O que dissociaria os vencedores dos perdedores? O êxito do insucesso? O que, de maneira incontrovertível, possibilitaria o indivíduo aniquilar o fracasso e ser, portanto, influenciado ao sucesso? E, também, qual seria o desígnio de permanecer nesta busca obstinada por este sucesso, em sua convicção mais estatutária? Somente objetivar o almejado desejo? Objetivar para quem ou para o que? Para as pessoas que lhe rodeia? Para todo o mundo? Para erradicar o que mais lhe tira suas noites mal dormidas? Para si mesmo? Perguntas como essas lhes serão respondidas, de forma silenciosa, ao assistirem ao filme cinematográfico "Pequena Miss Sunshine".
Desse modo, inaugurou no Festival de Sundance, no dia 06 de outubro do ano 2006, o excelente longa-metragem do casal Jonathan Dayton e Valerie Faris, o qual, a princípio, acomete acerca das palestras criadas por Richard Hoover (Greg Kinnear), o pai da fantástica garotinha Olive Hoover (Abigail Braslin).
Tais palestras são concebidas por intermédio de seu livro de autoajuda, o qual é caracterizado, em geral, por fazer uma introdução aos nove passos necessários para alcançar o sucesso que o indivíduo deseja, e ser, portanto, um vitorioso,
como ele profere em sua obra e, ainda, em suas relações cotidianas. Nesse ínterim, a realidade a qual ele encontra-se é, então, dividida e classificada em dois segmentos incompatíveis: perder ou vencer.
A sobrecarga do seio familiar, contudo, é incorporada e direcionada à figura da mãe de Olive, Sheryl Hoover (Toni Collete), que é cônjuge de Richard, mãe de uma garota e um garoto que, de certa forma, mantêm a esperança de conquistarem seus respectivos objetivos, os quais, a longo prazo, são considerados inatingíveis, e, vale ressaltar, também, que Sheryl Hoover é a provedora primordial da família e da residência Hoover.
Ademais, no que se remete a Richard, vale postular que, embora utilize os ideais englobados em sua obra literária na formação e na educação de seus filhos, se encontra ludibriado por não atingir a venda do mesmo para com qualquer que seja a editora.
Como irmão de Sheryl Hoover, tem-se Frank Ginsberg (Steve Carell), especialista do conhecimento em relação ao escritor Proust, exteriorizando, assim, na temática trágica de sua vida:
o indivíduo que não conseguiu suicidar-se.
Nessa lógica, tendo que morar com os Hoover, Frank torna-se uma pessoa submissa a essa família, visto que o mesmo necessita dos cuidados e atenções médicas, as quais, em suma, são proporcionadas e efetivadas por sua irmã.
Um outro integrante desta obra revitalizante é o irmão da caçula aprendiz, que se chama Dwayne Hoover (Paul Dano), o mesmo que, destinado a tornar-se um piloto de teste e, ao perceber que sua família conspirava para que isso não fosse possível,
decidiu criar uma espécie de "voto de silêncio",
o qual surgiu, também, pela sua inspiração na literatura do filósofo prussiano Friedrich Nietzsche.
Diante do exposto, nota-se uma falsa liberdade de escolha: alguns dos protagonistas da obra supracitada não sentem-se pessoas livres para decidirem o que realmente desejam para o presente delas e, ainda, para o planejamento de suas vidas profissionais futuras, resultando, assim, que os mesmos estejam a mercê de algo que lhes são inserido, de modo alternativo, por exemplo, ou, de forma distante de seu livre-arbítrio, imposto em suas vidas.
Isso é visível, por exemplo, na realidade de Olive Hoover: garotinha sonhadora que, apesar de desejar efetivar seu desejo, o qual consiste em ganhar o título de miss no concurso de beleza mirim "Pequena Miss Sunshine", seu pai a coloca em posições críticas, visto que ele impõe que ela não perca, de maneira nenhuma, o tal concurso de beleza. Por um mesmo ângulo, ela tem que aniquilar coisas que, perante seu pai, a distanciava da realização do sonho, e, se você, leitor, fizer um paralelo da ficção à realidade, perceberá que, igualmente a meu ver, a criança sofre uma subjugação em relação ao adultocentrismo, fazendo com que ela perca sua liberdade para realizar suas escolhas e, assim, incorpora-se aos moldes criados pelos adultos.
Tal quadro merece atenção e criticidade, pois, as crianças têm que viverem o período da infância e, de maneira nenhuma, poderia haver, do meio exterior, um contato prejudicial à vida delas, restringindo-se à infância: ao ferimento e a desproporcionalidade de acontecimentos entre a vida adulta e a vida infantil de uma criança, como é o caso em que a principal protagonista do filme "Pequena Miss Sunshine" está inserida: imposição externa para com ela.
É de extrema importância salientar, também, o distanciamento dos comportamentos da família tradicional do século XXI. Nesse sentido, a família Hoover faz uma interpretação que, até meados dos séculos XIX e XX, não era muito corriqueira: o seio familiar só poderia ser constituído pelo pai, pela mãe, seus filhos e, juntamente com essa formação, teria que prevalecer e transmitir o conceito de família "normal" para a sociedade a qual vivem, família que não apresentasse, em seus constituintes, pessoas patológicas, que apresentassem algum tipo de deficiência física ou mental, vício, entre outras "patologias", como eram chamadas, por exemplo, no período naturalista brasileiro.
Em contraste com as imposições, está, nessa perspectiva, os membros Hoover, os quais, de maneira normativa, isso na hodierna sociedade na qual adentram, tornam-se pessoas normais como qualquer outra família contemporânea, que apresentam particularidades, superações, obstáculos a serem enfrentados, sacrifícios, variações familiares, transtornos psicológicos, entre outros problemas.
Tais termos supracitados enriquecem, na contemporaneidade, o conceito de "família", causando, assim, uma quebra dessa linha de pensamento imposta anteriormente e uma maior aceitação do que, hoje, integra esse meio constitucionalista. Portanto, um dos pontos positivos abordados nesse longa-metragem fantástico é, sem dúvidas, o de mostrar uma das novas formações familiares do século XXI.
Além desses incríveis protagonistas supracitados, vale trazer o avô de Olive, o qual chama-se Edwin Hoover (Alan Arkin), que, também, é pai de Richard, embora seja uma pessoa completamente distinta dele. Nesse viés,
Edwin é expulso de um asilo do qual estava recebendo tratamento contra o seu vício maléfico: a heroína.
E, ao sair desse hospício, adentra na casa dos Hoover, passando, assim, a morar com eles. Nesse contexto, ele é uma das pessoas mais importantes para Olive,
visto que ele a ajuda, cria uma coreografia para que ela apresente no sonhando concurso e, ainda, acredita em seu potencial mais do que ela própria.
Sem dúvidas, ela o considera o treinador responsável por manter seus aspirantes desejos de ser a futura Pequena Miss Sunshine. Ao receber uma notícia inesperada,
a qual baseia-se em ela ser classificada para o almejado concurso, podendo, então, disputar com as outras crianças a sonhada coroa,
há um momento que compatibiliza a união familiar e que, pelo meu ponto de vista, é importante salientar, mesmo que de forma espalhafatosa: depois de vários contratempos, problemas internos e revoltas incorporadas nessa família, eles decidem acompanhar a pequena menina nesta busca incessante por esta realização. Assim, adentram em uma velha e amarela Kombi rumo a Redondo Beach, no sul da Califórnia.
Indubitavelmente, as obras cinematográficas deveriam, como a supracitada ao desenrolar da crítica, trazer mais este tipo de conteúdo familiar, pois, como sabe-se, a constituição familiar deve, acima de tudo, ser priorizada e empregada nesses tipos de gêneros, como foi o caso do filme "Pequena Miss Sunshine".
O roteiro de Michael Arndt para com essa obra é surpreendente: ele atrai o espectador para uma trajetória extraordinária, cheia de "altos" e "baixos" que são, indiscutivelmente, raros. Sob o mesmo ponto de vista, a fórmula road trip é, de forma inquestionável, bem sucedida, uma vez que nela é projetado um estudo acerca da concepção de família, seja em conjunto, seja individualmente.
Por um outro viés, há alguns tópicos contestáveis nesse trabalho de Arndt: o contexto mais catastrófico ocorre tanto onde os personagens se hospedam quanto em um hospital, dando espaço, portanto, para um irrefletido, quase inanimado, tratamento humorístico. Desde a conversa de Sheryl com a pequena Olive acerca do que, naquele momento da película, estava acontecendo, de maneira totalmente sincera, até sobre o que viria a acontecer, tornando-se, portanto, algo verdadeiramente inverossimilhante. Os componentes incongruentes não são, totalmente, contendentes aqui, nessa crítica, quanto os inseridos no momento em que chegam ao hotel, os quais são, diga-se por experiência passageira, beneficamente engraçados, assim como a forma de correr, absurdamente cômica, de Frank.
Portanto, a obra é, basicamente, um retrato da sociedade e seus constituintes do século vigente, visto que ela apresenta temáticas que vão de encontro à realidade a qual nos encontramos, as quais, indubitavelmente, precisam ter um olhar mais crítico e embasado, desde a concepção do que é ser criança até do que é ser adulto no atual contexto social e econômico. Logo, sem sombra de dúvidas, o filme "Pequena Miss Sunshine" aborda, de maneira intensa, embora questionável, essas questões sociais, econômicas, políticas e, acima de tudo, atenciosas. Fielmente, se você, leitor curioso, for um ser crítico para com o que permeia as variadas relações ao seu redor, eu lhe sugiro que assista esse filme e conheça seus personagens, pois, como supracitado, o maior objetivo intrínseco dessa envolvente produção cinematográfica é, incontestavelmente, levar os espectadores a uma maior reflexão acerca de quem são atualmente.