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    Homecoming: Crítica da primeira temporada

    Julia Roberts estrela um obscuro drama sobre memória, traumas e complexos industriais.

    Nota: 3,5 / 5,0

    Homecoming é a mistura de três elementos distintos: um diretor/produtor da linha de excelência na TV (Sam Esmail, de Mr. Robot), uma atriz de Hollywood que está entre as últimas a voltar os olhos para as telas menores (Julia Roberts) e um podcast de sucesso. Esta fascinante mistura transforma a série em uma narrativa tão fascinante quanto prometia.

    A história acompanha a psicóloga/conselheira Heidi Bergman (Roberts), que trabalha no centro Homecoming, uma iniciativa que se promove como um centro de ajuda para veteranos de guerra conseguirem voltar à vida civil. Embora ela tenha um interesse genuíno em seus pacientes, principalmente no amigável Walter Cruz (Stephan James), suas suspeitas de que algo está errado crescem em velocidade alarmante, principalmente porque seu chefe, Colin (Bobby Cannavale, fantástico) está sempre falando sobre minerar informações e testar os pacientes como ratos de laboratório.

    Ao mesmo tempo que acompanha a rotina de Heidi na instituição, Homecoming se passa também em algum momento quatro anos depois, quando a iniciativa desapareceu e ninguém parece se recordar exatamente de sua existência, e Heidi é uma garçonete com poucas lembranças de sua antiga profissão. O que acontece neste meio é o material-fonte da temporada, que se delicia tanto na caixa de mistérios que vai abrindo quando no próprio formato.

    Encantado com a própria direção, Esmail usa aqui o estilo característico de Mr. Robot, com tomadas longas em plano aberto e personagens descentralizados. O acréscimo da trilha sonora setentista e eletrônica com traços old school faz aumentar ainda mais a sensação de estarmos diante de algo hitchcockiano, e embora o mistério nunca recaia exatamente sobre o terror, faz uma análise perturbadora dos traumas e de seus reflexos na memória, que reflete a paranoia também presente em Mr. Robot, contrastada com os tons frios e acinzentados que fazem de todo o visual um deleite.

    Hilary B Gayle/SMPSP

    Mas por ter episódios de 30 minutos, Esmail (que dirige todos os 10 episódios) não tem muito tempo para se deliciar consigo mesmo, e no caso de Homecoming, o excesso de visual ajuda  a contar a história. As cenas que se passam quatro anos após o projeto Homecoming estão em proporção de 1:1, com barras laterais que tornam a visão extremamente claustrofóbica e têm um motivo.

    Homecoming é recheada de boas performances, e Roberts se destaca por ser a exata medida, numa atuação contida que deixa claro o desespero de Heidi, nos dois momentos distintos que a apresenta. Assim como Mr. Robot, é uma visão do mundo corporativista e de seus reflexos sobre ganância e poder institucionalizado, com uma compreensível queda pela caixa de mistérios. A série discute relacionamentos pessoais com sistemas corruptos, legitimação de ações inescrupulosas através de sistemas moralmente abusivos, e o quão responsável cada uma das pessoas envolvidas é, a partir do nível de poder naquela determinada escala.

    Embora a obsessão por estilo de Esmail possa ser cansativa (e em alguns momentos é, embora em outros seja recompensadora), e tenha sua boa cota de tramas que se desenrolam em um passo desnecessariamente alongado e sejam mal-resolvidas, Homecoming é criativa e desafiadora, com mistérios atraentes que vão sendo resolvidos corretamente ao longo do caminho, e não apenas no fim da temporada. A série faz uma reflexão sobre traumas e efeitos colaterais, e nisso se sai muito bem, embora pudesse fazer bom uso de uma distância maior da série de Rami Malek.

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