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    Los Silencios
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Los Silencios

    A guerra fantasma

    por Bruno Carmelo

    Esta coprodução entre Brasil, Colômbia e França parte das melhores intenções. O drama pretende não apenas denunciar as guerras civis que ocorrem nas fronteiras entre os países sul-americanos, ignoradas por governos locais, como também dar voz aos familiares das vítimas, muitas vezes em situação de precariedade financeira. Trata-se de um cinema que deseja unir poesia e conscientização, fazendo da arte um veículo de melhorias sociais.

    Para ilustrar os confrontos, nada melhor do que partir de uma família diretamente afetada por eles. No caso, Amparo (Marleyda Soto), mulher cujo marido brasileiro desapareceu, e hoje luta para sustentar os dois filhos pequenos. Como o cadáver do esposo nunca foi encontrado, ela sequer tem direito a indenizações. Amparo vive então de pequenos bicos, enquanto solicita a ajuda de outros moradores em condições semelhantes. Através das andanças desta personagem, o filme retrata um microcosmo comunitário à parte. Os silêncios mencionados pelo título são ao mesmo tempo aqueles dos moradores, impotentes diante das agressões, aquele dos responsáveis e também dos que aproveitam da situação, a exemplo dos advogados gananciosos.

    Um dos aspectos mais bem-sucedidos de Los Silencios é sua rica paisagem sonora. A equipe de som, desde a captação até a edição e mixagem, compõe um universo rico em ruídos da natureza, falas distantes, conversas de grupos reunidos. É fácil imergir neste local graças aos diversos estímulos. Paralelamente, a fotografia consegue captar a lama das ruas, a água que invade os casebres e mesmo imergir os personagens na total escuridão quando necessário. Uma cena de encontro entre todos os habitantes locais, no terço final, é particularmente bem-sucedida por evocar uma carga emocional ausente no resto da narrativa. Talvez o aspecto mais político do projeto se encontre na estética realista, atenta a cada detalhe sem apelar para o miserabilismo.

    É uma pena que exista um ruído na função representativa da imagem. O projeto depende excessivamente da confiança do espectador: fala-se na guerra sangrenta, mas nunca vemos a guerra, fala-se nos moradores que passam o dia plantando, mas não o vemos plantando, fala-se na pressão de governantes para comprar aquelas terras, mas não vemos ninguém efetuando tal pressão. Talvez por restrições orçamentárias, os principais conflitos são traduzidos em diálogos, mas não representados em tela. O impacto seria certamente mais forte se o projeto materializasse estes momentos, ao invés de contá-los em terceira pessoa. A figura fantasmática do marido, que talvez contribuísse a esta função, serve de recurso anticlimático, entrando e saindo das cenas sem gerar uma transformação significativa.

    Ao mesmo tempo, os enquadramentos e a montagem adotam um ritmo estático demais. As fachadas das casas e as reuniões com o presidente local são filmadas à distância, sem que a câmera se permita mover junto deles, explorar texturas, volumes, deslocamentos, cores. Observamos com um distanciamento empático, porém frio. Los Silencios constrói uma experiência bem detalhada, porém sem mergulhar nela por completo. O mesmo vale para as atuações desafetadas ao limite da apatia, ou então um pouco endurecidas, no caso dos coadjuvantes. Mesmo assim, a mensagem da diretora Beatriz Seigner é transmitida com clareza, e felizmente o filme consegue terminar em seu momento mais potente, o que gerou boa resposta do público durante a exibição em Cannes.

    Filme visto no 71º Festival Internacional de Cannes, em maio de 2018.

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