Nem sempre um grande sucesso garante o mesmo êxito em todos os trabalhos seguintes – e os autores da teledramaturgia sabem muito bem como é isso. No entanto, Gilberto Braga terminou a vida bastante frustrado com o fracasso de sua última novela e com projetos cancelados pela Globo. Para ele, havia um culpado para tudo isso: os paulistas.
Responsável por títulos como Dancin' Days (1978), Água Viva (1980), Vale Tudo (1988), Pátria Minha (1994) e Celebridade (2003), o autor, em 2015, resolveu se dedicar a uma novela que, a princípio, tinha tudo para entrar na sua coleção de obras inesquecíveis. Porém, as coisas não saíram como o planejado e Babilônia só causou problemas.
Fracasso no horário nobre
Lançada como a grande aposta dos 50 anos da Globo, Babilônia girava em torno de pessoas ambiciosas em busca de poder e dinheiro na alta sociedade do Rio de Janeiro. A trama deixou o público dividido pelo excesso de vilanias, cenas de sexo e o polêmico beijo do casal formado por Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, exibido logo na estreia.
Na época, a média geral de audiência nacional de Babilônia foi de 26 pontos, apenas 0,6 acima da média registrada em São Paulo (25,4); um resultado abaixo do esperado para uma novela da faixa das 21h. Para efeitos de comparação, sua antecessora, Império, vencedora do Emmy Internacional, encerrou a trajetória com 32,7 pontos na Grande São Paulo.
Divulgação/TV Globo
Na tentativa de fazer o folhetim emplacar, a Globo promoveu uma série de mudanças na trama escrita por Gilberto Braga ao lado de Ricardo Linhares e João Ximenes Braga. Houve corte de tramas homossexuais, inserção de mais humor e alteração em perfis de personagens como Beatriz (Gloria Pires), Alice (Sophie Charlotte) e Murilo (Bruno Gagliasso).
O resultado? Uma leve melhora da audiência em alguns estados, menos em São Paulo, e o título da pior audiência de uma novela das 21h até então. "Depois das mudanças, a audiência não subiu em São Paulo. Até agora eu sofro a humilhação pública diária de perder para a novela das 19h, “I love Paraisópolis”, lamentou o novelista ao jornal O Globo.
Nem Odete Roitman, nem Fátima: Esta foi a única personagem que Gilberto Braga teria mudado em Vale Tudo – e aqui está o motivo!Na mesma entrevista, ele atribuiu o fiasco ao comportamento do público paulista: “Não acompanho 100% o que falam nas redes sociais, mas sei que gostam da novela. O que chega a mim é positivo. Mas paulista é esquisito.”
Na sequência, Gilberto relembrou Torre de Babel (1998), escrita por Silvio de Abreu, que tinha o personagem Jamanta (Cacá Carvalho), muito querido pelo público de São Paulo.
“[Silvio de Abreu] fez o personagem Jamanta. Odeio Jamanta e falei: ‘Jamanta de novo?’ (quando ele voltou em Belíssima, em 2005). Ele disse: ‘É um fenômeno paulista. Fora de São Paulo ninguém suporta, mas lá é um sucesso. Por isso coloquei’. Acho que o problema está aí. Não sei escrever para quem gosta de Jamanta. Meu universo é anti-Jamanta.”
TV Globo
Depois, com a repercussão da declaração sobre os paulistas, o autor afirmou que não se arrependeu do que disse. Ao Notícias da TV, contou que só recebeu manifestações de "paulistano que também não gosta de Jamanta."
Gilberto Braga morreu magoado com a Globo
A rejeição de Babilônia deixou Gilberto deprimido e com a saúde debilitada. “Tenho uma psiquiatra e quando estou deprimido converso com ela. Sou dependente de remédios, tomo muito Rivotril. Tomo remédio o tempo todo. O remédio me protege, mas tudo me atinge.”
Prestes a completar 70 anos na época, ele não queria encerrar sua carreira com um fracasso no currículo. O novelista até chegou a desenvolver diversos projetos para a emissora, mas nenhum deles foi aprovado até sua morte, em outubro de 2021, aos 75 anos.
João Ximenes Braga contou, em entrevista à jornalista Cristina Padiglione, que o autor faleceu magoado com a Globo. "Em 2015, quando voltei da viagem de férias após Babilônia, ele me convocou à casa dele. Fui recebido no quarto, numa cama reclinável, tipo de hospital. Ele não estava bem de saúde, mas lúcido e muito deprimido com o fracasso de Babilônia", revelou.
“Não ouso dizer que antecipasse sua morte, mas naquele dia me disse textualmente que não queria encerrar sua carreira com um fracasso e queria voltar a trabalhar logo para recuperar seu prestígio [...] Superar esse fracasso era importante para ele”, afirmou João.