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    Nada de Novo no Front
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Nada de Novo no Front

    O terror dos soldados nas trincheiras

    por Bruno Botelho

    Filmes que retratam a guerra não são nenhuma novidade na indústria cinematográfica, considerando que muitos clássicos do cinema exploram essa temática a partir de diferentes perspectivas e épocas, como se notabilizaram Glória Feita de Sangue (1957), Apocalypse Now (1979), Vá e Veja (1985), O Resgate do Soldado Ryan (1998) e, até mais recentemente, Dunkirk (2017) e 1917 (2019). Nada de Novo no Front (2022) é mais um desses casos, uma produção alemã com uma visão mais realista e sem romantização sobre os horrores da guerra, no caso aqui a Primeira Guerra Mundial.

    Nada de Novo no Front foi indicado a 9 Oscars, incluindo as categorias principais de Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Filme Internacional, o que o coloca como um dos maiores destaques da temporada de premiações de 2023. E também se consagrou como o maior vencedor do BAFTA, voltando com nada menos que sete prêmios para casa.

    Qual é a história de Nada de Novo no Front?

    Nada de Novo no Front é uma história que segue o adolescente Paul Bäumer (Felix Kammerer) e seus amigos Albert Kropp (Aaron Hilmer) e Franz Müller (Moritz Klaus), que se alistam voluntariamente no exército alemão durante a Primeira Guerra Mundial, movidos por uma onda de fervor patriótico. Mas isso é rapidamente dissipado quando enfrentam a realidade brutal da vida no front. Os preconceitos de Paul sobre o inimigo e os acertos e erros do conflito logo os desequilibram. No entanto, em meio à contagem regressiva, ele deve continuar lutando até o fim, com nenhum objetivo além de satisfazer o desejo do alto escalão de terminar a guerra com uma ofensiva alemã.

    O filme é uma adaptação do romance alemão de Erich Maria Remarque, que já havia rendido duas versões para o cinema: o clássico estadunidense Sem Novidade no Front (1930), vencedor do Oscar de Melhor Filme e Melhor Diretor, além de um filme para a televisão em 1979, produção entre Estados Unidos e Reino Unido. Então, o público pode acompanhar uma visão alemã em Nada de Novo no Front (2022), acompanhando o sofrimento da Frente Ocidental, presa à guerra de trincheiras e com seus soldados mal conseguindo se mover até o final do conflito, com três milhões de mortes. A Primeira Guerra Mundial ocorreu entre 1914 a 1918, com quase 17 milhões de mortes.

    Retrato cru e visceral dos horrores da Primeira Guerra Mundial

    Logo na abertura do filme temos uma sequência imersiva que coloca o público diretamente no meio da guerra, mais precisamente dentro das trincheiras, mostrando que a produção tem a intenção de explorar os horrores da guerra de forma mais realista e visceral. Após a aparição do título Nada de Novo no Front, vemos os corpos dos soldados mortos sendo recolhidos e seus uniformes lavados para outros usarem. Esse é um começo que situa bem a crueldade das guerras e, mais do que isso, como os combatentes que estão colocando em risco suas vidas são pessoas descartáveis.

    Logo em seguida, descobrimos que a narrativa está situada no terceiro ano da Primeira Guerra Mundial, em 1917, apenas um ano restando para seu término. Desta forma, temos uma cena fundamental para a mensagem anti-militarista e pacifista da obra original e levada ao roteiro escrito em colaboração por Edward Berger, Lesley Paterson e Ian Stokell, quando um diretor da escola aparece inflando os jovens com discursos patrióticos para que eles defendam e lutem por sua nação se alistando no exército.

    Não demora muito para essa noção nacionalista e idealista dos personagens darem lugar ao terror do campo de batalha, onde eles enfrentam cenas verdadeiramente aterrorizantes. Os espectadores acompanham tudo pelos olhos de Paul Bäumer de Felix Kammerer, que progressivamente perdem o brilho e dão lugar a um olhar vazio e desesperançoso. O diretor Edward Berger escolhe levar a câmera para realidade insalubre e desumana das trincheiras, mostrando situações de fome, frio, doenças, além do trauma encarado pelas muitas mortes e toda a lama / sujeira presente no local.

    Por isso, é interessante como a trama coloca um contraste constante entre as situações horrorosas enfrentadas pelos soldados na linha de frente e as negociações envolvendo os militares de cargos superiores, em situação confortável e podendo interromper os conflitos a qualquer momento. Isso mostra como eles estão lutando sem propósito e servindo como marionetes aos interesses de pessoas poderosas que estão lucrando com isso, enquanto os combatentes deixam suas vidas para lidar com a morte.

    Nada de Novo no Front é um pesadelo visual de imersão na guerra

    "Isso aqui é como uma febre. Ninguém realmente quer, mas de repente está aqui. Não queríamos. Os outros não queriam. E, no entanto, estamos aqui. Metade do mundo está aqui. E Deus está observando enquanto nos massacramos"

    Os destaques de Nada de Novo no Front estão nos aspectos técnicos, que ressaltam a imersão do público nos horrores da guerra e seus personagens. James Friend é o responsável pela direção de fotografia, caracterizada pelos tons acinzentados que enfatizam o clima fúnebre e depressivo das trincheiras repletas de mortes. Isso é reforçado pela trilha sonora enervante de Volker Bertelmann ao lado da edição e mixagem de som que colocam o peso real em tiros e explosões presentes em cena.

    Não poderia esquecer o design de produção de Christian M. Goldbeck, que faz um trabalho impressionante e realista na reconstituição de cenários e cada um dos elementos presentes em cena. Com tudo isso, o diretor Edward Berger tem uma maior facilidade para explorar todas as tragédias e consequências da Primeira Guerra Mundial, não poupando em nenhum momento a violência das cenas brutais e desconcertantes aos olhos do público – usadas como uma forma de alerta pacifista.

    Felix Kammerer, no papel do protagonista Paul Bäumer, é a grande força da narrativa, conseguindo passar em sua atuação todas as nuances emocionais da transição do personagem, que vai do idealismo ao realismo trágico quando entra na linha de frente. É com ele que o público observa todos os principais acontecimentos aterrorizantes e, assim como ele sai devastado, o público sente na pele o impacto dos eventos. E, da mesma forma que passa pela dor de ver seus companheiros de batalha caindo um a um, ele eventualmente começa a sentir compaixão pelos próprios inimigos – que, no final das contas, estão passando pelo mesmo em uma guerra sem propósito.

    É evidente que Nada de Novo no Front não apresenta nenhuma novidade em relação à sua temática crítica às guerras e seus efeitos em soldados, mas chama atenção tecnicamente e pela maneira realista e brutal que representa essa história nos cinemas. Um diferencial interessante é como a produção escolhe mostrar o outro lado além das batalhas, indo para os militares de cargos mais altos e suas negociações mediantes ao desenrolar da Primeira Guerra Mundial, chegando até o Armistício de Compiègne assinado em 1918, que encerrou os enfrentamentos na Frente Ocidental. Nada mais incisivo do que expor as contradições de conflitos mundiais que deixam milhões de vidas jovens pelo caminho.

     

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