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    Exclusivo: “Eu tenho minha própria cota de ‘demência’”, brinca Christopher Plummer, em cartaz com Memórias Secretas

    Durante o TIFF 2015, conversamos com o ator, de memória invejável, que lembra como era filmar nos anos 1960: “A gente almoçava por duas horas e meia e votava bêbado à tarde”.

    Kevin Winter/ Getty Images

    Enquanto Tom Hiddleston (no elenco de I Saw The Light) entra por uma porta, Bryan Cranston (representando Trumbo) cumprimenta Dean Norris efusivamente no corredor – e ainda emenda um “esse cara não vale nada”, fazendo graça para a “plateia”, claro, depois que o colega de elenco de Breaking Bad vira as costas.

    Amanda Edwards/ Getty Images

    Assim é Toronto no mês de setembro, quando o TIFF (Toronto International Film Festival) transforma a cidade – o centro cultural e comercial, pelo menos – em um gigantesco tapete vermelho, já que o festival serve de plataforma para o lançamento dos principais títulos para a temporada de premiação.

    A cena aconteceu no tradicional hotel Intercontinental, durante a última edição do TIFF. Dean Norris liberava espaço para a entrada do companheiro em Memórias Secretas - em cartaz nos cinemas brasileiros desde a última quinta-feira -, Christopher Plummer, conversar com o AdoroCinema – mais um jornalista sueco e outra japonesa.

    Eu mesmo tenho a minha própria cota de ‘demência’.

    Sorridente e seguro, em nada o veterano ator, vencedor do Oscar por Toda Forma de Amor (2010), lembrava o cambaleante e atormentado Zev, seu personagem em Remember (título original), de Atom Egoyan.

    De memória frágil, Zev Guttman é um sobrevivente de Auschwitz que aceita uma estranha missão proposta pelo colega da casa repouso Max Zucker (Martin Landau): assassinar um antigo oficial nazista e, assim, vingar o sofrimento imposto a suas famílias.

    “Não foi um trabalho duro”, desmistifica o ator, logo de cara – declaração que seria um considerada uma facada para os técnicos de media training das novas gerações. “Não precisei pesquisar sobre o nazismo, porque eu sempre estive ciente da História. E Deus sabe como eu já vi filmes [sobre o tema]!”

    E ele vai além, em tom de humor: “Eu mesmo tenho a minha própria cota de ‘demência’ [o termo técnico para a condição física]”. Papinho para conquistar o interlocutor? Nesse ponto da entrevista, Plummer faz questão de relembrar um causo: “Já aconteceu comigo no palco. De repente, eu congelei. Não sabia quem eu era. O meu parceiro de cena começou a gritar as minhas falas e eu pensando ‘quem é esse cara?’ É muito estranho. De repente, algo toma conta de você. Seu corpo paralisa, mas paralisa de um jeito confortável. É como alguém dizendo: ‘ok, apenas relaxe...’”, descreve, sem perder a piada: “E a plateia, que não sabia de nada, devia estar achando que era uma interpretação louca...”

    Rei Zev Lear.

    A sinceridade do ator, no entanto, em nada dá margem para sequer cogitar a atitude como falta de comprometimento. “Eu vi atores alemães [em cena], para ajudar com o sotaque. E o sotaque que eu uso é muito claro. E sutil. Graças a eles. É o que se faz quando não se interpreta uma pessoa real. Eu vou fazer um filme agora sobre o Kaiser [The Kaiser's Last Kiss]. Aqui, eu tenho que pesquisar”.

    De repente, ele se lembra de algo que usou do próprio repertório, para ajudar na composição do personagem. “A única coisa que eu, talvez, descobri que poderia aproveitar, dentro de mim, foi um pouco do Rei Lear, que eu já havia interpretado [no teatro]. Na segunda parte da peça, o Rei Lear não sabe onde está e começa a perder todo senso de direção. É como o limite da loucura. E foi útil me lembrar disso, colocar isso no Zev”.

    Menos de 30 segundos para dizer sim.

    Amigo de Atom Egoyan desde que trabalhou com o diretor em Ararat (2002) – “Quando o nome dele foi trazido para mim, eu disse 'graças a Deus', porque esse é um papel difícil e eu precisava de um amigo por trás das câmeras que, em dois segundos, seria capaz de me dizer se eu estava indo pelo caminho errado" –, o eterno Capitão Von Trapp de A Noviça Rebelde destaca, por outro lado, o trabalho do roteirista estreante, Benjamin August, como a grande surpresa do filme.

    “É algo que eu nunca havia feito. Fiquei muito impressionado com o trabalho desse roteirista. Não levou mais do que 30 segundos para eu aceitar o papel depois de ler o script, muito bem construído e orquestrado”. Para ele, o grande mérito do texto é “o fato de que era um novo olhar, um olhar diferente para a história de Auschwitz, do Holocausto” – e com uma reviravolta na trama.

    Memória não é problema.

    Quando olha para a carreira em retrospecto, Christopher Plummer não hesita: “Eu tive muita sorte nos anos 1960, interpretando jovens protagonistas. E, nossa, como a gente era ruim! E [o processo] era muito devagar. Interminavelmente devagar, porque o dinheiro não era o objetivo nos anos 1960. A gente almoçava por duas horas e meia e votava bêbado, à tarde”, confessa, gargalhando.

    O ator diz que só se sentiu seguro, mesmo, depois de quarentão. “Eu acho que foi em O Homem Que Queria Ser Rei [1975], do John Huston, que eles perceberam que eu poderia atuar minimamente”. E ele é só elogio aos roteiros da Hollywood atual. “Desde que eu fiz O Informante [1999] – um ótimo filme, eu amei interpretar o Mike Wallace –, os roteiros que chegaram até mim têm muito mais qualidade. Agora, que eu finalmente ganhei o Oscar, com 83 anos de atraso, os roteiros só melhoram”, ri, desta vez, irônico.

    "Como você se mantém jovem e em forma?"

    Nesse ponto, a entrevista segue tão informal, que a jornalista japonesa resolve perguntar ao ator, hoje aos 86, como ele se mantém “jovem e em forma”. E caso você esteja se perguntando o mesmo... “Eu ainda pratico tênis e vou à academia e caminho naquelas coisas entediantes [esteira]. E minha esposa é uma cozinheira excelente, que prepara refeições balanceadas, o que vem acontecendo há bastante tempo, já que estamos casados há 45 anos. E trabalho. Porque nós memorizamos falas. Esse é o nosso ramo. E isso exercita o cérebro”. Não esqueça.

    Veja o trailer de Memórias Secretas:

    Jason Merritt/ Getty Images

     

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