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    Bob Marley: One Love
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Bob Marley: One Love

    Biografia de Bob Marley opta pelo caminho fácil e perde oportunidade de mostrar potência do artista

    por Diego Souza Carlos

    Um dos muitos projetos afetados pela pandemia, Bob Marley: One Love levou alguns anos para, enfim, chegar aos cinemas de todo o mundo. Seguindo a esteira de cinebiografias inspiradas em grandes nomes da música, como as recentes Rocketman e Bohemian Rhapsody, o longa tem direção de Reinaldo Marcus Green, cineasta conhecido por King Richard - Criando Campeãs, Top Boy e A Cidade é Nossa.

    Estrelado por Kingsley Ben-Adir, Lashana Lynch e James Norton, o longa apresenta um trecho importante da história de Robert Nesta Marley OM, mais conhecido como Bob Marley, grande ícone do reggae. O filme relembra os importantes feitos do cantor para seu país, assim como as dificuldades que sua família e conhecidos passaram.

    Bob Marley ficou conhecido por sua pregação pela paz, do amor e da fé rastafari. Com o reggae, ultrapassou fronteiras e o sucesso foi imenso. Mas mesmo famoso, a violência em seu país era uma realidade e chega até Marley e sua esposa. Após um atentado, eles saem do país, mas no ano seguinte o cantor icônico decide voltar, pelo povo, para a Jamaica.

    O reggae da Jamaica pelo mundo

    Paramount Pictures

    Nos primeiros momentos de One Love, algumas questões ficam nítidas: a fotografia tem um trabalho interessante em diversificar as diferentes paisagens apresentadas no filme. Apesar de cair no costumeiro filtro amarelado em algumas regiões da Jamaica, algo visto exaustivamente em Hollywood quando o assunto são regiões africanas, o diretor de fotografia Robert Elswit ainda consegue preservar as belezas do país e refletir isso no estilo de vida do artista.

    Essa expressão estética é importante para a história, já que em algum ponto, Bob passa a viajar por diferentes países em sua turnê e isso dá dinâmica às variações locais. Por ter um recorte específico desta história real, a direção inclui também certos flashbacks durante a narrativa. Uma forma de não se comprometer com uma janela muito grande, dos 36 anos de vida de Bob Marley, mas com pontos importantes de sua infância e adolescência inseridos aqui e ali.

    Sendo uma história do ícone do reggae, é natural que a trilha sonora seja embalada pelos sucessos de sua carreira e exista uma apelo natural aos shows. Momentos estes que enaltecem a grandiosidade de Marley em sua missão de paz e música pelo mundo. Ainda que a atuação de Kingsley seja mais interessante nas sequências intimistas, a produção destas cenas grandiosas são sempre muito bem-vindas. Pequenas pausas durante o filme para se costurar a trama através da musicalidade.

    Paramount Pictures

    O período escolhido pelo diretor e roteirista para apresentar a força de Bob Marley é enigmático, já que percorre pouco mais de dois anos em que o artista viajou pelo mundo, conseguiu interferir em uma potencial guerra civil e ainda gravou Exodus, um de seus álbuns mais aclamados.

    Todo o processo de confecção do disco é inteiramente pontuado pelo lado humano e artístico de um Bob e de seus companheiros - o que é ampliado posteriormente com a turnê que perpassa por festas, jogos e shows mundo afora. Menções interessantes para mostrar o alcance do músico pelo globo e também estabelecer as fortes conexões do seu desejo de paz com a criação dessas músicas. O episódio inaugural do filme é reforçado constantemente para elucidar uma ideia de propósito, mesmo que isso se perca em uma fraca poesia estética que se esgota pelo excesso.

    Entre a política e a arte

    Paramount Pictures

    A violência, apesar de não ser o foco da narrativa, permeia todo o longa de maneira inevitável. Afinal, o start se dá após um momento catártico: enquanto o cantor decide manter um show que pode ter efeitos políticos devastadores, em seu desejo manter seu compromisso com o povo, ele e todos que estão ao seu redor sofrem um atentado. Com este começo forte, Bob logo entende que não consegue excluir a política da arte, então se refugia na Europa para recalcular a rota.

    Essa linha que poderia simbolizar o nascimento do ódio acaba se tornando crucial para a condução do longa e o seguimento da trama. A violência é deixada de lado e sempre que aparece em One Love não há nada gráfico ou excessivo. Reinaldo opta por cercear Bob Marley de diferentes maneiras para manifestar um retrato do que foi o artista em vida, mostrando seus dilemas e dúvidas. Essa ideia parece ecoar nos bastidores do filme, já que se trata de um projeto produzido pela família do cantor. Dessa forma, desde o início, sabe-se que dificilmente uma cinebiografia imparcial surgiria dessa toada.

    O que se torna interessante nestas pouco mais de duas horas não são apenas as confecções de faixas icônicas, mas descobrir a forma como Bob levava sua vida, com comprometimento com sua música, com o movimento rastafári - este que poderia ganhar contornos mais profundos no filme - e o amor que sentia por sua família e sua esposa.

    Acima disso, mesmo que não se leve adiante, os questionamentos sobre ativismo são completamente válidos: o que é efetivo quando uma guerra está prestes a estourar? Deixar que o “poder da música” guie as pessoas é o suficiente? Para alguém como Bob, isso não foi apenas o suficiente como se tornou um ponto de mudança na Jamaica.

    One Love

    Paramount Pictures

    Um dos grandes méritos de Bob Marley: One Love é o seu elenco. Ainda que os coadjuvantes não sejam desenvolvidos como mereciam, principalmente quando o assunto é a personagem de Lashana Lynch, o carisma dos atores se sobressai à história. A presença da atriz em cena, inclusive, é constantemente um reforço da ideia de que tudo o que Bob foi é fruto dessa relação - e nem sempre o esforço da mulher era visto pelo músico.

    O fato de ter a família envolvida em todos os processos do projeto deixa a trama um pouco “chapada”, sem as nuances profundas que fizeram do artista quem ele foi, há uma falta de complexidade que os atores tentam a todo instante compensar. Ainda assim, Reinaldo Marcus Green consegue entregar uma cinebiografia capaz de mostrar uma pequena labareda do que foi o movimento de paz guiado por Bob Marley durante seus últimos anos de vida.

    A falta de camadas, porém, é responsável por apresentar uma história apenas agradável, mas pasteurizada o suficiente para deixar passar pelas mãos uma oportunidade de mostrar a potência do artista. Assim, fica o desejo em ver na tela grande como Robert Nesta Marley se tornou o Bob Marley, o rei do reggae.

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