Após conquistar o Oscar por Oppenheimer, havia uma curiosidade natural sobre qual seria o próximo passo de Cillian Murphy. Muitos esperavam que ele embarcasse em outro projeto grandioso, mas, contrariando as expectativas, o ator decidiu voltar às suas raízes irlandesas e investir em um filme intimista, que ressoa mais pela sua sensibilidade do que por qualquer tipo de espetáculo visual. Pequenas Coisas Como Estas é uma produção modesta em escala, mas poderosa em impacto, trazendo Murphy como protagonista e também como produtor executivo, reafirmando seu compromisso com histórias que vão além do convencional e que priorizam a profundidade emocional.
Dirigido por Tim Mielants, com quem Murphy já havia trabalhado na terceira temporada de Peaky Blinders, o longa se passa na Irlanda dos anos 1980, em uma cidade pequena e fria, refletindo a introspecção do personagem central. Ele é um homem de meia-idade que que é confrontado por gatilhos emocionais que o fazem revisitar um passado doloroso. O filme transita entre o presente e o passado, utilizando flashbacks de maneira orgânica e precisa, sem que pareçam uma solução preguiçosa para desenvolver a trama. Pelo contrário, eles enriquecem a narrativa ao mostrar como os traumas do personagem reverberam no presente, adicionando camadas à sua psique e à sua relação com aquele lugar. O roteiro de Enda Walsh trabalha esses momentos com inteligência, construindo uma conexão fluida entre o que foi e o que ainda pesa sobre os ombros do protagonista.
Diferente de muitas produções contemporâneas que sentem a necessidade de verbalizar cada emoção, Pequenas Coisas Como Estas aposta no poder do subtexto. Aqui, o silêncio fala tanto quanto as palavras, e a atuação de Murphy é o grande motor dessa abordagem. Ele entrega uma performance magnética, sustentando a narrativa quase que exclusivamente com olhares e gestos contidos, mas carregados de significado. O filme se recusa a mastigar sentimentos para o espectador, confiando na capacidade do público de interpretar as nuances da história. Esse minimalismo emocional amplifica o impacto das cenas, tornando-as ainda mais imersivas.
O trabalho de Mielants na direção é sutil e preciso, capturando a atmosfera fria e opressiva da cidade, o que complementa a jornada emocional do protagonista. Há um tom melancólico na fotografia e na mise-en-scène, mas que nunca recai no exagero. Ao contrário, a estética reforça a sensação de introspecção e angústia, ajudando a transformar o espaço físico em um reflexo do conflito interno do personagem. Dentro dessa ambientação, a narrativa desenvolve um dilema moral: Murphy interpreta um homem que se vê dividido entre a vontade de ajudar meninas que vivem em um convento opressor e o medo de que suas próprias filhas, que estudam no mesmo local, possam sofrer represálias. A escolha de não enfatizar o drama com diálogos expositivos dá ao filme um caráter ainda mais autêntico, permitindo que a tensão se construa de forma natural.
Num período dominado por blockbusters grandiosos, remakes e roteiros que explicitam cada emoção, Pequenas Coisas Como Estas surge como um respiro necessário. É um lembrete de que o cinema ainda pode ser uma arte de sutilezas, onde a força de uma história não está em sua escala, mas sim na maneira como é contada. Cillian Murphy mais uma vez prova seu talento, conduzindo a narrativa com maestria e reforçando que o verdadeiro magnetismo de um ator não está na grandiosidade dos papéis que escolhe, mas na profundidade com que os interpreta.