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    O Botão de Pérola
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    O Botão de Pérola

    Nostalgia da água

    por Bruno Carmelo

    Em 2010, o cineasta Patricio Guzmán conquistou um prestígio considerável com o documentário Nostalgia da Luz. A ideia era ousada: encontrar relações entre as riquezas do solo do deserto do Atacama, as estrelas no céu do Chile e as consequências da ditadura de Pinochet. Embora algumas metáforas fossem um pouco artificiais, Guzmán conseguia combinar com propriedade a arqueologia, a astronomia e a política, fazendo um trabalho histórica e filosoficamente relevante.

    Agora, em 2015, ele apresenta uma espécie de sequência, com uma estrutura muito semelhante à obra anterior. Depois de olhar para a terra e para o céu, agora Guzmán observa as águas do Chile, onde foram jogados muitos milhares de habitantes durante a ditadura. A intenção desta vez é fazer outra triangulação, entre a geografia (a condição insular do país), o passado colonial (com a morte e estupro de índios) e a ditadura de Pinochet.

    O botão de pérola, presente no título, é o símbolo que permite essa aproximação. O objeto está presente tanto na história de um índio ingênuo que ajudou os colonizadores a encontrarem sua tribo, e consequentemente dizimá-la, em troca de um botão precioso, quanto na barra de ferro presa ao peito dos chilenos jogados ao mar, para que afundassem. Curiosamente, uma das barras encontradas décadas mais tarde continha um botão de pérola.

    Mais uma vez, os comentários políticos, filosóficos e geográficos do diretor são valiosos. É notável ver como ele consegue articular conhecimentos tão diferentes, de maneira fluida. Talvez as imagens não sejam tão belas quanto os planos desérticos de Nostalgia da Luz, e é possível que o conjunto não apresente a mesma sensação de novidade, por reproduzir a mecânica do documentário precedente, mas ainda assim a obra é muito acima da média.

    O que prejudica o ritmo desta exposição é a narração em off, feita pelo próprio diretor. Guzmán adota novamente um tom professoral e ex-tre-ma-men-te ar-ti-cu-la-do, como se estivesse explicando para crianças com dificuldade de cognição. A monotonia do filme não deve contribuir para seu sucesso, nem no circuito de arte. Apesar do teor arrastado e didático, vale fazer um esforço para assimilar o rico pensamento interdisciplinar do diretor.

    Filme visto no 65º festival de Berlim, em fevereiro de 2015.

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