconclusivo, volta-se para a vaidade sem resolver o interior, deixando dúvidas inaceitáveis no ar, inclusive a respeito do sentido do filme. Juricic sabe dirigir e se mostra inspirado nas sequências envolvendo Nancy e Jaime, além de resolver bem os paralelos dos grupos de irmãs, a agitação constante e a falta de paz e privacidade da matriarca. Seus segredos, no entanto, não deveriam ser escondidos até do público, e tampouco o drama deveria renegar tanto o homicídio que é sua razão de existir e tudo que o acompanha - dentro e fora do seio familiar.

    Filme visto na 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2018.

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