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    Doentes de Amor
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Doentes de Amor

    Quando fazer bem feito é um baita diferencial

    por Taiani Mendes

    Kumail Nanjiani é um dos protagonistas de Silicon Valley e acumula participações em inúmeros filmes e séries. Você provavelmente já o viu em alguma coisa, só não lembra qual. Isso deve mudar a partir de Doentes de Amor, comédia dramática estrelada e roteirizada por ele – em trabalho a quatro mãos com a esposa Emily V. Gordon. Baseado na história de amor do casal, o filme dirigido por Michael Showalter (Doris, Redescobrindo o Amor) acompanha os conflitos de Kumail consigo mesmo e sua família muçulmana estabelecida nos Estados Unidos. Nascido no Paquistão, ele quer ser comediante, só finge que reza e namora secretamente uma mulher branca, algo inaceitável para seus pais tradicionalistas.

    Sem apresentar nada propriamente novo (por exemplo um protagonista estrangeiro que não despreza a religião conservadora de suas origens), mas muito competente no equilíbrio de comédia, romance e drama, o longa-metragem encanta principalmente pela verdade que passa e pela apresentação sensível de complexos dilemas familiares. Relacionamentos de pais e filhos adultos no cinema norte-americano volta e meia giram em torno de alguma doença grave dos mais velhos e volta para casa dos herdeiros a contragosto, com a reconexão como moral da história. Aqui, no entanto, tanto Kumail quanto Emily (Zoe Kazan) são bastante próximos de seus genitores, o que abre espaço para a discussão de outros temas, como o quanto de suas vidas filhos compartilham com os pais e a divisão do amor e atenção entre eles e a pessoa amada, na transição do passado para o futuro, de certa forma.

    Interpretando a si mesmo, Kumail é apresentado como um motorista de Uber que faz shows de stand-up sonhando com uma grande oportunidade no humor. Ao mesmo tempo em que recebe “currículos” de pretendentes paquistanesas em jantares familiares, ele inicia um relacionamento fofo com a estudante Emily, que não faz ideia da obrigação do namorado em ter um casamento arranjado. O diretor Showalter, showrunner e ator de Wet Hot American Summer, exibe neste primeiro ato toda sua habilidade para o humor, consolidando a trama como uma comédia romântica contemporânea em que brilha a espirituosidade de Emily, vivida de forma adoravelmente carismática por Kazan. Seu discurso feminista é natural como sua graça e a cena em que ela arma um escarcéu para esconder as necessidades fisiológicas do parceiro é dos melhores momentos do cinema cômico romântico. Que enorme diferença faz uma roteirista nos créditos.

    Da água para o vinho, o segundo ato é um drama com hospital como principal cenário. Emily fica gravemente doente e Kumail passa a conviver com a culpa, as dúvidas profundas e os ex-sogros, Beth (Holly Hunter) e Terry (Ray Romano). Seu show muda, sua origem paquistanesa não rende piadas, mas brigas, e o humor é outro, meio involuntário, carregado pelo personagem sem jeito de Romano. Em dobradinha incrível com Hunter (que muitos até colocam exageradamente na corrida pelo Oscar de coadjuvante), seu personagem enriquece a história com questões próprias de um casamento de décadas, num contraponto significativo que deixa até bobo o relacionamento de Kumail e Emily retratado na primeira parte. O tom agridoce então domina e Doentes de Amor assim vai até o fim, bem-sucedido na prova de fogo do apagamento daquela que era a alma do começo. A substituição pelos mais velhos funciona ao propósito.

    Comédia dramática romântica protagonizada por um comediante muito do sem graça – o núcleo dos humoristas é o ponto fraco do filme, mesmo com a hipocrisia reinante no meio sendo destacada –, Doentes de Amor tem elenco afiado e entrosado que enche de humanidade os personagens, pessoas reais e complexas. A família de Kumail lembra um pouco demais os pais de Dev (Aziz Ansari) em Master of None, assim como seu enfrentamento irônico ao estereótipo, mas com exceção disso o longa-metragem consegue trilhar um caminho não tão batido e transmitir certo frescor na corda bamba de gêneros, além de provar que adultos podem ter relacionamentos sadios com seus pais. Mesmo quando apaixonados.

    Filme visto no 19º Festival do Rio, em outubro de 2017.

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    Comentários

    • António
      Filme fraquinho, previsível, com muitos clichés e atuações também bastante fracas da dupla protagonista, sobretudo de Kumail Nanjiani. O melhor do filme ainda são as cenas com Holly Hunter e Ray Romano.
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