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    O Amor É Estranho
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    O Amor É Estranho

    Simplesmente singelo

    por Francisco Russo

    O título de O Amor é Estranho (tradução literal do original, Love is Strange) é um tanto quanto equivocado. Por mais que o diretor Ira Sachs aborde o relacionamento maduro de dois homens que, após 40 anos juntos, decidem se casar, a atenção maior não está propriamente neste amor e sim nos que estão à sua volta. É através da reação destas pessoas que Sachs e o roteirista brasileiro Maurício Zacharias sutilmente constroem um panorama onde preconceitos afloram e, mais ainda, é possível constatar a difícil arte da convivência.

    O primeiro alvo tem endereço certo: a igreja. Sem histeria, o filme aponta o dedo para a hipocrisia existente na demissão de George (Alfred Molina), um veterano professor que jamais escondeu a homossexualidade. O simples fato de ter se casado, evento apresentado logo no início do filme com toda a felicidade e harmonia que a ocasião tem direito, o torna persona non grata na escola católica e “possível má influência” aos alunos. O contraste da felicidade no casamento, sacramento católico, com a demissão sumária por oficializar algo que todos tinham conhecimento é gritante e, se não é revelador, é porque soa com um incômoda familiaridade. “É importante que isto não mude sua crença”, diz o padre diretor. A igreja, às vezes, é estranha.

    O segundo alvo é mais amplo e envolve uma enorme quantidade de pessoas e situações. Demitido, George e Ben (John Lithgow) não têm como se manter na casa onde vivem. A saída é cada um viver com parentes ou amigos, separados, até que encontram um lar adequado à sua nova realidade financeira. É quando os problemas pouco a pouco surgem, já que ao não ter um local para chamar de seu eles logo ou se tornam um fardo aos demais ou os outros se tornam um fardo para eles. A crescente sensação de atrapalhar ou ser atrapalhado em sua vida rotineira é retratada dentro da mais absoluta normalidade, sem apontar culpados ou vilões. São coisas da vida, simplesmente. As pessoas, às vezes, são estranhas.

    Diante destes empecilhos que a vida traz, o que sustenta George e Ben é o amor que sentem um pelo outro. Só que O Amor é Estranho não é um romance habitual, do tipo que mostra o início, o desenrolar e o fim (ou o possível fim) de um casal. É uma história singela, com uma certa dose de melancolia, que acompanha situações absolutamente cotidianas dentro do relacionamento humano. A banalidade dos eventos retratados acaba sendo o grande trunfo do filme, pela possibilidade do espectador tão bem se identificar com o que acontece na tela, aliado a momentos ternos como o olhar carinhoso que Lithgow sempre oferece a Molina quando seus personagens se encontram. É neste ato tão puro de afeição que é possível notar que o amor não é estranho, mas sim o que está à sua volta. E que, às vezes, a vida é estranha.

    Filme visto no Festival do Rio, em setembro de 2014.

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