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    Okja
    Críticas AdoroCinema
    4,5
    Ótimo
    Okja

    Meu querido super porco

    por Francisco Russo

    Não é de hoje que o cinema investe na forte amizade existente entre crianças e animais, assim como em desventuras onde um precisa ajudar ao outro. Trata-se de uma proposta de fácil identificação, pela relação pré-existente dos espectadores com seus animais de estimação. Por mais que também aborde tal proximidade, classificar Okja apenas neste sentido é um tremendo erro. Há bem mais a ser dito nesta alegoria ao mundo moderno, desenvolvida a partir de elementos fantásticos pelo diretor Bong Joon-Ho.

    Já em seu início, Okja é impactante. Em uma apresentação em ritmo frenético estrelada por uma Tilda Swinton a la personagem de anime, graças aos movimentos amplos e eufóricos, toda a ambientação em torno do surgimento do super porco é estabelecida. Mais ainda: é possível notar a importância da publicidade dentro de tal anúncio, justamente pela forma como cada informação é apresentada. A velocidade de dados jogados na tela de forma a desorientar mais do que explicar é proposital: a ideia é deixar atordoado quem assiste, de forma que não tenha (muitas) condições de raciocinar sobre o tema naquele instante e, obviamente, não surja qualquer questionamento. A absorção tácita é maior, este é o objetivo.

    Diante disto, o espectador leva até um certo choque quando o filme parte para a década seguinte. Numa das fazendas selecionadas, com sua típica vida pacata, o propagado super porco enfim é apresentado como um misto de hipopótamo e cachorro, extremamente dócil e fiel. Nasce então a amizade entre Okja e Mija (Seo-hyun Ahn), uma garota de 14 anos que, com ares de heroína, fará o que for necessário para permanecer ao lado de sua fiel amiga.

    A partir deste contexto fantasioso, Bong Joon-Ho apresenta um sem-número de personagens extremamente criativos e exagerados que, cada um à sua maneira, surgem como reflexo ao mundo real. Jake Gyllenhaal, por exemplo, surpreende ao adotar um jeito de se movimentar a la Borat para compor seu Johnny Wilcox, um amante dos animais que se torna o rosto da poderosa empresa Mirando. Tilda Swinton, camaleoa como sempre, se destaca pelas personas adotadas na vida pública e privada, enquanto que um grupo radical com ares de Gandhi chama a atenção não apenas pela postura defendida, mas também sobre como executá-la - mais não deve ser dito, sob risco de estragar a experiência do espectador com spoilers. Tamanha diversidade não apenas alimenta a diversão, pelo comportamento exagerado de todos, mas também a reflexão. Especialmente quando Okja revela qual é o verdadeiro tema que lhe interessa: analisar o mundo corporativo e, de uma forma mais geral, o próprio capitalismo.

    À medida que os bastidores da Mirando são revelados, desvenda-se uma realidade facilmente perceptível no mundo real: a importância dada à imagem em detrimento de atitudes, como se o visto fosse mais importante do que o feito - que pode ser completamente diferente do pregado, diga-se de passagem. O alvo maior de Joon-Ho está no complexo mundo das aparências corporativas, onde absolutamente tudo tem valor de mercado, especialmente o jeito descolado de ser e posturas politicamente corretas. O mais importante não é de fato realizá-las, mas sim passar aos consumidores tal mensagem de forma que eles, cada vez mais, adquiram os produtos negociados, sejam eles quais forem. Uma ciranda maliciosa que, mais do que fazer, deseja convencer. Custe o que custar.

    Com um discurso constante de defesa à natureza, Okja paulatinamente caminha rumo a temas importantes sem jamais deixar de lado o entretenimento. Tanto que, especialmente no primeiro terço, o filme investe bastante em cenas de ação e até mesmo em um humor infantilizado, incluindo questionáveis situações escatológicas. Tudo para de imediato capturar a atenção do espectador de forma que, mais a frente, possa desvendar toda a batalha midiática até então oculta.

    Diante de tamanha excelência de roteiro e execução, deve-se também destacar a qualidade do elenco. Se a jovem Seo-Hyun Ahn desponta pelo carisma e Tilda Swinton reprisa sua excelência habitual na criação de versões exóticas, Jake Gyllenhaal e Paul Dano entregam personagens absolutamente deliciosos, seja pelo linguajar corporal ou pelo idealismo exacerbado. Quem também chama a atenção é Giancarlo Esposito, não propriamente pela atuação mas pela escalação de forma que o público imediatamente remeta seu personagem a Gus Fring, o icônico vilão da série Breaking Bad, também por ele interpretado. Uma escolha inteligente de casting, por estender o papel além do que o próprio roteiro lhe oferece.

    Com ótimos efeitos especiais, especialmente na tradução de sentimentos através do olhar, Okja é capaz não só de entreter, mas também de desnudar e questionar uma realidade tão presente no mundo contemporâneo. É interessante notar que, mesmo em seu desfecho, o filme não se rende à saída fácil das boas intenções e opta, intencionalmente, pelo confronto com as mesmas armas - o que, mais uma vez, ressalta a inteligência do roteiro, escrito em parceria por Jon Ronson e o próprio diretor. Excelente filme, para ver, se divertir e refletir.

    Filme visto no 70º Festival de Cannes, em maio de 2017.

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    Comentários

    • Batata Doidona
      Idaí que produz menos? Você vai querer impedir que as pessoas comam carne? O ser humano não evoluiu para comer capim
    • Xenogears
      E pisar na terra mata muitos pretendentes a serem matos, grama etc rsrs
    • Xenogears
      Batata é universal, salvou milhares no passado.Está bom pra você?
    • Raphael Sarti
      Seus ancestrais moravam em cavernas, não usavam computador e morriam bem mais cedo que nós. Vai lá que você já deve estar fazendo hora extra então!
    • Raphael Sarti
      Talvez se pessoas como você estudassem um pouco antes de falar abobrinhas já seria um começo. Se você ler um pouco vai ver que para produzir carne se gasta muito mais água e se polui muito mais do que para produzir alimentos de origem vegetal. Também veria que com o mesmo espaço se alimentaria mais pessoas com alimentos vegetais do que com carne!
    • Not Bastion
      Gente, assim, eu não sou vegetariano, muito menos vegano, gosto de carne, bacon e afins, mas entendo completamente a ideologia veganista.Agora, não é porque eu sou onívoro, que vou responder com argumentos tão bostas do tipo plantas também sofrem, meus ancestrais não caçaram pra nada... parece resposta de criança burra de quinta série que fala cala boca já morreu quem manda em mim sou eu. Vamos ser mais racionais, reflexivos e críticos naquilo que ouvimos e falamos, se é pra repetir baboseira sem fundamento, então calados somos mais expressivos. Obrigado a todos.
    • Layla Christina Ferreira Naves
      Filme legalzinho, muita realidade pra pouca hora. Mas infelizmente ninguém consegue ter uma discussão com um racíocinio menos duvidoso, é sempre algo precisamos de carne ou quem come carne é um monstro. Paremos de ingerir leite, ovos e carne. No fim vamos fuder com qualquer outra parte do planeta pra suprir a falta que os animais de criação vão fazer. Não acabe com a criação, só com a crueldade. Okay, deixamos os animais mais confortáveis, precisamos de mais espaço pra isso ou diminuir a quantidade do produto, da onde o espaço vem? De outros animais, do nosso apartamento privilegiado é que não vai ser. Diminuir a quantidade? Pra quem é privilegiado comer carne, e quem não é ter que comer outra coisa? Ah, mas a proteína vêm de outros alimentos... Que também serão produzidos a custa de mais espaço de outros animais, de outras pessoas escravizadas pelo emprego industrial, mais água pra irrigar plantações de latifundio, etc etc etc. Não estou de forma alguma dizendo que não há solução, estou apenas pensando que seria muito melhor se nós parassemos de achar que só porque algo parece dar certo, vai dar certo, porque a prática é diferente demais. Queremos que a crueldade termine, que todos consigam se alimentar de forma adequada e que paremos de fuder com tudo no mundo? Legal, porqu não investimos nosso tempo em mais pesquisa sincera, do que preocupados em vencer discussões estranhas sobre quem come carne é desgraçado x homens das cavernas comiam carne.
    • Layla Christina Ferreira Naves
      Algo me diz que você não entendeu a intenção da piada.
    • jooj lal
      o ser humano foi feito pra comer carne, meus ancestrais não construiram lanças e e espadas pra caçar legumes, boa noite
    • Matheus Lima
      Me desculpe, mas são comentários e atitudes extremamente ofensivas como essa que acaba afastando as pessoas de experimentar o estilo de vida vegano ou vegetariano. Não é xingando quem come carne que você irá fazer uma pessoa parar de comê-la, é fazendo com que ela pense e reflita sobre, assim como esse filme faz com quem o assiste. Eu mesmo não sou vegetariano nem vegano, mas depois de assistir esse filme eu tenho minhas dúvidas se quero continuar comendo carne. Passar bem
    • David Ramos
      Esse filme foi feito por coreanos? Não é aquele povo que frita cães vivos?
    • Paulo
      Georgecara vc e demais ... faço das minha palavras a suas vamos viver de ar . pq nao adianta bater nessa tecla PS : o filme e sensacional e instrutivo no final. pq afinal a carne vem de algum lugar a verdade tem que ser dita doa a quem doer mais a opção e sua . comer carne ou nao eis a questãoeu nao troco meu churrasco por nenhuma lentilha. ou milho assado ..
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