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    Euforia
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Euforia

    Amor não pronunciado

    por Barbara Demerov

    -'Desentendimentos do passado que custam a ser resolvidos, memórias que ainda afetam o presente e uma união que nunca aconteceu. Diversas são as possibilidades de se trabalhar um relacionamento entre irmãos, mas no caso de Euforia, de Valeria Golino, a ideia principal é de aproveitar o silêncio e a negação entre dois irmãos que se amam e se querem bem acima de qualquer diferença, mas que, por alguma razão que só a vida é capaz de responder, não são capazes de elucidar ou resumir seus sentimentos em palavras.

    Nesta história sobre reconhecer e conviver com a dor, seja você o afetado ou quem está próximo daquele que mais sofre, Matteo (Riccardo Scamarcio) e Ettore (Valerio Mastandrea) têm vidas completamente distintas, seja por conta de suas rotinas ou no quesito comportamental. Através de uma direção que não contrasta tanto as diferenças entre os personagens por inseri-los num ambiente "neutro", na residência de Matteo em Roma, o longa tem como foco apresentar uma discórdia que nasce da condição debilitada da saúde de Ettore, que o faz morar com o irmão por tempo indeterminado. O intuito não é mostrar os atritos com diferenças de pensamentos ou até mesmo de aprovação pelas escolhas feitas até aqui, pois eles aparecem justamente diante da preocupação excessiva de se estar próximo.

    É curioso e, certamente, muito semelhante a vida real, este norte que a diretora dá à sua história. Algo que parece muito fácil de ser resolvido se transforma na própria estrutura do filme, que orbita entre a dificuldade de aceitação de Matteo ao ver seu irmão com câncer (o que pode ser confundido com atos de egoísmo a princípio) e a mudança de perspectivas de Ettore, que além de não saber exatamente qual é sua condição médica, sente-se perdido mesmo em meio à sua carinhosa família. No entanto, pouco aborda a doença em si, mantendo a atenção em Matteo a todo o momento e dando espaço para a visão do irmão antes da percepção de sofrimento interno do enfermo.

    Mas, por mais saudável que pareça por fora, é Matteo quem mais precisa de ajuda no fim das contas. Com vício em drogas e poucos relacionamentos o impossibilitam de se abrir emocionalmente, é certo dizer que o protagonista é o que mais precisa de maturidade para lidar com a doença de Ettore, assim como com a própria vida. Sempre em negação, tentando organizar a realidade de modo que se encaixe aos seus pensamentos positivos e controlando-a até onde consegue alcançar (sem pensar efetivamente nas pessoas com quem convive), Matteo, durante Euforia, passa por todo um processo de autoreconhecimento e auto-avaliação, enquanto seu irmão já aparenta ter plena noção de seus sentimentos e desejos.

    Aliado a fotografia com uma paleta de cores que, mesmo frias, expressam acalento e a afetuosidade dos irmãos adultos, Euforia também conta com uma direção primorosa de Golino em seus planos e enquadramentos, que ora mostram a solidão de Matteo, ora ajudam a clarear os pequenos bons momentos que aparecem de surpresa. É só mais próximo ao desfecho do longa que vemos a lucidez do protagonista, mas toda a jornada de esclarecimento é bem desenvolvida a ponto de transformar a última cena em um verdadeiro encontro de almas que se conhecem e reconhecem, e não um apenas breve reencontro de quem se viu há pouco tempo.

    Filme visto na 8 ½ Festa do Cinema Italiano 2019.

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