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    Swagger
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Swagger

    Teatro documental

    por Bruno Carmelo

    Afirmar que Swagger constitui um documentário, como ele se intitula, exige certa benevolência do espectador. De fato, existem pré-adolescentes conversando diretamente com a câmera sobre seus problemas, como nos documentários comuns. Mas isso constitui apenas uma parte do filme, e talvez seja a menor delas. No resto do tempo, o diretor Olivier Babinet se dedica a criar cenas fictícias com estes não-atores, nas quais desfilam em frente aos amigos em câmera lenta ou enviam mensagens de celular, enquanto a câmera acompanha a ação tanto com o emissor quando junto ao receptor.

    Para um filme tão interessado na vida cotidiana dos jovens, é surpreendente que o filme jamais registre a vida cotidiana destes mesmos jovens. Ora os protagonistas estão falando sobre o que vivem, ora encenando uma versão desta rotina. Mas não a vemos, de fato, sem uma intervenção pesada do diretor em cada cena. Nos trechos fictícios, o cineasta inclui momentos eticamente contestáveis, como um rapaz indiano imitando um homem negro para os amigos negros rirem de seu sotaque africano, ou uma longuíssima cena em que uma garota tímida tenta se apresentar à câmera, mas não consegue.

    Além disso, o suposto documentário realista se arrica na escolha de elementos fantásticos, desde a trilha propícia a aventuras mágicas até os amplos movimentos de drone e imagens de um gavião se aproximando em câmera lenta. Babinet busca representar a realidade através do artifício, em outras palavras, ele faz um teatro do documentário, algo que gera efeitos originais, sem dúvida, porém controversos. O momento em que uma garota excluída reencena sua exclusão para as câmeras é no mínimo agressivo, ou mesmo um pouco sádico.

    Mas existem os depoimentos, que deveriam ser o grande trunfo do projeto. De fato, os instantes em que os jovens majoritariamente negros e árabes, moradores da periferia de Aulnay-sous-bois, falam sobre suas dificuldades financeiras, seus sonhos para o futuro e a relação com os pais geram momentos sinceros, comoventes. É uma pena que a direção interfira tanto na conversa, que fluiria melhor se fosse espontânea. Babinet pergunta aos adolescentes o que pensam de Deus, das drogas, da violência, se “conhecem franceses no bairro” – questionamento um tanto racista, sendo que vários deles são cidadãos franceses, embora os pais sejam de origem africana ou indiana. Ao mesmo tempo, a montagem privilegia os jovens mais extrovertidos: os engraçados Régis e Paul tornam-se as estrelas do filme enquanto o tímido garoto de origem beninense quase não aparece nas imagens.

    Swagger busca uma maneira lúdica de falar sobre a adversidade, contaminando a sua estética com os sonhos grandiosos dos jovens. O problema é quando estas escolhas se sobrepõem às personalidades individuais, chamando atenção demais para si mesmas. Talvez Babinet aprendesse muito mais sobre adolescentes da periferia se perguntasse sobre o seu dia normal, sobre as séries a que assistem, as coisas que comem, ou se simplesmente filmasse a interação habitual entre eles, ao invés de partir para grandes temas abstratos e esperar respostas complexas. O resultado sofre de problemas evidentes de método e de tratamento das conversas obtidas.

    Filme visto online no My French Film Festival 2018.

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    Comentários

    • Vanessa de Oliveira
      Bom dia, Acho que vc não entendeu a poesia do filme. Se vc percebeu, no final há uma frase que explica toda a aura mágica dele, um trecho de SOnho de uma noite de verão, de Shakespeare. O filme é apreentado como um sonho. Quando se diz le lit de la reine des fées, está falando de Paris, que, ao mesmo tempo, está tão próxima e tão distante. E não há NADA de racista nesse filme, absolutamente nada, isso é procurar cabelo em ovo! Quando o excelente Babinet pergunta se eles conhecem um francês é pq essa distinção realemnte existe naquela sociedade, nós brasileiros adoramos tapar o sol com a peneira, mas os franceses não tem medo de por o dedo na ferida, eles não tem esse nosso hipócrita mimimi. Ah, Devo salientar que Olivier Babinet estudou na escola do filme, Claude Débussy, então ele conhece muitíssimo bem aquela realidade! O filme é muito inovador, metafórico, poético, rico, ousado, mas para conseguir captar a sua beleza, é preciso se livrar da cegueira do preconceito e da falta de sensibilidade, além de estar preparado para sair do mais do mesmo.
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