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    Tom da Finlandia
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Tom da Finlandia

    O homem por trás do fetiche

    por Bruno Carmelo

    O leitor talvez conheça o trabalho de Touko Laaksonen, mesmo sem saber os detalhes da vida do artista. As imagens em preto e branco com homens musculosos, vestidos em couro, montados sobre motocicletas em atos sexuais explícitos se tornaram ícone de uma cultura gay popularesca. Através deste filme biográfico sobre “um dos maiores artistas homossexuais do século XX”, segundo a sinopse oficial, a Finlândia demonstra seu orgulho do artista. O projeto visa articular três aspectos diferentes: o retrato da condição gay na época, a origem deste tipo particular de desenhos e a consagração de Touko no cenário internacional.

    O trio de elementos ganha um tratamento peculiar. A reconstituição do cenário da Segunda Guerra Mundial adquire ares de suspense exótico: Touko encontra homens em florestas escuras, bares escuros, casas escuras, vielas escuras. Bombas explodem enquanto homens fazem sexo escondido - curiosa escolha da montagem - enquanto o assassinato de um inimigo alemão é retratado com forte carga de erotismo. O diretor Dome Karukoski sexualiza a guerra e decide conferir à vida dos finlandeses um ar sombrio digno dos filmes policiais noir.

    As caracterizações ficam um grau acima do realismo: a irmã de Touko, interpretada por Jessica Grabowsky, é ingênua demais, o fã Doug (Seumas Sargent) funciona como um mecenas idealizado e o próprio Tom (Pekka Strang) tem seu caráter soturno e introspectivo sublinhado em excesso. O filme se preocupa em evocar os traços mais fortes de cada personagem com clareza didática, como se duvidasse da capacidade do espectador em compreender sutilezas. Talvez a intenção seja evocar os próprios desenhos do protagonista, um tanto caricaturais, ficcionalizando os fatos para além do realismo.

    Karukoski demonstra preocupação tão grande com a construção do tom, entre o perigo e a farsa, que não desenvolve a contento a psicologia de seus personagens. O espectador nunca descobre como se desenvolvem os traços o artista, de onde surge o interesse específico por esta figura masculina tão diferente dos homens com quem se relaciona. O sarcasmo de Touko em momentos de afrontamento com a polícia se transforma em timidez absoluta em outras cenas, tornando o protagonista um tanto hermético. De mesmo modo, o namorado de Touko, Veli (Lauri Tilkanen) permanece um sujeito sem motivações precisas, um bailarino que nunca dança. O filme privilegia os fatos afetando os indivíduos (fenômenos externos) à maneira como recebem estes estímulos (fenômenos internos).

    A própria consagração de Tom ocorre de modo rápido demais, sem que o roteiro tente compreender o valor artístico das obras. Para a narrativa, a importância do desenhista se encontra exclusivamente em sua popularidade. Paralelamente, o valor das pessoas que o cercavam se define pelo peso que tiverem na vida de Touko. Estamos num mundo artificial, com homens fortes demais, em roupas irreais, personagens acessórios, fotografia exagerada. Mesmo os símbolos são óbvios: um dos primeiros diálogos trata de um coelhinho que “não deveria ficar preso no armário”. Tom of Finland soa como um cartoon, um decalque tragicômico da realidade. Para o bem ou para o mal, esta forma dialoga com o trabalho do artista.

    Filme visto no 25º Festival Mix Brasil, em novembro de 2017.

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