Minha conta
    Pieles
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Pieles

    A casa de bonecas deformadas

    por Bruno Carmelo

    O filme-evento do festival de Berlim se chama Pieles, uma comédia dramática espanhola intercalando esquetes sobre pessoas com deformidades físicas. Os casos retratados vão desde condições reais (nanismo, obesidade mórbida, queimaduras) a patologias imaginárias (uma personagem com uma pele cobrindo os olhos, outra com o ânus no lugar da boca). Para completar o retrato exótico da alteridade, o diretor Eduardo Casanova introduz aos retratos um forte componente sexual, envolvendo os protagonistas em tramas de prostituição, pedofilia e fetiches variados.

    O roteiro não fornece nenhuma descrição humanista de Ana (Candela Peña), Laura (Macarena Gomez), Guille (Jon Kortajarena) e outros. O espectador tem que imaginar o que eles pensam sobre o mundo, quais são seus gostos, suas aspirações para o futuro, sua relação com amigos e familiares. Eles são limitados a suas diferenças. As curtas histórias exploram principalmente a inconveniência de se comer quando a boca está no lugar do ânus, ou de ter pernas quando um distúrbio psicológico o leva a crer que os membros não são seus.

    Pieles remete aos antigos circos de horrores que ofereciam ao público o prazer de observar, em jaulas, a mulher barbada ou o homem elefante. Agora, você tem a oportunidade extra de vê-los nus, fazendo sexo. O humor extraído desta dinâmica se deve menos à comicidade de situações do que à manifestação do desconforto em ver pessoas humilhadas ou, no melhor dos casos, desprezadas por outros personagens e pelo próprio filme. Casanova pretende discutir o imperativo da beleza, argumentando que as deformações também podem ser belas. Mas ao invés de sustentar a ideia de que as pessoas podem ser respeitadas por sua diferença, apesar da deformidade, ele sustenta que são belas graças à deformidade.

    O filme transforma, portanto, o grotesco em fetiche, em componente do kitsch e da lógica mercantilista. Não por acaso, as diferenças podem ser capitalizadas: a mulher sem olhos se prostitui, a mulher com nanismo é explorada como mascote de uma marca. Colabora à lógica fetichista o embelezamento das imagens: esta é uma produção assumidamente surreal, com cenários inteiros decorados em cores rosa e lilás. O cenário é embelezado em tons infantis, como numa grande casa de boneca em que a deformidade é transformada em adorno: para a mise en scène do diretor, a ausência de olhos numa jovem é equivalente a um papel de parede raro, luxuoso.

    Pelo menos, não pode se dizer que o projeto efetue a associação comum entre deformidade física e transtorno de caráter: os personagens não são vistos como monstros cruéis, e sim como vítimas, sacrificadas pela lógica do espetáculo. A única solução oferecida é a união entre as diferenças – e, ainda nestes encontros, o diretor encontra motivo para escárnio, como no beijo final. Saímos do moralismo para entrar no paternalismo em relação à alteridade. Pior do que isso, colocando lado a lado patologias sérias, fantasias erotizadas, manifestações de sexualidade (um casal lésbico) e distúrbios sérios (a pulsão pedófila), como se fizessem parte do mesmo conjunto, com as mesmas características e necessidades. Em Pieles, o grotesco físico e a marginalidade social são triturados, moídos e pintados de rosa em nome do entretenimento.

    Filme visto no 67º Festival de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2017.

    Quer ver mais críticas?

    Comentários

    • ANA MARIA
      Filme bastante perturbador com cenas ousadas e por vezes nojentas e estranhas. Tem o lado trágico do sentimento das pessoas que possuem deformidades por vezes graves, o que é muito triste e humilhante. Pessoas se aproveitam e zombam delas. Acho que a mensagem é que todos por trás de suas peles possuem sentimentos e merecem respeito.
    • CRUZEIRÃO MAIORMG REI DE COPAS
      Tem seu valor apesar de ser bizarro né?
    • Cleiton Borges
      Eu vi o filme e concordo plenamente com a nota. Por mais que o filme passe uma mensagem, ele só faz isso! O figurino é horrível, tem uma mulher com o ânus no lugar da boca e a boca no bumbum, por onde ela se alimenta. O Filme é tosco e bizarro. Nenhuma ótima atuação, roteiro perdido, enfim, duas estrelas estão de muito bom tamanho, apenas pela mensagem que passa.
    • SMS
      As duas criticas se completam ...da página e da ALIZE BM, acredito que sejam as duas coisas ...resumindo a natureza humana nas suas diversas esferas...de taras, traumas, psiques...enfim! o de se aceitar, o de aceitarem. O que achei bem interessante foi o dialogo de Ernesto e sua noiva no jantar qdo ela pergunta o que ele ama nela ou o que ele gosta e este diz que é a deformidade dela o que ela retruca: Ernesto, isso é só pele amanhã eu posso fazer uma cirurgia e não ter mais isso...vc vai me amar? no geral qualquer deformidade não caracteriza sua essência. Sobre as cenas que nos fazem chocar talvez seja a mesma sensação quando vemos algo em alguém uma atitude ou aparência diferente da dita normalidade.
    • Antonio Magela Brandao
      gostei da crítica/análise, assim como do filme.
    • Aline Gonçalves
      Que Análise linda, Meu!
    • Vinicius D.
      Acho que o critico se sentiu incomodado com o filme, este incomodo está claro no texto e na nota dada ao filme, faltou ao crítico alteridade
    • Alize BM
      A crítica mostra uma visão muito limitada sobre o filme. Se você enxergou principalmente deformidades físicas em meio aos tons pastéis dos cenários sob um fundo de humor negro, assista de novo sob uma ótica mais humana e menos impressionável e verá mais deformidade moral nos personagens de físico normal, vide a primeira cena na qual uma senhora mostra catálogos de crianças (de bebês a pré-adolescentes, com ou sem má formação) para um pedófilo escolher a que melhor lhe agrada, assim como o deboche e bullying que personagens dentro da normalidade (mesmo que fora dos padrões de beleza) são capazes com os que são deformados. Não vou falar sobre os outros senão vou acabar dando spoiler, mas não é preciso muito esforço para começar a compreender os personagens deformados como SERES HUMANOS e sentir empatia com a necessidade de contato e afeto que estes também possuem. Peles é de fato nu e cru e sem sombra de dúvidas incomoda, pois mostra tudo o que não vemos nos filmes comuns - pessoas deformadas; queimadas; pessoas gordas, velhas, totalmente nuas; anões longe de serem personagens cômicos; um cu com pêlos; essas pessoas fazendo sexo e buscando afeto; e mais do que isso, pessoas normais que excluem, maltratam e abusam, deformadas por dentro. Este não é um filme para quem só está acostumado a ver Vingadores, Crepúsculo, Cinquenta tons de cinza e comédias românticas meia boca.
    • Aline Gonçalves
      Que Crítica mais inútil...o cara que escreveu isso pode entender tudo de Cinema, mas nada de ALMA HUMANA... ( e no Cinema tem muita merda cheia de Super-Heróis Marombados sendo exaltada por Pessoas com Preguiça Mental, enquanto filmes como Pieles acabam passando despercebidos ainda mais com críticas deste nível). Mas o que dizer de um site onde o filme tendencioso do Pedir mais-cedo recebe 4,7 estrelas enquanto Pieles recebe 2...? No mínimo decepcionante.
    Back to Top