Após se aventurar pelo universo dos super-heróis com os filmes Shazam! e Shazam! Fúria dos Deuses, o diretor David F. Sandberg retorna ao terror em Until Dawn, uma obra vendida como adaptação do popular jogo da Supermassive Games. Com a promessa de honrar a atmosfera do game e ainda flertar com a estrutura narrativa de sobrevivência noturna, Sandberg entrega um filme que carrega tanto acertos quanto tropeços, em uma balança instável entre criatividade e exaustão narrativa.
Desde o princípio, Until Dawn parece confortável em abandonar a ideia de uma adaptação fiel. Apesar de utilizar o nome do jogo e trazer algumas referências diretas à franquia The Dark Pictures Anthology, o longa caminha por vias próprias, estabelecendo uma história original onde a cada noite os personagens enfrentam um novo perigo mortal — de serial killers a maldições sobrenaturais e infecções explosivas. O conceito, a princípio, é engenhoso e proporciona uma boa dose de entretenimento, ao explorar os diferentes tipos de ameaças que espreitam a chegada do amanhecer. Cada novo desafio surge com a promessa de elevar a tensão e a criatividade, e é inegável que nas primeiras noites essa estratégia funciona, sustentada por bons efeitos práticos e pela sensação constante de urgência.
Entretanto, essa mesma criatividade que impulsiona a trama também se torna seu principal calcanhar de Aquiles. Conforme o filme avança, o esgotamento de ideias se torna evidente. O que antes parecia uma sucessão de eventos inovadores, gradativamente perde força, fazendo o roteiro recorrer a soluções fáceis e genéricas do gênero de terror, até desembocar em uma inevitável mudança de tom para a ação no terceiro ato. Essa transição brusca enfraquece não apenas a atmosfera de tensão construída até então, como também evidencia a dificuldade do roteiro em sustentar seu próprio conceito até o final. O clímax, que deveria representar o auge da narrativa, soa apressado e anticlimático, deixando a sensação de que muito foi prometido e pouco de fato entregue.
As homenagens ao jogo original, como a presença de personagens familiares e alguns momentos recriados, tentam criar um elo de nostalgia com os fãs. Porém, tais referências são meramente superficiais, já que a essência do game — centrada nas escolhas e nas consequências emocionais — praticamente se perde em meio à correria do roteiro. Se não fosse o título e algumas piscadelas ao material original, Until Dawn funcionaria perfeitamente como um filme de terror independente, o que reforça a impressão de que o uso da marca foi mais uma estratégia de marketing do que uma preocupação artística legítima.
No campo emocional, a história de Clover e Melanie, irmãs separadas em que a Clover está em sua busca, é abordada de maneira rasa. Ainda que o filme tente inserir conflitos internos relacionados à culpa, redenção e perda, esses temas são pouco desenvolvidos e facilmente ofuscados pelas cenas de morte criativa e pelo ritmo frenético da narrativa. A protagonista até é construída com certo cuidado, mas a profundidade de seus dilemas pessoais nunca se torna uma força motriz da trama. O espectador, no fim das contas, se importa mais com a expectativa das próximas ameaças do que com o destino emocional dos personagens.
Mesmo com seus defeitos, Until Dawn possui qualidades inegáveis dentro do que se propõe: a direção de Sandberg, em especial no que diz respeito ao uso de efeitos práticos e ao manejo de tensão nas primeiras noites, revela um domínio sólido do gênero. O filme abraça os clichês do terror adolescente sem vergonha, sabendo exatamente que tipo de experiência quer proporcionar. No entanto, a falta de consistência no roteiro, o abandono da profundidade emocional e a descaracterização em relação ao material original são fatores que comprometem a obra como uma adaptação e como uma experiência narrativa completa.
Em suma, Until Dawn é um terror que começa com fôlego e ideias instigantes, mas que se rende à previsibilidade e à pressa na reta final. Uma produção que até diverte e entretém, mas que se distancia demais daquilo que prometia ser, decepcionando especialmente os fãs que esperavam reviver a experiência intensa do jogo. Como filme independente, diverte em seus melhores momentos; como adaptação, é uma oportunidade perdida.