Minha conta
    Todxs Nós: "A não-binariedade é sobre abolir as caixinhas, não abrir uma terceira", diz diretora Vera Egito (Entrevista exclusiva)

    Nova série original HBO estreia neste domingo!

    A nova série original da HBO Latin America, Todxs Nós, contará a história de Rafa (Clara Gallo), jovem de 18 anos que se identifica como uma pessoa pansexual e não-binária. Quando foge de sua casa no interior e vai de encontro com seu primo em São Paulo (para a total surpresa de Vini, interpretado por Kelner Macêdo), Rafa conhece outros horizontes e novas possibilidades, incluindo amizades como a de Maia (Julianna Gerais).

    Com estreia marcada para este domingo (22), às 23h na HBO, Todxs Nós tem logo em seu primeiro episódio muito potencial para se tornar uma nova série queridinha pelos espectadores. Não somente pela boa direção e fotografia que o piloto traz, mas especialmente pelo ótimo entrosamento do trio principal, que emana questões sociais e raciais com carisma e naturalidade.

    A convite da HBO, conversamos com Gallo, Macêdo e Gerais, os diretores Vera Egito e Daniel Ribeiro e o vice-presidente Corporativo de Produções Originais da HBO Latin America, Roberto Rios, sobre o leque de assuntos que a série traz, a não-binariedade e a jornada de Rafa.

    Daniel Ribeiro explica que, graças à temática principal, a série ganha questionamentos importantes: "Rafa não guarda nada sobre si. O primeiro episódio explica algo que muitas pessoas não conhecem, mas depois Rafa vai passando por questões internas, vai se apaixonar, querer emprego... Então, Todxs Nós não é exatamente sobre a autodescoberta de ser não-binário, mas é sobre a vida de uma pessoa. Estamos contando a história de modo a trazer um questionamento para todos, mas a questão é que o espectador pode começar a pensar, mesmo não se identificando como não-binário. 'Por que tudo é binário? Por que eu tenho que me comportar como um homem?'."

    "Antes de mais nada existe uma coisa imposta na nossa educação geral, de que as pessoas são de tal jeito. E isso não é verdade. Tem quem segue a ideia normativa da sociedade, mas tem muita gente que vive diferente. As minorias não são minorias - elas são maiorias, mas são apagadas. A série não foca nesse olhar de mostrar pessoas marginalidadas, excluídas. Ela mostra pessoas como pessoas, com seus dramas e desafios como qualquer um. Espero que as pessoas aceitem e vejam a série para ter uma ideia de como somos, que não somos diferentes", diz Clara Gallo.

    Já que a série possui um poder, de certa forma, educativo para as pessoas que não se familiarizam com o assunto e a realidade exposta através de Clara e seus amigos, Julianna Gerais afirma: "O preconceito vem de você não conhecer, de ver tudo por só uma ótica. É legal o fato de ser uma série, porque já existe uma distância. É diferente de eu ter de explicar algo para a minha mãe. Você ver na TV já ganha um olhar mais atento. E Todxs Nós é uma comédia dramática, os personagens geram empatia... Acredito que isso torne o conteúdo fácil de ser compreendido. O importante é que a existência dessas pessoas seja sabida, que existem outras formas de se relacionar com o mundo."

    A diretora-geral da produção, Vera Egito, concorda: "A não-binariedade não é sobre abrir uma terceira caixinha, é sobre abolir as caixinhas. Vamos nos entender como pessoas primeiramente. A gente acha que qualquer idade pode se conectar com a história porque a nossa primeira preocupação era contar histórias. Falamos sobre o tema, sobre questões de gênero e raça, mas não há um texto teórico, é uma dramaturgia. Então, se envolver com a trajetória de cada um é algo muito possível. E quem não quer entrar na nossa festa é porque está fechado, não quer ver a realidade."

    Para Roberto Rios, o roteiro é o processo mais importante de uma história, e em Todxs Nós a personagem de Rafa foi essencial para que muitas coisas não precisassem ser explicadas a todo o instante. "O roteiro é a parte mais difícil de se fazer. Ele não é uma obra em si, é feito para acontecer num outro lugar. O roteiro não filmado é uma receita de bolo não usada. O roteiro de Todxs Nós não explica coisa por coisa; você tem de encontrar situações que pode introduzir certas questões da história. E Rafa, com seu jeito meio estabanade, tem tudo a ver com essa coisa entusiasmante da jornada. Ela está saindo da sua caixinha, conhecendo e desbravando o mundo. Isso ajuda a mover a história", explica.

    Sobre o processo de criação de seus personagens, Kelner Macêdo disse que foi um processo complexo, mas que rendeu frutos importantes para sua vida como um todo: "Para mim foi um processo de desmistificação do que é ser gay. De lugares que são estabelecidos para você ocupar enquanto gay. Entendi que dentro da sigla G existe um trilhão de possibilidades de existência. Acho que a gente separa muito as coisas em compartimentos, ou é 8 ou 80... O Vini veio com uma outra existência do que é ser gay e outro desejo diante da vida - que é muito diferente de mim do que penso. Fiz uma equalização do Vini e de quem eu sou para encontrarmos um só personagem. O Vini é lunar, eu sou solar. Precisei realmente entender a dosagem das coisas para tornar este personagem cheio de camadas e contradições."

    Gallo concordou e também afirmou que, para ela, foi um processo de muita revelação. "Pude descobrir coisas em mim que eu não percebia e apenas aprendi com Rafa. Ao mesmo tempo, pude perceber muitas coisas sobre o mundo também. Foi bom entrar neste outro tipo de comportamento, pois somos bem diferentes."

    E, enquanto a protagonista afirmou ser muito diferente de Rafa, Gerais pontuou que seu processo de se encontrar em Maia não foi nada difícil: "Eu super nos imagino amigas. Mas no processo eu tinha em mente de que não poderia ser a Maia, não poderia ser eu ali. Isso foi bom para eu compreender em quais aspectos eu não era Maia. Mas eu me vi muito numa zona de conforto com relação às militâncias que me diziam respeito, porque eu sou mulher, sou negra e só não sou vegana - isso me fez mudar também", disse.

    Sobre as inúmeras questões que Todxs Nós trará ao espectador, Gerais acredita que a série é muito atual. "A série traz algo particular deste momento em que estamos vivendo, desses últimos anos, de 'Nossa, onde estamos?'. Cada hora é uma coisa, quem está escrevendo esse roteiro da vida? É um pouco sobre essa constante descoberta. A série traz elementos para refletir, mas não traz respostas prontas". Kelner completa: "Ela mostra que podemos existir da maneira que somos, da maneira que queremos ser. Não nos calarão."

    facebook Tweet
    Links relacionados
    Comentários
    Back to Top