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    Entrevista: "Brincante é um filme sobre o tempo", afirma o diretor Walter Carvalho

    O cineasta conversou sobre a produção que mistura documentário e ficção.

    Chega aos cinemas hoje um filme brasileiro bastante singular: Brincante, homenagem à obra do dançarino, músico, cantor e ator Antônio Nóbrega. Para retratar a arte deste homem tão versátil, o cineasta Walter Carvalho fez uma mistura entre ficção e documentário, registrando diversos números do artista ao lado de sua esposa, a também atriz Rosane Almeida.

    O AdoroCinema conversou em exclusividade com o diretor, que nos contou os diversos passos deste projeto, desde o primeiro encontro com Nóbrega até a realização do filme. Carvalho confia: "Brincante é um filme sobre o tempo... também". Descubra esta conversa abaixo:

    Como surgiu a vontade de fazer um filme sobre Antônio Nóbrega?

    Eu conheço o Antônio desde o Nordeste. Ele é pernambucano, eu sou paraibano. Mas eu o conheci pessoalmente no Rio de Janeiro, nos espetáculos do teatro Brincante. Eu estava na plateia, olhei para ele no palco e pensei: “Um dia eu tenho que fazer um filme sobre esse cidadão”. Ele fala sobre as coisas que eu vivi na infância e na juventude, quando morava na Paraíba. O maracatu, o Cavalo Marinho, o Bumba Meu Boi... Através de amigos em comum, a gente acabou se aproximando e fazendo trabalhos juntos para a TV Globo. Nasceu uma amizade e uma compreensão.

    Há 10 anos, eu fiz o DVD de um dos espetáculos dele, o Lunário Perpétuo. Desse espetáculo nasceu a vontade de fazer um filme com ele, mas não necessariamente sobre ele. Depois, fiz mais dois DVDs e alguns espetáculos juntos. Aí eu levei o projeto para a Gullane Filmes, que teve grande interesse em produzir. Assim corremos atrás e filmamos entre 2011 e 2012. Em 2013, eu montei.

    Você faz uma combinação entre documentário e ficção. Por que escolheu esta mistura?

    Eu não queria repetir o formato que eu usei em alguns filmes, como Raul – O Início, O Fim e o MeioMoacir Arte Bruta, que são baseados em depoimentos. Não queria fazer um filme biográfico, cronológico, com depoimentos. Eu procurei trazer o universo do Antônio Nóbrega através da dança, música e teatro, estimulando a imaginação de quem assiste, levando a questão do popular e do erudito à tela grande. Você entende que ele tem família, que ele é músico, compositor, dançarino, instrumentista... Ele é um multiartista, mas não é preciso usar palavra nenhuma para mostrar isso. Você sabe o que está vendo através da percepção, e não da informação jornalística ou documental. Como ele faz o papel dele mesmo, existe uma parte ficcional.

    O filme nunca mostra o artista se apresentando diante de uma plateia. Por quê?

    Eu transformei a plateia na câmera. Antônio Nóbrega trabalha no teatro, para a quarta parede. A parte teatral e musical dele acabou se transformando na própria câmera. Por exemplo, tem um diálogo entre o personagem dele e a morte no filme. É só plano e contraplano, como no cinema clássico convencional. Não é um teatro filmado. É um cinema representado, interpretado, como em qualquer filme de ficção.

    Embora tenha uma extensa carreira como diretor de fotografia, você nunca faz a fotografia dos filmes que dirige. Por que evita acumular as duas funções?

    Dirigir cinema é uma tarefa muito difícil. Quanto mais cinema eu faço, mais cinema eu quero aprender. Você não leva toda a experiência acumulou nos filmes anteriores ao próximo filme, porque cada filme é uma vida. O cinema tem metáforas, ele tem uma vida orgânica e própria dentro de cada filme. Não dá para importar o conhecimento, e ninguém faz dois filmes iguais. Dirigir é uma tarefa muito complicada, a cada novo projeto, eu sempre acho que estou fazendo o primeiro filme da minha vida. Não consigo fazer as duas coisas ao mesmo tempo. O único caso em que eu fiz os dois ao mesmo tempo foi Cazuza - O Tempo Não Para, porque éramos dois dirigindo: eu e a Sandra Werneck. Mas eu não operei a câmera. Ah, no Janela da Alma eu fiz a fotografia e a câmera, mas este é um caso diferente: tem apenas a câmera, e a pessoa parada falando. Temos imagens desfocadas, mas tirando isso, é um filme simples. Mas dirigir uma ficção ou um filme complexo, como o Brincante, não dá. Não poderia dirigir e fotografar este filme jamais.

    Já era previsto desde o começo dar um destaque tão grande à cidade de São Paulo na trama?

    Brincante é um filme sobre o tempo também. É sobre um jovem que começa a tocar e cantar, e chega aos 50 anos tocando e cantando. Um filme sobre o tempo que passou. Antônio Nóbrega mora em São Paulo há mais de 30 anos, então ele é um homem desta cidade. Mesmo assim, o filme começa no sertão da Paraíba. O sertão é sempre o limite de tudo, e o filme mostra o personagem andando pelo país, até chegar a São Paulo e fundar o grupo dele. A ideia do Brincante é ser viajante, navegante, amante.

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