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    Yonlu
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Yonlu

    Balada do garoto interrompido

    por Bruno Carmelo

    O espectador deste drama descobre, desde o início, que Yonlu se matou. O jovem com notável talento artístico e boa estrutura familiar seguiu os conselhos de um fórum da Internet para descobrir como retirar a própria vida. O suicídio, no caso, não é apenas um ponto de partida, mas um conflito que pesa sobre toda a narrativa. O espectador é convidado a ler cada imagem pela ótica da morte iminente, o que confere à trama um aspecto mais melancólico, mais grave - especialmente por se tratar de um adolescente de 16 anos, num caso tornado famoso em 2006.

    O diretor Hique Montanari possui um material delicado em mãos. Muitas representações do suicídio têm sido criticadas recentemente, seja por romantizarem a morte como um ato heroico – especialmente no caso de jovens artistas –, seja por julgarem moralmente a vítima, atribuírem uma causa única aos fatos, ou ainda explorarem o sofrimento em nome do sucesso do filme. O suicídio constitui um tabu por si próprio, e seu tratamento em imagens revela-se ainda mais arriscado: qualquer imagem pode parecer redutora perto da complexidade psicológica do caso. Como exteriorizar no cinema um tormento interno, cujas particularidades foram conhecidas apenas por aquele que o experimentou?

    Yonlu escapa habilmente às armadilhas narrativas. Primeiro, por se descolar da realidade, assumindo-se como artifício: o cineasta escala para o papel principal um ator de pouca semelhança física com Vinícius Gageiro Marques, e faz questão de revelar que o quarto do garoto é um cenário, com refletores e outros aparatos cinematográficos deixados à vista do espectador. Existe algo antinaturalista nos espaços da sessão de terapia ou da sala de jantar. Segundo, por privilegiar um fluxo de sensações não lineares: a narrativa é pautada por metáforas visuais destinadas a representar o estado psíquico do garoto. Ao invés de ressaltar a solidão em diálogos, reviravoltas ou confissões, temos trechos visuais se cruzam, se repetem e se alimentam numa temporalidade fluida e criativa.

    A poesia visual se revela o ponto forte do projeto. Trabalhando com recursos escassos, Montanari explora ao máximo os espaços de galpões vazios, corredores assustadores, quartos pouco confortáveis, além da cidade com arranha-céus opressores. O ótimo trabalho de animação se apropria dos desenhos originais de Yonlu para criar movimentos próprios, enquanto personagens animados adquirem contornos reais. Recursos analógicos de iluminação e enquadramento se combinam com distorções digitais para criar uma constante sensação de não-pertencimento. Não é preciso reforçar que o protagonista sofre, que não se relaciona com outras pessoas, que expressa através da música e das ilustrações o seu pesar: cada imagem é construída de modo a transmitir esta sensação ao espectador.

    Apesar de tamanha liberdade com o real, Yonlu preserva a relação com as músicas, incluindo dezenas de composições do garoto na trilha sonora. Talvez a inserção do título de cada canção sobre a tela prejudique a organicidade do trabalho sonoro, ainda que contribua a interpretar a obra como reflexo direto de seu criador. Paralelamente, as perguntas explicativas da entrevistadora ameaçam conferir ao resultado um didatismo nocivo à proposta estética, mas o filme foge deste caminho e reforça a viagem intimista. Thalles Cabral acerta ao privilegiar a composição sóbria, mínima, quase invisível. Por fim, ao invés de efetuar perguntas ou fornecer respostas, o filme prefere se colocar junto de seu personagem, combinando a observação empática e atenciosa com o distanciamento típico do respeito face à morte.

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    Comentários

    • Lucas Pereira
      Eu tenho um link dele, se quiser eu te passo pelo whatsapp
    • Ana Júlia R
      como faço para assistir este filme? eu amei a crítica!
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