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    Virgem Juramentada
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Virgem Juramentada

    Cara de atmosfera

    por Bruno Carmelo

    Na cena inicial, Hana (Alba Rohrwacher) está se divertindo na neve, tentando capturar um animal fugitivo. Não se explica muito sobre o contexto, nem sobre os personagens, privilegiando a beleza das imagens e a trilha sonora envolvente. Este momento, de certa maneira, representa todo o filme, que dilui a sua história na estética austera da diretora estreante Laura Bispuri.

    Com muita calma, o roteiro apresenta a sua história principal. A jovem Hana hoje se veste com roupas masculinas e atende pelo nome de Mark. Seguindo as tradições do vilarejo albanês onde foi criada, ela deve assumir uma identidade masculina por se recusar a casar e ter filhos. Hana torna-se uma “virgem prometida”, ou seja, um ser assexuado que promete nunca ter relações sexuais em sua vida.

    Através do uso de flashbacks, cada nova cena fornece uma pequena informação suplementar sobre a cultura destas pessoas, e sobre a situação política da comunidade albanesa que imigrou para a Itália. O naturalismo é memorável, assim como o respeito pelas tradições. Mesmo assim, o olhar da cineasta é externo e indiferente. Hana/Mark pronuncia pouquíssimas palavras ao longo de todo o filme, quase nunca expressa desejos, dores, ressentimentos. Ela é um corpo que se desloca, o exemplo de um caso atípico, mas impessoal. A câmera raramente se aproxima de seu rosto.

    Algumas cenas de grande importância para a evolução do conflito são retratadas de modo questionável por Bispuri: os flashbacks da adolescência, com as atrizes adultas interpretando jovens de 18 anos, são pouco convincentes, já o esperado confronto da protagonista com a sua sexualidade é retratado de maneira rápida demais (apesar do esforço notável do ator Lars Eidinger), e sem consequências visíveis na vida de Hana/Mark. Mesmo a relação da personagem com a modernidade – representada pelo mundo elitista do nado sincronizado – não se aprofunda.

    Vergine Giurata dá a impressão de querer evitar a todo custo o desenvolvimento clássico da narrativa, fragmentando-a, aproximando-a da abstração. É louvável que a diretora não queira explicar demais, ou tratar esta história como um caso excepcional – são justamente os momentos de banalidade, como o dueto entre as duas irmãs, que melhor funcionam na trama. Mas a estética é tão fria que a obra se desenvolve sem deixar marcas profundas, tornando-se mais admirável do que apaixonante.

    Hana/Mark contradiz aquela personagem de Hotel do Norte, insistindo ao namorado que não tinha “cara de atmosfera”. Vergine Giurata, este sim, é um filme com cara de atmosfera: Rohrwacher e Bispuri entregam-se com tanto fervor a um conceito cerebral que negligenciam o aspecto humano da história.

    Filme visto no 65º festival de Berlim, em fevereiro de 2015.

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